Título: Emprego formal surpreende em ano de crescimento pífio
Autor: João Saboia
Fonte: Valor Econômico, 20/01/2006, Opinião, p. A10

Mas rendimento médio dos empregados com carteira assinada estagnou no nível de 2004

O Brasil às vezes surpreende os analistas. Apesar do comportamento medíocre da economia em 2005, o mercado de trabalho teve um comportamento bem mais favorável que seria esperado tendo em vista o baixo crescimento econômico. Os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalho e Emprego (Caged), divulgados neste início de ano, apontam para uma taxa de crescimento do emprego formal (com carteira assinada) de 5,1% em 2005, performance que pode ser considerada excepcional se levarmos em conta que a economia cresceu cerca de 2% no ano passado. Houve a criação líquida de 1.253.981 empregos formais em 2005, sendo o segundo melhor resultado da década, perdendo apenas para 2004, quando a economia teve um comportamento excelente para o atual padrão de crescimento do país. Naquele ano, foram gerados 1.523.981 empregos. Em 2000, quando a economia havia crescido mais de 4%, a geração de empregos formais não passou de 657.596. O terceiro melhor resultado da década ocorreu em 2002 com 762.414 novos empregos. Apenas a agropecuária não gerou novos empregos em 2005. Houve 570 mil postos de trabalho a mais no setor de serviços, 390 mil no comércio e 176 mil na indústria de transformação. No caso desta última, a criação de empregos, embora positiva, foi bem inferior aos 505 mil empregos gerados em 2004, confirmando as dificuldades enfrentadas pela indústria de transformação em 2005. No setor de serviços, houve mais empregos gerados em 2005 do que em 2004. O mesmo ocorreu com a construção civil. O crescimento do emprego foi generalizado por todas as unidades da federação, com queda apenas no Mato Grosso, Estado onde a agricultura possui grande importância na geração de empregos. Em 2005, as regiões metropolitanas apresentaram um resultado relativamente favorável, com a criação de 570 mil novos empregos. Na região Sudeste houve a geração de 790 mil empregos, sendo 473 mil em São Paulo. A região Nordeste, com 197 mil novas vagas preenchidas, superou a região Sul, com 162 mil. Considerando-se o triênio 2003/2005, correspondente aos três primeiros anos do governo Lula, verifica-se que houve crescimento de 15,2% no nível de emprego formal, o que também pode ser considerado um resultado favorável, tendo em vista os dados da economia no período. É verdade que os 3.422.690 empregos formais gerados no período podem parecer poucos, frente às promessas eleitorais de 10 milhões de empregos durante os quatro anos de mandato. De qualquer forma, a taxa de crescimento do emprego formal é mais do que o dobro da taxa de crescimento da economia no triênio, surpreendendo favoravelmente.

As mazelas típicas do subdesenvolvimento permanecem, como a sub-remuneração e um setor informal enorme

Os dados da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE confirmam a geração de empregos formais apontada pelo Caged. No período entre novembro de 2004 e novembro de 2005 foram criados 445 mil empregos com carteira assinada nas seis regiões metropolitanas cobertas pela PME (São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte, Salvador e Recife). Por outro lado, o crescimento total da ocupação (formal ou informal) nestas seis regiões foi de 391 mil pessoas, significando que o aumento do número de pessoas ocupadas no período deveu-se exclusivamente ao crescimento de empregos com carteira assinada, ocorrendo, inclusive, ligeira queda na ocupação informal. Por outro lado, a taxa de desemprego diminuiu de 10,6% para 9,6%, mostrando a capacidade de absorção da nova mão-de-obra que chegou ao mercado de trabalho, além de parcela daquela que estava desempregada. Os dados relativos à geração de empregos formais em 2005 são bem menos favoráveis quando analisada a remuneração dos trabalhadores. Em outras palavras, se a renda gerada no país (ou seja, o PIB) cresce menos que o número de pessoas absorvidas pelo mercado de trabalho, a tendência é a renda de cada trabalhador cair, a menos que haja uma transferência de rendimentos do capital para o trabalho. Segundo as últimas informações da PME (novembro de 2005), o rendimento médio dos empregados com carteira assinada encontrava-se estagnado no mesmo nível de 2004 (R$ 975 e R$ 977, respectivamente). Houve crescimento apenas no nível de rendimento dos empregados sem carteira assinada e dos trabalhadores por conta própria. A PME confirma ainda a permanência de uma série de problemas no mercado de trabalho metropolitano. Quase 15% das pessoas ocupadas são sub-remuneradas, recebendo menos que o salário mínimo horário. O serviço doméstico continua sendo um dos setores que mais absorvem mão-de-obra. O tamanho do setor informal permanece muito elevado. Enfim, as mazelas típicas do subdesenvolvimento continuam presentes em todas as regiões do país. Apesar de todas as ressalvas que possam ser feitas aos dados do Caged, na medida em que são informados pelas próprias empresas, havendo possibilidade de perda de informações e de dados mal preenchidos, os resultados de 2005 impressionam pela elevada criação de empregos formais em um ano que terminou sob fortes críticas à política econômica do governo, resultando em redução da taxa de crescimento da economia. Além da surpresa favorável, fica a mensagem de que os resultados apresentados pelo mercado de trabalho poderão ser bem melhores no futuro, tanto em termos de geração de empregos quanto no aumento da remuneração média dos trabalhadores e na redução da informalidade, se a economia brasileira entrar, finalmente, em um círculo virtuoso de crescimento econômico, eliminando de uma vez por todas os altos e baixos (muitos mais baixos do que altos, é verdade) dos últimos anos. Para isso, entretanto, será necessário fazer as mudanças demandadas pela sociedade na política econômica, que tem impedido o crescimento sustentado da economia brasileira.