Título: Perto do acordo
Autor: Sabadini, Tatiana
Fonte: Correio Braziliense, 17/05/2010, Mundo, p. 14

Premiê turco chega a Teerã para anunciar com Lula e Mahmud Ahmadinejad uma fórmula para superar o impasse nuclear

Governantes e diplomatas do Irã, do Brasil e da Turquia entraram pela madrugada de hoje trabalhando nos últimos detalhes de um acordo para apresentar às potências ocidentais uma fórmula aceitável para a troca de urânio semi-enriquecido iraniano por combustível para seus reatores nucleares de pesquisa. Os termos do acordo, que terá de ser examinados pelos Estados Unidos e demais membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas, devem ser enunciados hoje, em Teerã, depois de uma reunião entre os presidentes Mahmud Ahmadinejad e Luiz Inácio Lula da Silva e o primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan, que se deslocou na noite de domingo para a capital iraniana o sinal mais forte de que a controversa empreitada de Lula caminhava para o sucesso, depois de quase 18 horas de negociações conduzidas também pelos chanceleres Celso Amorim e Manouchehr Mottaki. Estou indo ao Irã porque será acrescentada ao acordo uma cláusula que diz que a troca será feita na Turquia. Teremos a oportunidade de começar o processo em relação à troca. Eu garanto que encontraremos a oportunidade para superar esses problemas, se Deus quiser, declarou o primeiro ministro, pouco antes de partir de Ancara. Ele desembarcou na capital iraniana na noite de ontem. No sábado, Erdogan tinha desistido da viagem porque, segundo afirmou, não via progressos por parte da liderança iraniana. O chanceler turco, Ahmet Davutoglu, que havia chegado a Teerã na manhã de domingo para participar das negociações, foi o primeiro a anunciar que um acordo tinha sido alcançado. Lula e Ahmadinejad mantiveram no domingo três reuniões e deram entrevista coletiva à noite, mas durante todo o dia silenciaram sobre a questão do impasse nuclear. Embora fosse o tema central da visita, cercada de atenção inusual da parte das grandes potências, o assunto foi evitado nas notas oficiais. Falando reservadamente à imprensa brasileira em Teerã, assessores do Itamaraty e outros integrantes da comitiva presidencial manifestavam otimismo com a perspectiva de que as negociações prosseguissem hoje o próprio Lula, que na sexta-feira havia falado em 99% de chance de um acordo, sustentava que o nível de esperança cresceu com a decisão de Erdogan de se integrar às negociações.

Impasse O grande obstáculo para um acordo o Irã e o grupo cinco mais um os membros permanentes do Conselho de Segurança (EUA, Rússia, China, França e Reino Unido) mais a Alemanha é justamente uma fórmula para que o urânio iraniano seja trocado por combustível nuclear. O regime islâmico, alegando desconfiança das potências ocidentais, recusou uma proposta inicial para que seu material radioativo fosse enriquecido na Rússia ou França. A outra parte rechaçou a exigência de que a troca fosse feita em território iraniano e de maneira simultânea. Diante do impasse, e com os EUA em campanha para submeter a República Islâmica a mais um pacote de sanções do conselho, os governos brasileiro e turco apresentaram-se como mediadores para a retomada do diálogo. Lula, que chegou a Teerã na noite de sábado, também se reuniu com o líder religioso supremo, o aiatolá Ali Khamenei, que tem a última palavra em assuntos como política externa e defesa. Khamenei criticou os países ocidentais pelas pressões que fizeram sobre o Brasil. As potências dominantes, em particular os Estados Unidos, estão descontentes com o desenvolvimento das relações entre países independentes e influentes, declarou. Em um comunicado divulgado pelo portal da Presidência iraniana depois do encontro com o colega brasileiro, Ahmadinejad agradeceu a Lula pelo apoio aos direitos da nação iraniana e reafirmou a coincidência entre os dois países sobre a necessidade de reformar a ordem mundial.

Presente de Teerã Um presente para o Brasil, foi como o presidente iraniano, Mahmud Ahmadinejad, definiu a libertação da professora universitária francesa Clotilde Reiss, detida no Irã desde julho de 2009 sob a acusação de espionagem. Ahmadinejad fez a declaração, segundo um integrante da comitiva brasileira, ao receber o colega Lula pela terceira vez no dia, para o encerramento de um encontro entre empresários dos dois países. O presidente francês, Nicolas Sarkozy, agradeceu a Lula e aos líderes do Senegal e da Síria pela intercessão em favor de Clotilde Reiss, que chegou ontem mesmo a Paris e foi recebida no Palácio do Eliseu por Sarkozy e pelo chanceler Bernard Kouchner .