Título: Mudança de hábitos ajuda a segurar inflação de 2006
Autor: Raquel Salgado
Fonte: Valor Econômico, 13/01/2006, Brasil, p. A3

O resultado da inflação de 2005, medida pelo IPCA, foi de 5,69%, dois pontos percentuais abaixo da taxa de 2004 e a menor desde 1998. O número mostra que os preços estão numa curva cadente há três anos. As projeções de economistas de bancos e consultorias para a inflação de 2006 oscilam entre 4,5% e 5% e apontam para a manutenção dessa trajetória nos próximos 12 meses. Para Eulina Nunes dos Santos, gerente do Sistema de Preços do IBGE, a tendência este ano é que os preços administrados percam peso em consequência da menor variação do IGP (1,2%) em 2005, e que o câmbio apreciado contribua ainda para reduzir o índice, como aconteceu no ano passado. Alguns bancos e consultorias admitem também a influência favorável da nova base de ponderação da nova Pesquisa de Orçamento Familiar (POF), do IBGE, sobre o IPCA. Os novos pesos serão incorporados ao cálculo do índice de preços oficial a partir de julho. Tómas Malága, economista-chefe do Itaú, não descarta a possibilidade de o IPCA encerrar o ano em 4,35%, ficando abaixo do centro da meta fixada pelo Banco Central de 4,5%. Esta diferença é creditada ao impacto sobre a inflação da nova estrutura de peso na medição do índice. A nova POF 2002-2003, divulgada em dezembro pelo IBGE, apresenta algumas mudanças importantes nos gastos domésticos do brasileiro em relação à estrutura atual baseada na POF de 1995-1996. O celular, por exemplo, vai ganhar mais peso, pois virou objeto de consumo das famílias. O álcool vai perder peso, já que a demanda por carro a álcool diminuiu. O mesmo aconteceu com o cigarro e com os ônibus urbanos e as tarifas de água e esgoto. O grupo alimentação vai pesar mais por causa da nova mania nacional: os restaurantes de comida por quilo. Nos cálculos de Elson Teles, economista-chefe da Concórdia Corretora de Valores, o efeito da medição da nova POF sobre o resultado acumulado do IPCA este ano poderá variar de zero a 0,10 ponto percentual de queda. Para o Itaú, este impacto poderá ser de 0,15 ponto percentual. "O efeito é muito pequeno", reconhece Teles. Luiz Roberto Cunha, economista da PUC, especialista em preços, considera este tipo de cálculo "um tiro no escuro", pois tudo vai depender de como vão evoluir os preços no ano. Eulina, do IBGE, prefere "lavar as mãos". Confessa que o instituto não sabe se a nova POF vai puxar a inflação para baixo ou para cima em 2006 por conta de alguns itens que ganham peso, como a gasolina, enquanto outros, como o álcool, perdem peso. A tendência para a inflação de 2006, segundo ela, é que os produtos administrados percam peso. E reconhece que existe uma convergência entre inflação e preços administrados para patamares menores, na medida que um está ligado ao outro. A apreciação cambial também pode continuar atuando a favor de um IPCA menor, acredita Eulina. A especialista do IBGE informou que, em 2005, o dólar foi "preponderante" para puxar o IPCA para baixo. "O câmbio apreciado influenciou todos os produtos da economia, de uma forma ou de outra todos têm alguma ligação com o dólar, exceto serviços", disse. Eulina chama atenção para as commodities, petróleo, açúcar, álcool, computadores (cujas peças e componentes são importadas) e outros insumos cotados em dólar nos produtos em geral, e de higiene e limpeza em particular, que entram no cômputo da inflação brasileira, todos sob influência da moeda americana.