Título: Economia une candidatos no Chile
Autor: Paulo Braga
Fonte: Valor Econômico, 13/01/2006, Internacional, p. A7

Eleição Direita e esquerda concordam que abertura ampliou desigualdade social no país

Os dois blocos que disputam no domingo as eleições presidenciais chilenas se comprometem a manter as bases do modelo econômico de abertura que permitiu que o país crescesse nos últimos anos a taxas aceleradas e também concordam na necessidade de fazer reformas para diminuir a desigualdade social. Os indicadores sociais chilenos e a distribuição de renda pioraram substancialmente durante o regime do general Augusto Pinochet (1973-90) e vêm se recuperando nos últimos 15 anos desde que a coalizão de centro-esquerda Concertação assumiu o poder. Mas o desenvolvimento obtido pelo país tornou mais visível o contraste entre ricos e pobres e fez com que o combate à desigualdade se transformasse no eixo da campanha eleitoral. Tanto o candidato da direita, Sebastián Piñera, quanto a socialista Michelle Bachelet, que fizeram ontem seus comícios finais, defendem a necessidade de melhorar a situação dos setores pobres e médios. E se for confirmada nas urnas a expectativa de vitória de Bachelet, os próximos quatro anos podem ser marcados por um aumento dos recursos destinados pelo governo à área social e por um incremento, mesmo que moderado, do papel do Estado na economia. Bachelet mantém-se na dianteira por cinco pontos percentuais, segundo pesquisa divulgada ontem. "Precisamos de mais mercado e mais Estado", sintetizou Ricardo French-Davis, que durante muitos anos trabalhou como economista na Comissão Econômica da ONU para América Latina (Cepal) e hoje é um dos assessores econômicos de Bachelet. "A chave é mudar as instituições nos momentos oportunos, não em uma época de crise, e este é um momento oportuno", considerou ele, autor do livro "Entre o Neoliberalismo e o Crescimento com Eqüidade", em que analisa as diversas fases do modelo chileno a partir da gestão Pinochet. A situação seria particularmente oportuna porque, se sair vitoriosa, Bachelet terá o benefício adicional de contar com maioria na Câmara dos Deputados e no Senado, coisa que até então a Concertação não havia conseguido. Espera-se, porém, que as reformas sejam graduais, já que as propostas terão de contar com acordo no bloco governista, por si só bastante heterogêneo e onde a Democracia Cristã - de centro, mas em alguns aspectos até identificada com a direita- ainda tem um peso importante. "O Chile cresce, mas essa expansão favorece de forma desproporcional parte pequena da sociedade", disse Ricardo Lagos Weber, filho do presidente Ricardo Lagos que foi um dos executores da estratégia de ampliar mercados para o país com a assinatura de tratados de livre comércio. No topo da lista de reformas pendentes está a necessidade de corrigir o sistema de aposentadoria. Também preocupam a desigualdade de oportunidades no acesso à educação, a precarização das relações de trabalho e a necessidade de aumentar o alcance do serviço de saúde pública e a realização de investimentos para melhorar o perfil produtivo do país, hoje concentrado na exportação de matérias-primas. Bachelet afirma que, uma vez no governo, elaborará um plano para ampliar o gasto social e ao menos por enquanto a candidata nega que vá haver aumento de impostos. Os recursos fiscais adicionais seriam gerados com o aumento dos esforços de combate à evasão e o fim de algumas isenções tributárias que beneficiam a população de renda mais alta. Já Piñera promete ampliar gastos sociais, mas diz acreditar que o próprio crescimento da economia gerará os recursos necessários. Uma de suas principais propostas na área social é instituir, com a ajuda de fundos públicos, uma pensão para que as donas-de-casa possam se aposentar. No plano produtivo, French-Davis, da Cepal, admite que a possibilidade de o país continuar crescendo no ritmo atual (em 2005 superou 6%) só com a abertura de novos mercados para suas exportações é limitada. Isso porque quando começar a vigorar o acordo de livre comércio recém firmado com a China, o país já terá liberado cerca de 85% de seu comércio exterior, e a fase de preços elevados das commodities não durará para sempre. Uma alternativa seria investir em inovação, para ampliar a pauta de exportações com produtos de maior valor agregado e serviços. A partir deste ano, o governo contará com cerca de US$ 150 milhões anuais arrecadados com royalties cobrados das empresas que extraem cobre. Esses royalties serão usados para financiar projetos na área tecnológica. Apesar das pendências, Lagos Weber disse que, na comparação com os outros países da região, o Chile tem situação privilegiada. "Em 1990, a pobreza no Chile era de 40%; hoje, essa cifra é de 18%", exemplifica, mencionando a discussão no país sobre como avançar sobre que já foi realizado. Para continuar crescendo, ele considera que "o mercado já não basta, o derrame já não basta". "Há hoje uma sociedade que fala mais alto e que está exigindo que o Estado intervenha mais."