Título: Acordo entre presidentes viabiliza supergasoduto
Autor: Paulo de Tarso Lyra e Daniel Rittner
Fonte: Valor Econômico, 20/01/2006, Brasil, p. A4

Relações externas Lula, Kirchner e Chávez decidem início de estudos

Os governos do Brasil, da Argentina e da Venezuela decidiram impulsionar o projeto de construção de um supergadosuto sul-americano para viabilizar a integração energética do subcontinente. Em reunião de quatro horas ontem, na Granja do Torto, os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva, Néstor Kirchner e Hugo Chávez determinaram o início dos estudos econômico-financeiros e do projeto de engenharia para concretizar as obras. O supergasoduto ligará a Venezuela à Argentina, atravessando todo o território brasileiro, e permitirá a exportação de aproximadamente 100 milhões de metros cúbicos de gás natural venezuelano por dia. Trata-se de um volume mais de três vezes superior à capacidade de exportação de gás boliviano ao Brasil, de 30 milhões de metros cúbicos. É justamente por isso que o projeto é tido como essencial para a segurança energética da região, num momento em que aumenta o consumo da matéria-prima, tanto no Brasil quanto na Argentina, que chegou a enfrentar um racionamento recentemente. As reservas venezuelanas de gás são quase três vezes maiores do que as da Bolívia, que, por sua vez, correspondem a apenas 0,2% das reservas mundiais. Não passam de gota d'água em comparação com o potencial russo, por exemplo, mas são suficientes para dar tranqüilidade ao crescimento da demanda no Cone Sul. "Acordamos que, no mês de julho, vamos apresentar um projeto que vai beneficiar toda a América do Sul", afirmou Chávez. O ministro brasileiro das Relações Exteriores, Celso Amorim, acrescentou que serão iniciadas consultas com o meio empresarial, com o objetivo de atrair a iniciativa privada para o projeto do supergasoduto. Ficou acertado que os presidentes darão continuidade à discussão em 10 de março, em Mendoza (Argentina), na véspera da posse da presidente eleita Michele Bachelet, no Chile. Os três países decidiram também coordenar políticas para o desenvolvimento conjunto das indústrias naval, bélica e aeroespacial. "A Venezuela já tem feito encomendas ao Brasil e à Argentina na área naval, mas naturalmente tem o interesse de desenvolver os seus próprios estaleiros", disse o chanceler brasileiro. Amorim comentou ainda que a tentativa americana de barrar a venda de aviões da Embraer à Força Aérea Venezuelana foi objeto de discussão entre Lula, Chávez e Kirchner. O próprio ministro revelou ter conversado sobre o assunto com a secretária americana de Estado, Condoleezza Rice. "Estamos aguardando resposta. Ela me disse que ia dar uma nova olhada sobre o tema. Se não houver sinal positivo, haverá outras instâncias que se poderão utilizar", relatou Amorim, sem detalhar quais seriam elas. Chávez levantou novamente a possibilidade de criação de um "Banco do Sul". Todas as iniciativas, até agora, de aproximação entre os mecanismos de financiamento já existentes - BNDES, CAF e Fonplata - geraram pouquíssimos resultados concretos. Kirchner, que evitou a imprensa brasileira durante a visita ao país, deu entrevista ontem a jornalistas argentinos e garantiu ter combinado com Lula a quitação da dívida de ambos os países com o FMI. Disse que o pagamento foi acertado com o presidente Lula, apesar da insistência do governo brasileiro em dizer que a atitude dos dois países não teria sido coordenada. Segundo relatos da mídia argentina, Kirchner afirmou que os sócios maiores do Mercosul não colocarão obstáculos a eventual decisão do Uruguai de negociar um acordo bilateral de livre comércio diretamente com os EUA - medida incompatível com as regras do bloco, o que poderia levar à expulsão. "Se o Uruguai pode fazer um bom acordo com os EUA, não impediremos. Falei sobre isso com Lula e ele está de acordo", disse Kirchner, segundo o jornal "La Nación".