Título: Petrobras espera definições mas não teme por gás
Autor: Cláudia Schüffner e Chico Santos
Fonte: Valor Econômico, 20/12/2005, Internacional, p. A8

A Petrobras evitou comentar ontem os efeitos, para a estatal, da vitória de Evo Morales na Bolívia. O líder esquerdista voltou a se comprometer com a nacionalização do gás, mas disse que não haverá confisco nem expropriação de bens das empresas estrangeiras que operam no país. Seu modelo seria o de contratação ou parceria com as empresas para a operação de extração de gás, por um valor definido. O gás seria de propriedade da estatal YPF. Mas ainda há muita incerteza sobre as reais intenções de Morales e sobre o que de fato conseguirá fazer. "Aceitamos que os investidores sejam sócios, mas não donos." Morales disse ontem, em entrevista coletiva, que "o negócio do gás" não será mais entre empresas transnacionais mas sim entre estados, e falou em coordenar políticas de energia com Brasil, Argentina e Venezuela. Não está claro como se encaixam nesse modelo empresas não estatais, como a British Gas. Ele descartou mudanças no fornecimento de gás, respondendo sobre o possível aumento de preços cobrados de Brasil e Argentina, cogitado durante a campanha. O diretor da área internacional da Petrobras, Nestor Cerveró, também evitou tratar das perspectivas da Petrobras quanto à possibilidade do governo boliviano retomar as refinarias Gualberto Villaroel e Guilhermo Elder Bell, adquiridas pela estatal brasileira em 1999. "Temos que aguardar a posse. Precisamos aguardar para ver o que o novo presidente planeja fazer", disse Nestor Cerveró. Mas, segundo o Valor apurou, a empresa não se oporia à venda das refinarias, desde que a preço fosse negociado de comum acordo, já que a operação, que foi deficitária por algum tempo, teria hoje margem de lucro muito pequena. Já o diretor da área de Gás da Petrobras, Ildo Sauer, disse ontem que "pessoalmente" não acredita que a eleição de Morales trará problemas para o fornecimento de gás boliviano ao Brasil. Além de produzir gás em dois campos na Bolívia, em sociedade com a Repsol e a Total, a Petrobras controla o gasoduto Bolívia-Brasil e tem contrato de importação de 30 milhões de metros cúbicos dia de gás. "Há uma interdependência que é mútua", disse. "A Bolívia depende da receita em dólares. Para ela é um contrato muito importante, pois 30 milhões de metros cúbicos de gás por dia equivalem à exportação de quase 200 mil barris de petróleo/dia a um preço razoável. Já para a economia brasileira esse gás é importante porque é um insumo de alto valor. As condições econômicas estão equilibradas." A Bolívia tem a segunda reserva de gás da América do Sul, depois da Venezuela, mas depende da venda para Brasil e Argentina. Já o presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, que passou o dia em Brasília em reunião ministerial com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi político em declaração divulgada por sua assessoria: "Saudamos o processo democrático da Bolívia de escolha do seu novo presidente. A Petrobras sempre manteve excelente relacionamento com o governo da Bolívia e assim que o novo governo se estabelecer visitaremos o presidente". Novos investimentos da empresa na Bolívia estão suspensos à espera da regulamentação da polêmica lei de hidrocarbonetos. A Petrobras e outras petroleiras já estão pagando os novos royalties que elevaram a receita do Estado boliviano. A estatal brasileira é a única que não denunciou a Bolívia por quebra de contrato em tribunais de arbitragem internacional.