Título: Recuperação das Filipinas
Autor: William Pesek Jr.
Fonte: Valor Econômico, 16/01/2006, Opinião, p. A11

Queda da inflação e aumento de impostos levou o mercado de dívidas do país a ter bom desempenho

Em um ano de surpresas na Ásia, poucas podem competir com bônus filipinos, o mercado de dívida com melhor desempenho na região em 2005 graças a uma importante demonstração de responsabilidade fiscal da presidente Gloria Arroyo. Bônus denominados em dólar no país com freqüência chamado "doente asiático" deu retorno de 19,8% em 2005, ou mais que o dobro dos papéis da dívida da Indonésia e de Taiwan. A dívida filipina deu retorno superior a cinco vezes o do Índice 500 da Standard & Poor's num período em que os EUA estão em expansão acelerada. As razões da alta são inflação em queda e aumentos nos impostos que vigoram desde 2005 e estão ajudando a reduzir um dos maiores déficits orçamentários da Ásia. São notícias espetaculares e intensificam a demanda pelos bônus de um país que vende no exterior um percentual de sua dívida maior do que qualquer outro da Ásia. Isso está alimentando expectativas de melhores classificações de crédito que possam baixar os custos de tomada de empréstimos correspondente a aproximadamente 47% do endividamento filipino, ou US$ 35 bilhões, denominado em moedas estrangeiras. O otimismo pôde ser percebido no aumento de quase 6% no peso filipino frente ao dólar em 2005 e no crescimento da ordem de 30 vezes nos investimentos estrangeiros diretos nos primeiros oito meses do ano passado. A dúvida é se as Filipinas poderão continuar no caminho rumo à estabilidade econômica. Sim, mas só se as autoridades de Manila tomarem medidas para mantê-las no rumo. O problema é o grande "se". O fato da 13ª maior economia asiática receber atenção favorável dos investidores internacionais não passou desapercebido a Arroyo. Há duas semanas, ela expressou entusiasmo com o fato de a imprensa internacional registrar o fato de o capital estrangeiro estar retornando a uma economia muito evitada nos últimos anos. "Com a alta na confiança do investidor no país, precisamos nos certificar de que as reformas econômicas sejam sustentadas e traduzam-se em mais empregos", disse, no "Manila Standard". "Devemos nos abster de conflitos que nos desviem do foco do fortalecimento da economia." Esse comentário captura à perfeição a tensão existente entre o que os filipinos precisam e o que as autoridades econômicas podem dar. Formada em economia, Arroyo, 58, sabe de que se trata. E num país que sempre privilegia carisma sobre a competência ao escolher líderes, ela é anomalia. Por mais bem intencionada que Arroyo fosse quando se tornou presidente, em 2001, defrontou-se com uma parede de resistência de legisladores que defendiam o status quo. Corrupção endêmica frustrou esforços para cobrar mais impostos de empresas e filipinos ricos. Ela viu comprometida sua imagem por acusações de compra de votos e pelo envolvimento de marido e filho em jogos de azar ilegais. Isso tolheu sua capacidade de fazer uma limpeza no governo e conseguir a aprovação de reformas necessárias. No ano passado, protestos de enormes proporções exigindo que Arroyo deixasse a Presidência assustaram os mercados. Felizmente para ela, o apoio dos militares provou ser mais importante do que a aprovação pública. O que ajudou a virar a maré, ironicamente, foram os rebaixamentos nas classificações de crédito, que provocaram uma alta nos rendimentos dos bônus filipinos e uma forte desvalorização do peso. Naquele momento, analistas otimistas em relação às ações de companhias filipinas - como os do ING Bank, que exortavam os investidores a aumentar sua exposição a bônus filipinos, e outros, como Mark Matthews, diretor da Merrill Lynch & Co. - pareciam fora de si. Mas estavam certos. Os rebaixamentos na pontuação atribuída pela Moody's Investors Service e pela Standard & Poor's foram um grito de alerta para que políticos consertassem a economia. Apesar disso, a característica mais constante da economia filipina é sua capacidade de chocar e desapontar mercados. A razão é complacência. As autoridades são muito hábeis na administração de crises, e têm muita experiência nisso. Não são boas em aproveitar janelas de oportunidade, como a de agora, para corrigir erros na economia. A complacência assume muitas formas. Uma delas se expressa nos milhões de filipinos que vivem no exterior e enviam dinheiro para casa. Muitos países em desenvolvimento dependem desse tipo de remessas. Para os filipinos, elas são fonte muito necessária de capital estrangeiro e de reforço para os consumidores. É de se perguntar se isso já foi longe demais. As autoridades econômicas gostam de dizer que remessas de recursos são a arma secreta de sua economia. Na verdade elas são a fraqueza, a debilidade crescente. O país não está criando empregos suficientes para sua população em expansão acelerada, impelindo um em cada dez nativos a buscar trabalho em lugares como Frankfurt, Hong Kong, Kuait, Riad, Cingapura, Tóquio e outros. Pesquisas mostram que muito mais filipinos trabalhariam no exterior se fosse permitido por leis de imigração. Em suma, o governo está frustrando as aspirações de seu povo, forçando-o a deixar o país. A enxurrada de jovens, inteligentes e trabalhadores em êxodo para o exterior cria uma evasão de cérebros com grandes implicações econômicas. O êxodo também alivia pressões sobre o governo para que crie empregos e melhore os padrões de vida no país. Pouco se pode duvidar que algumas coisas boas estão acontecendo nas Filipinas, e os corajosos que investiram no país foram bem recompensados. Há companhias sólidas e bem administradas no país, onde as ações subiram quase 15% em 2005. Mas a questão é se os bons tempos persistirão. Caso Manila aproveite o otimismo corrente para fortalecer sua frágil economia, o futuro poderá ser brilhante. Seu histórico, nesse aspecto, não é notável - e por isso ativos denominados em pesos não são para todo mundo. Mas, como se viu em 2005, pode ser um erro ainda maior ignorar as Filipinas em 2006.