Título: Créditos de PIS/Cofins em papel e celulose
Autor: Eduardo Borges
Fonte: Valor Econômico, 19/01/2006, Legislação & Tributos, p. E2

"Em se tratando de um processo produtivo, como no caso do papel e celulose, a presença de diversas fases inter-relacionadas é marcante."

As indústrias de papel e celulose têm o direito de apurar créditos de PIS e Cofins com base no valor dos insumos (tributados por essas contribuições) que sejam indispensáveis para a formação das florestas próprias, com base no princípio da não-cumulatividade. A apuração desses créditos pode representar uma economia considerável, aumentando a competitividade dessas indústrias no mercado global de commodities. O princípio da não-cumulatividade das contribuições sociais foi introduzido na Constituição Federal no fim do ano de 2003, ocasião em que o legislador foi autorizado a definir os setores da economia para os quais a cobrança dessas contribuições seria feita pelo regime não-cumulativo. Regime não-cumulativo é aquele que evita a cumulatividade - que consiste na incidência tributária reiterada de um mesmo tributo. Para que haja cumulatividade, portanto, é necessário que exista um processo composto de pelo menos duas fases distintas, mas relacionadas. No caso dos tributos incidentes sobre o consumo (ICMS e IPI), sempre haverá cumulatividade (salvo se evitada por lei), pois a cadeia produtiva que se encerra com o consumo é composta de diversas fases logicamente relacionadas. Já no caso dos tributos incidentes sobre a receita, a existência de fases correlatas que acarretem a cumulatividade não é regra geral. Em se tratando de um processo produtivo (como é o caso da produção do papel e da celulose), a presença de diversas fases inter-relacionadas é marcante. Algumas dessas fases podem gerar receitas tributadas; outras não. Para que a cumulatividade seja eliminada desse processo, é necessário identificar as fases que são tributadas, que devem ser levadas em consideração pela norma que elimina o efeito cumulativo. No caso do PIS e da Cofins, o regime adotado para a eliminação da cumulatividade consiste na concessão, ao contribuinte, de crédito calculado com base no valor dos bens e serviços utilizados como insumo na produção dos bens ou produtos destinados à venda (artigo 3º da Lei nº 10.637, de 2002, e da Lei nº 10.833, de 2003). O PIS e a Cofins serão efetivamente não-cumulativos apenas se entendermos que os tais bens e serviços que servem de insumo na produção de produtos destinados à venda são todos aqueles indispensáveis ao processo produtivo. Assim, se determinada indústria adquire os bens A, B e C - cuja venda é tributada pelo PIS e Cofins - e os utiliza como insumo na produção do bem D que, ao invés de ser destinado à venda, é utilizado como insumo na produção do produto E, a incidência de PIS e da Cofins sobre a venda do produto E somente será não-cumulativa se a indústria descontar os créditos calculados com base no valor dos insumos A, B e C. Se isso não ocorrer, haverá cumulação das incidências ocorridas na venda dos insumos A, B e C e também do produto E.

No caso de tributos sobre receita, a existência de fases correlatas que causem cumulatividade não é regra geral

No caso acima, deve-se considerar que os insumos A, B e C são aplicados mediatamente na produção do produto E, na medida em que são indispensáveis para a existência do bem D (insumo imediato). Se os insumos mediatos não existissem, o produto E também não existiria. O que importa, portanto, é a noção de que todo insumo mediato que for responsável pela existência do insumo imediato (que serve de matéria-prima para o produto que será destinado à venda) deve ser levado em consideração pela regra não-cumulativa. Tomemos, como exemplo, o caso das florestas cultivadas pelas indústrias cuja madeira é utilizada na fabricação de papel e celulose. No Brasil, a madeira é o principal insumo utilizado na produção do papel e da celulose, podendo ser adquirida pela indústria ou produzida em florestas próprias. No caso da produção própria, os insumos indispensáveis para a produção da madeira são as mudas (A), os adubos (B) e os fertilizantes (C) etc. Tais insumos estão intrinsecamente ligados ao insumo madeira (D) que, por sua vez, é transformado no papel e na celulose (E). Trata-se, portanto, de insumos mediatos para a produção dos produtos que são destinados à venda. Sendo assim, desde que a sua venda tenha sido tributada pelo PIS e Cofins, a aquisição desses insumos mediatos pela indústria deve ensejar o aproveitamento do crédito de PIS e Cofins calculado pela aplicação das alíquotas das contribuições incidentes na venda do papel e da celulose sobre o valor dos insumos adquiridos no mês. Em resumo, considerando que a legislação faculta a apuração de créditos de PIS e Cofins sobre o valor dos bens que servem de insumo na produção de produtos destinados à venda, e que os bens referidos acima (mudas, adubos, fertilizantes etc.) consistem em insumos mediatos do processo produtivo do papel e da celulose, na medida em que são responsáveis pela existência da madeira (insumo imediato), é de se concluir que a sua aquisição gera para a indústria de papel e celulose o direito de aproveitar o respectivo crédito, desde que a receita da venda de tais insumos tenha sido tributada por tais contribuições.