Título: Cresce fatia de investimento direto em serviços
Autor: Sergio Lamucci
Fonte: Valor Econômico, 18/01/2006, Brasil, p. A3
Conjuntura Para analistas, indústria recebe menor volume de capital estrangeiro devido ao dólar barato O volume de investimentos estrangeiros diretos recebidos pelo Brasil está na casa de US$ 15 bilhões ao ano, um número razoável em comparação aos fraquíssimos US$ 10,1 bilhões de 2003. Uma análise mais detalhada dos números mostra que, no ano passado, entre janeiro e novembro, o setor de serviços abocanhou 63,7% dos recursos externos para atividades produtivas, enquanto a indústria ficou com 31,4% (o restante foi para agricultura, pecuária e atividade extrativa mineral). É uma mudança em relação à média de 2001 a 2005, quando os serviços receberam 54,8% e a indústria, 39%. Segundo alguns analistas, a perda de espaço do setor industrial se deve ao câmbio valorizado, que afeta projetos voltados ao comércio exterior. O Banco Central (BC) divulga amanhã os números referentes ao setor externo de dezembro de 2005, que devem levar o volume de investimentos diretos no acumulado do ano para a casa de US$ 15,3 bilhões. Não é um número desprezível, mas está muito abaixo dos US$ 60 bilhões destinados anualmente para a China. Para o assessor da área de planejamento do BNDES, Francisco Eduardo Pires de Souza, o Brasil poderia receber mais investimentos estrangeiros se estivesse crescendo a taxas mais elevadas. Enquanto a China cresce a taxas de 9% ao ano, o Brasil tem mantido uma expansão média pouco superior a 2% nos últimos 25 anos. No ano 2000, o Brasil recebeu US$ 32,8 bilhões, mas o quadro era bem diferente, como lembra o economista Fernando Ribeiro, coordenador do núcleo de Estudos de Negócios Internacionais da Universidade Mackenzie. Naquele ano, lembra, o total de investimentos diretos globais atingiu o recorde de US$ 1,4 trilhão, número muito elevado. Além disso, o processo de privatização ainda estava em curso. Nesse cenário, US$ 15 bilhões hoje são um bom resultado, avalia ele, lembrando que o Brasil sempre fica bem colocado entre os emergentes que mais recebem recursos externos para atividades produtivas. Em 2004, o país conseguiu US$ 18,2 bilhões, atrás apenas da China e de Hong Kong. Esse valor, porém, está inflado por uma operação contábil referente à fusão da Ambev com a Interbrew, no valor de US$ 4,9 bilhões. O efeito líquido foi nulo, uma vez que ao mesmo tempo se registrou uma saída de investimentos brasileiros no exterior no mesmo valor. A operação da Ambev acabou inflando também a participação da indústria no total de investimentos diretos em 2004, que subiu para 52,8%. Em 2005, de janeiro a novembro, o percentual caiu para 31,4%, menor que os 40,6% de 2002 e os 34,7% de 2003. Para o professor Antônio Corrêa de Lacerda, da PUC-SP, a menor fatia de investimento externo destinada à indústria se deve em grande parte ao câmbio valorizado. Com o dólar barato, projetos de usar o Brasil como plataforma de exportação acabam adiados, avalia ele, uma vez que o retorno do negócio é comprometido. O economista-chefe do ABN AMRO, Mário Mesquita, vai na mesma linha, lembrando que, quando o câmbio estava acima de R$ 3, muitas empresas cogitavam fazer do país plataforma para exportar seus produtos. "Com o dólar nos atuais níveis, a viabilidade desses projetos diminuiu." Souza, do BNDES, é um pouco mais cauteloso. Segundo ele, ainda é difícil dizer se essa perda de participação da indústria no volume de investimento estrangeiro se deve ao câmbio valorizado. Mesmo assim, avalia que a "hipótese é boa". Como os serviços respondem por cerca de 55% do PIB, é natural que a maior parte dos recursos externos vá para esse setor. A questão é que, em 2005, a concentração parece ter sido um pouco exagerada. Nos anos 90, quando o país tinha déficits nas contas externas, alguns analistas consideravam preocupante essa tendência, uma vez que investimentos em áreas de serviços como telecomunicações, energia elétrica e comércio não geram dólares ao país, ao mesmo tempo em que elevam os gastos futuros com remessas de lucros e dividendos. Mas, como hoje o país tem um balanço de pagamentos ultraconfortável, essa preocupação ficou em segundo plano, como diz Lacerda. No setor de serviços, a área de telecomunicações continua a se destacar, tendo recebido 20% do total de investimentos externos de 2001 a 2005. Segundo analistas, é um sinal de que as empresas continuam a fazer investimentos para modernização e ampliação, mesmo depois de vários anos do processo de privatização. O mesmo não se pode dizer do setor elétrico, justamente uma das áreas que mais necessitam de investimentos no país nos próximos anos. Entre 2001 e 2005, o setor ficou 7,1% do total de investimentos diretos, indicando que que há incertezas quanto às regras para o setor.