Título: Governo negocia dívida de R$ 1, 9 bi
Autor: Thiago Vitale Jayme
Fonte: Valor Econômico, 16/01/2006, Política, p. A8

Orçamento Dois ministros foram convocados para explicar atraso no pagamento de indenizações a anistiados

A Comissão de Orçamento está sendo palco de uma disputa em torno dos pagamentos de indenizações a anistias concedidas pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça. Esses pagamentos não têm sido feitos de forma consistente desde 2001 e a dívida com os beneficiados já chega a R$ 1,904 bilhão. O relator-geral do Orçamento, Carlito Merss (PT-SC), aguarda um sinal do governo federal para tentar incluir alguma verba a mais para os repasses e frear a pressão de anistiados e parlamentares. Há duas formas de benefício aprovados pela comissão. Os anistiados podem receber o pagamento retroativo aos anos de serviço prejudicados pelo regime militar. Nesse caso, recebem um montante só, de uma vez. O mínimo é fixado em R$ 100 mil. Outra modalidade é a pensão. A comissão aprova um pagamento fixo mensal e vitalício ao beneficiário. Para as pensões - e alguns retroativos de menor valor -, o governo reservou R$ 400 milhões em 2006. Valor superior aos R$ 300 milhões de 2005 e aos R$ 200 milhões de 2004. Em 2003, foram liberados apenas R$ 53 milhões. A briga na comissão de Orçamento é pela liberação dos pagamentos retroativos, que não têm sido pagos pelo Ministério do Planejamento (a Justiça concede o benefício, mas a liberação depende do governo). Segundo cálculos preliminares do Ministério da Justiça, desde 2001, foram acumulados R$ 1,904 bilhão em retroativos não pagos. No dia 14 de dezembro, a Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara aguardava audiência pública com o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, o presidente da Comissão de Anistia, Marcelo Lavenère, e o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. Nenhuma autoridade compareceu. A deputada Laura Carneiro (PFL-RJ) apresentou requerimento, aprovado pelo comissão, no qual os três integrantes do governo foram convocados para falar no dia 15 de março. "O governo precisa explicar porque não faz o pagamento dos retroativos. Não está se fazendo um favor. É um direito dos anistiados", protesta a deputada pefelista. "Não sei como o governo de um partido que se pretende socialista, como o PT, não tem a preocupação com o pagamento do passivo dos anistiados", diz Laura. Carlito Merss reconhece a existência de pressões para a inclusão de verba para o pagamento do retroativo. "É uma das maiores demandas. Precisamos de mais informações do governo sobre o passivo. É mais um esqueleto herdado do governo Fernando Henrique Cardoso", diz o petista. Mas a falta do pagamento do retroativo não foi privilégio do governo tucano. Desde 2002 não têm sido feitos pagamentos significativos de retroativos e o montante da dívida tem se acumulado. Em 2002, a dívida era de R$ 384 milhões, segundo informações da própria Comissão de Anistia. O governo federal não tem demonstrado nenhuma intenção de aprofundar o debate e tentar garantir o pagamento do dívida. Interlocutores do Palácio do Planalto e do Ministério da Justiça junto ao Congresso se escoram no alto valor reservado para o pagamento de pensões para demonstrar que há preocupação por parte do governo com os anistiados. Em debates com anistiados e parlamentares, o governo costuma comparar os R$ 400 milhões liberados para as pensões com verbas de outros setores importantes. Lembra que o Fundo Nacional de Segurança Pública receberá os mesmos R$ 400 milhões. E o Fundo Nacional Penitenciário ficará com R$ 100 milhões a menos. "Vamos tirar dinheiro de programas sociais para pagar os anistiados? Não há como", diz um alto assessor do Palácio do Planalto. "Esse valor separado para pagar os pensionistas é suficiente e estamos satisfeitos. Nossa briga é pelo retroativo", reconhece Laura Carneiro.Carlito Merss promete tentar arrumar recursos dentro do Orçamento para sanar o problema. "Quando tivermos a confirmação do rombo de R$ 1,904 bilhão, talvez avancemos em alguma coisa. Precisamos fazer contas", diz o relator-geral. O deputado quer adotar a mesma negociação para o pagamento de antigos esqueletos da União para encontrar uma saída para os anistiados. "Minha idéia é fazer como nos pagamentos referentes aos planos Bresser e Collor. Precisamos definir critérios e negociar isso", afirma o relator. Merss já vislumbra dificuldades de convencer o governo a aprovar qualquer acréscimo ao Orçamento. "O Palácio tem travado um debate forte com as centrais sindicais para economizar R$ 2 bilhões com o aumento do salário mínimo. Isso mostra que a discussão sobre os anistiados não será fácil", afirma, ao lembrar a idéia do Ministro do Trabalho, Luiz Marinho, de empurrar a adoção do novo mínimo de março para maio para diminuir o impacto sobre o Orçamento.