Título: Lula não pregará ruptura na campanha
Autor: Maria Lúcia Delgado e Cristiano Romero
Fonte: Valor Econômico, 20/01/2006, Política, p. A8

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não adotará um programa de ruptura para o segundo mandato. Na campanha da reeleição, vai celebrar os ganhos obtidos por sua administração e defender avanços em relação ao que foi feito. Por isso, não se deve esperar mudança radical na política econômica num eventual segundo mandato do presidente. O tripé dessa política - superávit primário-câmbio flutuante-metas inflacionárias - será mantido. Segundo um ministro muito próximo do presidente, Lula quer aproveitar o segundo mandato para tentar avançar uma ambiciosa agenda de reformas, abandonada nos últimos dois anos, graças à radicalização do ambiente político - em 2004, graças ao Caso Waldomiro Diniz e às eleições municipais, e em 2005, por causa da crise política. Na agenda, a prioridade será a reforma política. Sem ela, o presidente julga que será impossível governar sem os vícios da relação com o Congresso, observados tanto no seu primeiro mandato quanto no governo Fernando Henrique Cardoso. Lula quer retomar a reforma da Previdência, que, apesar de ter trazido avanços no que diz respeito ao sistema de aposentadoria dos funcionários públicos, ficou paralisada no Senado. Outra reforma que ele pretende tirar do limbo é a tributária. "O discurso do presidente será de avanço das reformas", confirmou um ministro. Lula está consciente de que somente no primeiro ano do mandato um presidente tem capital político para aprovar reformas. Nas conversas mais reservadas do Palácio do Planalto, o presidente tem deixado claro que o caminho a percorrer para um eventual segundo mandato não reservará surpresas nem radicalismos na política econômica . "É o mesmo que já fizemos, com o que mais poderemos fazer", costuma definir o próprio presidente em conversas com seus interlocutores. Lula não adotará um tom de ruptura como bóia de salvação de sua candidatura em meio à crise política. Na campanha, o presidente pretende enumerar, um a um, os avanços econômicos e sociais de seu governo. Na prática, já vem fazendo isso nos discursos que vem proferindo nas últimas semanas. A avaliação franca feita no governo é que, nos últimos três anos, houve erros e deslizes na política, mas não na economia. Apesar do desgaste que sofreu nos últimos meses, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, vai nortear a campanha da reeleição de Lula, caso o presidente assuma mesmo uma candidatura, da qual ninguém duvida. "Palocci dará o tom da campanha na política e na economia", disse um interlocutor do presidente. Ao contrário do que imaginam petistas e adversários, o presidente não pretende montar uma campanha com um único coordenador político. Esses coordenadores poderão atuar por áreas, dentro ou fora dos ministérios, como é o caso do ministro do Trabalho, Luiz Marinho, encarregado de estabelecer o diálogo do governo com o mundo sindical e também com os movimentos sociais. Cada coordenador vai atuar num segmento de eleitores. Lula já começou a fazer esse "balanço de governo" em seus últimos discursos, quando celebra com números os ganhos obtidos por sua administração, mas defende avanços em relação ao que foi feito. Há uma avaliação interna de que permanecem os erros no contato com a mídia e a inabilidade para divulgar as principais realizações do governo. Um exemplo foi a decisão de quitar antecipadamente dívida de US$ 15,5 bilhões junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI). A dívida teria que ser quitada até dezembro de 2007. Houve discussão entre os integrantes do governo sobre como tratar o fato. Uma parte da equipe sugeriu ampla divulgação. Optou-se por um anúncio discreto e pouco alvoroço político, a despeito do significado da decisão. Na Argentina, o presidente Néstor Kirchner tomou a mesma decisão, mas agiu diferente. Quitou a dívida em condições econômicas não tão favoráveis quanto a brasileira, promovendo forte jogada publicitária. "Deveríamos ter feito o mesmo", observa um ministro.