Título: Sistema de aposentadoria deve ser alterado
Autor: Paulo Braga
Fonte: Valor Econômico, 13/01/2006, Internacional, p. A7

Apesar de o sistema de aposentadoria chileno ser citado freqüentemente como uma referência fora do país, os dois candidatos à Presidência consideram que é necessário fazer alterações no modelo. A privatização feita no início da década de 80 permitiu que o Estado se livrasse de um problema enfrentado pela maioria dos governos, os déficits crescentes dos sistemas públicos de Previdência, mas se não houver ajustes a grande maioria dos chilenos terá de enfrentar um futuro sem aposentadoria ou com uma pensão insuficiente. Tanto o liberal Sebastián Piñera quanto a socialista Michelle Bachelet concordam em que é necessário fazer mudanças no sistema, elogiado até pelo presidente dos EUA, George W. Bush, que considerou que seu país poderia usá-lo como referência. As estimativas mais conservadoras indicam que, se o modelo atual for mantido, daqui a 15 anos 40% dos trabalhadores chilenos não terão direito a qualquer benefício previdenciário. Segundo levantamento feito pelas Superintendência de Administradoras de Fundos de Pensão, que fiscaliza seu funcionamento, na média o trabalhador chileno que consegue acumular contribuições suficientes para se aposentar sai do mercado com 39% da renda que tinha quando estava ativo. Segundo as regras da Previdência chilena, cada trabalhador que tem carteira assinada contribui mensalmente com 10% do salário para uma conta individual, que é administrada por um fundo de pensão. Outros 2,5% são descontados do salário para cobrir custos de administração e um seguro em caso de invalidez, e outros 7% são retirados do salário para o serviço público de saúde. Nenhum destes descontos conta com contrapartida por parte do empregador. A privatização do sistema permitiu aumentar a poupança interna do país, estimulando operações como financiamentos para construção de moradias e desenvolvendo o setor de seguros. Mas a rigidez das regras acabou gerando um virtual monopólio das Administradoras de Fundos de Pensão (AFP), e as altas comissões cobradas pelas administradoras são apontadas como um dos fatores que acabam corroendo a aposentadoria. "Se se compara a rentabilidade das AFP com o resto do sistema financeiro ela é altíssima. Uma das propostas é abrir mais o mercado e permitir que os bancos possam administrar os fundos de pensão para poder aumentar a competição", disse Fabio Bertranou, funcionário do escritório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) em Santiago, especialista em Previdência. A necessidade de dar algum tipo de cobertura para os que ficarão excluídos do sistema também tende a aumentar os gastos do Estado com aposentadorias. "Até 2012 o governo deve gastar 12% do PIB", afirmou Carmen Espinosa, diretora da ONG PET. Ela citou estimativa do Ministério da Fazenda, segundo a qual os gastos com os pagamentos das chamadas pensões de emergência - cerca de US$ 80 mensais dados a 400 mil aposentados sem nenhuma outra renda - , a complementação das aposentadorias dos que contribuíam ao sistema anterior à reforma e os recursos destinados a cobrir as aposentadorias de militares (única categoria que fora da privatização) custam hoje 7% do PIB. Espinosa acredita que não haverá alterações radicais no regime, e a favorita Bachelet "terá de elaborar proposta aceitável para todos os membros da Concertação, muitos deles empresários". Ela defende, porém, que as empresas passem a fazer aportes ao sistema. Bertranou espera que ocorram "algumas modificações em elementos que imprimem desigualdade e injustiça" ao sistema. O que deve ocorrer, segundo ele, é uma ampliação do papel do Estado, aumentando as pensões assistenciais e os aportes de dinheiro público para que mais pessoas possam aceder ao menos à aposentadoria mínima. Outra preocupação é diminuir a desigualdade entre homens e mulheres - hoje, por ter uma expectativa de vida maior, as mulheres invariavelmente recebem aposentadorias menores. (PB)