Título: O STJ e a sentença arbitral estrangeira
Autor: Pedro A. Batista Martins e Octávio Fragata M. de B
Fonte: Valor Econômico, 26/01/2006, Legislação & Tributos, p. E2

"O STJ trouxe ares de renovação ao publicar a Resolução nº 9, que estabeleceu procedimentos inovadores"

A sentença arbitral estrangeira é aquela proferida fora do território nacional e não poderá ser reconhecida e executada no Brasil sem a sua prévia homologação. Com a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 45, em 8 de dezembro de 2004, a competência para a homologação de sentenças estrangeiras e para o trâmite de cartas rogatórias foi deslocada do Supremo Tribunal Federal (STF) para o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Essa transferência de competências entre as duas mais relevantes cortes judiciais do país foi uma das diversas alterações realizadas no contexto da chamada reforma do Judiciário, corporificada no texto da emenda. Um dos principais objetivos para tal modificação era o de diminuir o excesso - e o conseqüente acúmulo - de processos julgados pelo Supremo e torná-lo cada vez mais uma corte eminentemente constitucional. Diante da atribuição assumida, o STJ trouxe ares de renovação ao publicar a Resolução nº 9, em maio de 2005, que estabeleceu, em caráter transitório, inovadores procedimentos para os pedidos de homologação de sentenças estrangeiras (incluídas aí as sentenças arbitrais estrangeiras) e para o cumprimento de cartas rogatórias originadas de outras jurisdições. Antes da nova resolução, o STJ procedia à análise utilizando-se o antigo regimento interno do Supremo. Uma das importantes inovações trazidas pela Resolução nº 9 do STJ foi a possibilidade de se admitir medidas de urgência durante o curso do procedimento de homologação. Muitas vezes as partes tinham em mãos uma sentença arbitral estrangeira favorável, mas não conseguiam proteger seus interesses mais rapidamente, pois restava pendente a decisão homologatória do Supremo, que chegava a demorar aproximadamente dois anos. O Supremo não autorizava o provimento cautelar pois se considerava uma corte de contenciosidade limitada (juízo de delibação), que não possuía o exercício jurisdicional da coerção, cabendo ao juiz federal de primeira instância deferi-la somente no processo de execução. A nova postura do STJ permite que seja atendido o devido processo legal, assegurando com mais celeridade a eficácia da sentença arbitral e dissipando as dúvidas até então existentes no sentido de que o artigo 273 do Código de Processo Civil (CPC) é aplicável aos procedimentos de homologação. Ponto igualmente importante na Resolução nº 9 do STJ foi estender às sentenças judiciais estrangeiras a possibilidade da homologação parcial já assegurada na Lei de Arbitragem nacional e na Convenção de Nova York (artigo 38, inciso VI e artigo V, parágrafo 1º, alínea 'c'). Tal norma reflete a consagração do princípio da operosidade, o qual visa a obtenção da melhor produtividade possível de determinado ato. Dessa forma, torna-se possível destacar a parte da sentença estrangeira maculada, para se homologar o restante, novidade esta que no antigo entendimento conservador do Supremo impossibilitaria a homologação da sentença no todo. Objetivou-se com isso favorecer ao máximo o reconhecimento e a execução das sentenças estrangeiras.

A resolução facilita a tramitação e a concessão de pedidos de cooperação jurídica internacional feitos ao Brasil

Uma terceira conquista da resolução em análise diz respeito às decisões provisórias originadas em país estrangeiro que visam assegurar os efeitos da decisão final, como o possível arresto ou penhora de bens do devedor. Anteriormente, o Supremo negava procedência às cartas rogatórias com pedidos executórios, pois as considerava matéria de sentença final, que deveriam transitar em julgado no país de origem e deveriam, portanto, passar pelo processo de homologação. Assim, o Supremo nunca homologava as decisões provisórias, dando seguimento apenas às cartas rogatórias envolvendo pedidos não-decisórios, como a citação. Sem afetar diretamente a sentença arbitral estrangeira, mas não menos relevante para os procedimentos arbitrais, é a previsão de que somente serão analisados pelo STJ os pedidos internacionais que efetivamente necessitem de uma análise criteriosa por parte do tribunal. Os atos que não preencherem esta condição, como os pedidos de cópias de processos, ainda que revestidos da forma de carta rogatória, serão encaminhados ao Ministério da Justiça para que sejam tomadas as medidas necessárias ao seu cumprimento. Por esses e outros motivos, nota-se claramente os efeitos positivos da Resolução nº 9 do STJ. Tal resolução vem facilitar a tramitação e a concessão de pedidos de cooperação jurídica internacional feitos ao Brasil, além de demonstrar a visão inovadora da corte superior no sentido de promover uma nova postura quanto ao reconhecimento e à execução de sentenças estrangeiras. Integra, juntamente com o anteprojeto de lei de cooperação jurídica internacional, uma série de alterações legislativas que visam inserir o Brasil na prática internacional.