Título: O tamanho do setor público
Autor: Sérgio Werlang
Fonte: Valor Econômico, 23/01/2006, Opinião, p. A11

O setor público no Brasil tem crescido já há tempos. Uma das formas de medir o tamanho do governo é através das despesas públicas. Mas parte das despesas é devida apenas ao pagamento dos juros da dívida do governo. Os gastos com juros não dependem de uma decisão governamental, uma vez que a taxa de juros é determinada pelo desejo das pessoas de deterem a dívida pública e pelo montante desta dívida. É claro, o juro de curto prazo é escolhido pelo Banco Central, com o objetivo de controlar a inflação. Porém, o juro de curto prazo tem pouca influência no juro de longo prazo, que é aquele relevante para que a dívida seja sustentada de forma duradoura. Com efeito, mesmo com uma grande variação da taxa de juros de curto prazo, o juro nos títulos longos que são ligados à taxa de inflação tem-se mantido em 8,4% ao ano (esta é a taxa de juros dos títulos que são corrigidos monetariamente pelo IGP-M e vencem em 2031). Também, os juros de longo prazo da dívida externa brasileira têm caído desde 2002, a despeito do grande crescimento dos juros de curto prazo em 2003 e no ano passado. Em outras palavras, a taxa de juros de longo prazo, que sustenta a dívida pública brasileira, não é determinada pelo governo. Dessa maneira, o setor público não tem como escolher diretamente o montante a ser gasto com os juros. Pode apenas fazê-lo de modo indireto - cortando despesas não financeiras para pagar mais rapidamente a dívida. Só com a diminuição da dívida o total despendido com juros cairá no longo prazo. Assim, utilizar o total da despesa do governo como forma de medir o tamanho do setor público não é adequado. Um conceito melhor é olhar para as despesas não-financeiras, isto é, sem levar em conta os juros. Observando-se a evolução do total dos gastos não-financeiros do setor público brasileiro (dados do Tesouro Nacional, e 2005 estimado) vê-se que estes subiram muito entre 2000 e 2002, de 31,8% do PIB para 33,8% PIB. Em 2003 houve uma alvissareira diminuição (pequena), mas em 2004 e 2005 aconteceu uma alarmante elevação - o governo brasileiro já gasta 35,1% PIB! Este problema é muito grave. As razões para existência de um governo são bem conhecidas. Mas um problema óbvio é a falta de capacidade do setor público de resolver muitos dos problemas do c. Não é preciso ir longe para ver isso. O fim das economias comunistas e socialistas é uma prova concreta dos entraves com os quais uma economia com grande presença do governo depara-se. Aqui no Brasil a lucratividade e a pujança das empresas que foram privatizadas na década de 90 atestam com clareza tal fato. Basta lembrar que não há muito tempo (quando a finada Telebrás comandava a telefonia brasileira) era necessário pagar caríssimo para ter um simples telefone. Um outro exemplo interessante é a diferença de condições hoje entre as estradas privatizadas (através da concessão com cobrança de pedágios) e das rodovias completamente esburacadas que estão a cargo dos diferentes níveis de governo.

Em 2005, houve substancial elevação da despesa pública na economia, sem, no entanto, existir evidência de melhora da eficiência por conta disso

Na década de 90, com a abertura do comércio internacional (que, por sinal, foi em muito revertida com a introdução do Cofins sobre importações no início de 2004) e a redução da influência do governo no nosso país (através da privatização de empresas estatais e da concessão de serviços à iniciativa privada), houve um grande aumento da eficiência da economia brasileira. Aliás, isto pode ser verificado pelo crescimento da "produtividade total dos fatores", que foi atestada por vários especialistas, dentre os quais Samuel Pessoa. A partir do Plano Real, com o aumento das despesas com aposentadoria e funcionalismo público, os gastos voltaram a crescer. Mais uma vez, a partir de 1998 houve contenção do tamanho do setor público. Contudo, desde o ano 2000 o governo aumenta novamente, e as primeiras estimativas são de que no ano de 2005 houve substancial elevação da despesa pública na economia. No entanto, não há evidência de melhora da eficiência por conta disto. Gasta-se mais e gasta-se mal. O estado de deterioração das rodovias que estão sob a administração pública ilustra isso. A solução foi uma operação "tapa buracos" emergencial. Entretanto, poder-se-ia ter evitado, ou pelo menos mitigado em muito, tal situação, se houvesse continuidade (ou mesmo intensificação) das concessões de estradas ao setor privado. Um outro exemplo do aumento da despesa governamental é o anúncio da abertura de quatro novas universidades federais. Para quê? Sabe-se que os cursos superiores públicos são grandes instrumentos de aumento da desigualdade de renda, e que ainda por cima as universidades existentes estão à míngua de recursos. Por que razão criar novas fontes de pressão por gastos se não se consegue nem manter em condições as que já estão implantadas? O ideal seria tornar os cursos universitários públicos pagos e introduzir um programa de crédito educativo para valer. Na área social, o governo Lula fez um progresso ao juntar diversos programas sociais no Bolsa-Família e ao estender seu alcance. Mesmo neste setor os gastos poderiam ser muito mais bem direcionados. Em recente entrevista a este jornal, Ricardo Paes de Barros notou que as despesas sociais são pró-idoso (aposentadoria e aumento do salário-mínimo) enquanto que o retorno social é muito maior para gastos pró-criança (por exemplo, pré-escola e creche). Em suma, o Leviatã estatal está em franca expansão e a economia brasileira não mostra sinais de maior eficiência. Muito pelo contrário. É fundamental que o governo reduza seu tamanho. As concessões de rodovias e as privatizações das ainda inúmeras empresas públicas deveriam ter continuidade e mesmo serem aceleradas. E o volume de recursos que "sobrar" deveria ser dirigido a dois propósitos: para diminuir a grande dívida do governo e para reduzir a opressiva carga tributária que assola a população brasileira.