Título: Resolução do Senado reabre debate sobre crédito-prêmio
Autor: Marta Watanabe e Zínia Baeta
Fonte: Valor Econômico, 28/12/2005, Brasil, p. A3

Tributação Medida de Renan Calheiros é favorável às empresas

O Senado publicou ontem uma medida considerada por tributaristas como presente de fim de ano. Trata-se de uma resolução que, na prática, deve criar uma nova discussão sobre a validade do chamado crédito-prêmio de IPI, incentivo criado pelo governo federal em 1969. Várias empresas sustentam que o benefício vale até hoje. Em julgamento de 9 de novembro, porém, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o incentivo valeu apenas até 1983. Advogados dizem que a resolução do Senado é um argumento que será usado para voltar a sustentar que o incentivo ainda vigora. "A resolução tem força de lei e eu deverei anexar a medida do Senado em todos os processos administrativos que acompanho. Só não farei isso imediatamente porque vou esperar o início das atividades do Conselho de Contribuintes no próximo ano", diz o tributarista Edison Fernandes, do Fernandes, Figueiredo Advogados. "Com a resolução passamos a ter um quadro mais robusto de argumentações. A discussão sobre o tema será reacesa", diz o advogado Antônio Nabor Bulhões, do Bulhões Mibielli e Advogados, escritório que representa a Sab Trading Comercial Exportadora, um dos grandes alvos da União na recuperação do crédito-prêmio. "Essa resolução, lamentavelmente, vai estimular novas demandas. Mas não é nada incontornável", diz Manoel Felipe Rego Brandão, procurador-geral da Fazenda Nacional, órgão que defende a União em questões tributárias. Assinada pelo senador Renan Calheiros, a Resolução nº 71/2005 do Senado, deverá ser mais um ato em meio a um emaranhado de normas e decisões judiciais sobre o crédito-prêmio do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), incentivo que dava aos exportadores um crédito equivalente à alíquota interna do imposto. A Constituição Federal dá ao Senado o poder de editar uma resolução estendendo a todas as empresas os efeitos de uma decisão dada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em ação individual. O que a Resolução nº 71/2005 fez foi estender os efeitos de uma decisão consolidada pelo STF em 2002. O alvo da discussão era um decreto que delegava ao ministro da Fazenda o poder de reduzir ou extinguir o benefício fiscal. O Supremo considerou a delegação inconstitucional, o que, na interpretação das empresas, tornaria automaticamente inconstitucional também a revogação do crédito-prêmio. A interpretação prosperou até que a União acabou por utilizar um outro dispositivo legal como argumento, alegando que um dos decretos-leis que regularam o benefício previa expressamente a redução gradual do benefício, com extinção em 1983. Esse foi o argumento que deu vitória à União no julgamento recente de outro tribunal, o Superior Tribunal de Justiça (STJ). O que desperta a curiosidade dos tributaristas é que a resolução do Senado não foi editada imediatamente após a decisão que o Supremo consolidou há três anos e somente agora, depois do julgamento do STJ. Para o advogado Edison Fernandes, a resolução do Senado dá às empresas um argumento a mais porque seu texto diz que o crédito-prêmio está em "vigência", citando vários dispositivos legais que nunca chegaram a ser alvo das decisões do Supremo ou do STJ. O texto da resolução menciona inclusive um dispositivo usado por poucos advogados e que cita o crédito-prêmio de IPI, embora esteja em meio a uma lei sobre reforma ministerial. O procurador Manoel Felipe Rego Brandão prefere não tecer comentários sobre o texto da resolução. "Eu prefiro acreditar que houve uma imprecisão da norma, uma redação infeliz." Para ele, a resolução do Senado tem efeitos limitados e não pode alterar o que a lei já fez. O argumento do procurador encontra eco em tributaristas que defendem empresas. "A resolução do Senado não pode ir além da decisão do STF", diz o advogado Hélcio Honda, que considera "no mínimo estranho" a edição da medida pelo Senado neste momento. "As decisões do STJ e do STF são muito diversas, sobre argumentos totalmente diferentes", diz Honda, que é assessor jurídico da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). "Essa medida vai causar muita confusão", prevê. O advogado Ronaldo Redenschi, sócio do Vinhas Advogados, segue a mesma linha. "Achei estranha essa resolução. Ela cria um fato, mas não muda o quadro do julgamento do STJ."