Título: Bandarra suspeito de favorecer Durval
Autor: Campos, Ana Maria
Fonte: Correio Braziliense, 13/05/2010, Cidades, p. 31

Depoimentos colhidos em sindicância interna do Ministério Público complicam a situação do procurador-geral. Ele é acusado de ter vazado informações privilegiadas sobre a Operação Megabyte, que investigou o ex-secretário

Até a semana passada, a contaminação do Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT) no suposto esquema de corrupção desbaratado na capital do país era sustentada apenas pela palavra de Durval Barbosa, um dos personagens mais investigados pela própria instituição. O relatório da corregedora-geral do MPDFT, Lenir de Azevedo, no entanto, fortaleceu as denúncias do colaborador da Operação Caixa de Pandora. Depoimentos prestados em sindicância interna ampliaram as suspeitas de que o procurador-geral de Justiça do DF, Leonardo Bandarra, foi o responsável pelo vazamento de informações privilegiadas relacionadas à Operação Megabyte, idealizada para municiar investigação relacionada à lavagem de dinheiro desviado de contratos com empresas de informática.

Na Operação Megabyte, ocorrida em junho de 2008, a Polícia Federal (PF) e o MPDFT queriam confirmar suspeitas de repasse de dinheiro vivo de prestadoras de serviço de informática para uma empresa ligada a Durval Barbosa. Para checar essa informação e outros indícios de que o ex-secretário de Relações Institucionais do DF usava uma loja da família para esquentar recursos desviados, policiais federais e promotores de Justiça cumpriram mandados de busca e apreensão em vários endereços, como a casa de Durval no Lago Sul, a loja da então mulher dele, Fabiani Barbosa, e a residência de uma ex-mulher (leia Memória). O vazamento de informações, no entanto, pode ter prejudicado a coleta de evidências fundamentais para as ações penais que, posteriormente, seriam propostas contra Durval Barbosa.

O próprio Durval afirma que soube pelo menos três semanas antes que haveria busca em sua casa. O principal alvo da Megabyte conta que teve acesso à minuta do pedido encaminhado pelo Ministério Público à Justiça para a deflagração da operação. Com essa informação, Durval sabia de todos os endereços que seriam vasculhados, numa ação estrategicamente preparada pelo setor de inteligência da Polícia Federal. Em depoimento à Corregedoria-geral do MPDFT, o promotor responsável pelas investigações da Megabyte, Eduardo Gazzinelli, disse que apenas Bandarra teve acesso ao documento que chegou às mãos de Durval. E mais: ele revelou que na ocasião havia uma suspeita de vazamento que intrigou os investigadores.

Envelope Gazzinelli contou que um informante da PF, que atuou na Operação Satiagraha (também contra desvios de recursos públicos), o procurou à época para dizer que Durval havia retirado todos os documentos importantes de sua casa porque soubera que o local seria alvo de ação policial. Durval Barbosa afirmou, em depoimentos, que pagou R$ 1,6 milhão para a promotora Deborah Guerner para ter essa informação que pode ter lhe salvado de mais problemas com a Justiça. Numa conversa com Durval em sua casa, Deborah teria sacado um envelope do MP de cor parda e teria dito ao então secretário de Relações Institucionais: Isto é ouro.

Em seguida, ela teria mostrado uma minuta de ação cautelar de busca e apreensão da Megabyte. De acordo com Durval, o dinheiro foi entregue à promotora da seguinte forma: duas parcelas de R$ 500 mil e duas de R$ 300 mil. Um motorista de Durval Barbosa, Jorge Luis Paulo da Silva, confirmou ter entregado em duas situações um pacote embrulhado como se fosse um presente na casa de Deborah. De acordo com relato de Gazzinelli, a promotora não teve diretamente acesso a informações da Operação Megabyte.

O suposto vazamento de informações obtidas em razão do cargo pode ser a motivação para o pedido de afastamento de Bandarra do cargo de procurador-geral de Justiça do DF. Na próxima semana, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) deve se reunir para deliberar sobre o resultado da sindicância enviado por Lenir de Azevedo ao órgão. O processo está nas mãos do corregedor nacional do MP, Sandro Neis.

Interesse em contratos do lixo

O depoimento do promotor Ivaldo Lemos Júnior, da Promotoria de Defesa do Patrimônio Público, à corregedora-geral do Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT), Lenir de Azevedo, reforça outro aspecto das denúncias de Durval Barbosa: a de que a promotora Deborah Guerner tinha interesse nos processos de fiscalização dos contratos de lixo. Responsável pelos procedimentos relacionados ao assunto, Ivaldo Lemos disse que foi procurado três ou quatro dias seguidos por Deborah com ideias sobre como o serviço de coleta de lixo deveria ser administrado no Distrito Federal.

De acordo com Ivaldo, Deborah defendia a quebra do monopólio da empresa Qualix nos contratos com o GDF para o serviço, embora sua atuação não estivesse diretamente relacionada ao tema no Ministério Público. Havia um rumor no MPDFT de que Deborah chegou a elaborar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), discutido em 2006 com a então governadora Maria de Lourdes Abadia (PSDB). O documento propunha entregar a construção de aterro sanitário, em contrato emergencial, a uma empresa que supostamente teria negócios com o marido de Deborah Guerner, Jorge Guerner.

A sindicância da corregedoria aponta um vínculo estreito, relações promíscuas e parcerias entre o procurador-geral de Justiça do DF, Leonardo Bandarra, e Deborah Guerner. Bandarra sustenta que manteve um relacionamento institucional com a promotora e nega vazamento de informações do Ministério Público do DF. Sustenta ser vítima de represálias por sua atuação no combate ao crime organizado. (AMC)

Memória

Cerco em 2008

A Operação Megabyte foi deflagrada em 3 de junho de 2008 pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios com o auxílio da Polícia Federal. Ao todo, os policiais cumpriram mandados em sete endereços, entre eles, a casa de Durval Barbosa, ex-presidente da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan) e ex-secretário de Relações Institucionais do GDF. Também foram alvo de busca e apreensão a loja da então mulher de Durval, no Lago Sul, e a casa de uma ex-mulher, além de empresas de informática que prestam serviço ao GDF.

Foram quase 12 horas de operação. De acordo com o Ministério Público, Durval teria participado de um esquema de desvio de recursos da Codeplan. O dinheiro teria sido repassado via Instituto Candango de Solidariedade (ICS) para duas empresas: a Sapiens e a Patamar.

A maior parte dos recursos teria sido transferida em 2005 para pagar contratos firmados pela Codeplan com dispensas de licitação. Segundo o MP, as informações colhidas indicariam a existência de uma máfia na área de informática, que seria abastecida com recursos públicos.

Opinião do internauta

Leitores comentaram no site do Correio a reportagem sobre a investigação da Corregedoria do Ministério Público que apontou graves faltas cometidas pelo procurador-geral de Justiça do DF, Leonardo Bandarra, e pela promotora Deborah Guerner. Veja algumas opiniões:

Olha a imagem do Ministério Público do DF indo para a lata do lixo. Daniel Luiz

Cadê a Justiça deste país? Como pode um procurador ser acusado de receber propina do erário público e, como prêmio, depois de tudo apurado, garantir uma bela aposentadoria, de mais ou menos R$ 18 mil? Frederico Silva

É brincadeira com o povo brasileiro. Toda a cúpula está envolvida em corrupção. E ainda querem promover Justiça e condenar. Esse é o nosso Brasil! Justiça foi feita para pobre somente! Wesley Costa

É inacreditável. Afinal de contas, em quem nós vamos confiar neste Distrito Federal? Senhores, do jeito que está, não dá para acreditar nem na própria sombra. Miguel Júnior

Os poderes do Distrito Federal estão quase todos maculados pelos seus gestores. A credibilidade das instituições está em baixa. Tem que mudar as leis urgente e devolver o dinheiro público. O cidadão de bem não deve pagar o pato sempre. Tá tudo errado. Elias Neves

Para Bandarra e Guerner, caso se confirmem as acusações: exoneração a bem do serviço público, cassação da aposentaria, prisão, devolução do dinheiro indevidamente recebido com juros e correção, entre outras medidas porventura cabíveis. Marcos Melo

Ouço dizer que está cada vez mais difícil viver honestamente neste país. Enquanto muitos puxam carroças, outros poucos enriquecem puxando saco, atacando o erário, etc. Democracia passa pelo fortalecimento da Justiça. MP leniente, democracia doente. Vamos refletir. José Fernandes

Sabemos que é a obrigação de quem zela pela lei, mas num país onde isso não existe, quando tem um membro do Judiciário que corta na própria carne, é motivo de exaltação. Daí os meus parabéns a ela (corregedora). Marcos Sousa

No Brasil com as leis que temos? Quero ser laranja. José Henderson

A corregedora está cumprindo suas atribuições. Isso é obrigação, não é favor. Espera-se essa atitude dos demais. Aristeu Almeida

Estamos carentes de pessoas como Dra. Lenir. Não sou nem advogado, sou do povão. Walter Quirino

Não creio! Alguns promotores do Ministério Público envolvidos em bandalheira? Logo eles? Os baluartes da ética e da probidade? Se fosse um servidor público qualquer era demitido a bem do serviço público. Ivailton Gomes