Título: Empresários aceitam salvaguardas entre Brasil e Argentina
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 17/01/2006, Brasil, p. A4

Relações externas Acordo pode ser fechado amanhã, durante encontro entre os presidentes

O empresariado brasileiro concordou em aceitar a instituição de salvaguardas entre Brasil e Argentina, mas impôs algumas restrições. É uma mudança importante na posição da indústria nacional, que vinha rejeitando a reivindicação do governo argentino. A decisão dos empresários abre espaço para o Brasil selar o acordo com os argentinos. O presidente da Argentina, Nestor Kirchner, visita Brasília amanhã. Segundo Osvaldo Douat, coordenador da Coalizão Empresarial Brasileira (CEB), a adoção de salvaguardas entre os dois principais sócios do Mercosul evitará as medidas unilaterais e sem fundamento técnicos que foram impostas recentemente pela Argentina. Criada para discutir a posição do setor empresarial nas negociações internacionais, a CEB é coordenada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). Douat reconheceu, porém, que houve pressão do governo para que a indústria revisse sua posição e aceitasse as salvaguardas "A verdade é que estávamos diante de um impasse. E politicamente sentimos a pressão do governo de negociar com a Argentina para aliviar as tensões entre os dois países", disse o empresário. Os argentinos propuseram a instituição de salvaguardas no final de 2004. As salvaguardas são cotas, que podem restringir a importação de produtos brasileiros, protegendo a indústria argentina. O Brasil aceitou negociar, mas os empresários foram radicalmente contra, o que atrasou o processo. Nas comemorações do Dia da Amizade entre Brasil e Argentina, em novembro do ano passado, o Brasil se comprometeu a alcançar uma solução até o fim do mês. O tema deve ser discutido entre os presidentes Lula e Kirchner amanhã. O acordo automotivo, que regula o comércio de veículos e autopeças, também fará parte da agenda comercial do encontro entre os dois presidentes. Brasil e Argentina estabeleceram um prazo até fevereiro para discutir as regras de um novo acordo, já que os argentinos se recusam a liberalizar o comércio. O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, afirmou ontem que o Brasil enviou uma proposta na sexta-feira à tarde aos argentinos e está aguardando uma resposta. Douat afirmou que os empresários ainda acreditam que a instituição de salvaguardas contrariam o espírito da integração e, por isso, impuseram algumas condições para sua adoção A maioria das exigências da indústria coincide com a proposta feito pelo Brasil aos argentinos. A CEB é contra a adoção de "gatilho" cambial ou de crescimento da economia para a adoção das salvaguardas. Na visão da indústria, o mecanismo deve ser transitório, com duração de dois anos, prorrogáveis no máximo por mais um. Douat afirma que, a partir da adoção das salvaguardas, os argentinos têm que abrir mão do uso de mecanismos de antidumping, até mais fáceis de comprovar. A indústria brasileira também exige que a salvaguarda só seja aplicada após consultas bilaterais e que seja realizada investigação para comprovar o dano à industria argentina. Caso a salvaguarda seja adotada, o Brasil deseja que o setor privado argentino se comprometa com um ajuste. É fundamental evitar o desvio de comércio. O empresariado paulista também aceitou as salvaguardas. "Somos contra em princípio, mas num gesto de procurar consenso aceitamos que exista com algumas condições", afirma Roberto Giannetti da Fonseca, diretor de comércio exterior da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp). "Somos membros da coalizão e vamos acolher a decisão. Sem as salvaguardas, será pior, porque continuam as medidas unilaterais", diz Humberto Barbato, diretor de comércio exterior do Centro das Indústrias de São Paulo (Ciesp).