Título: Governo estuda mercado secundário de gás para viabilizar térmicas
Autor: Leila Coimbra
Fonte: Valor Econômico, 19/11/2004, Brasil, p. A-2

Para viabilizar a geração termoelétrica a gás no país, o governo pretende criar um mercado secundário de gás, regulamentado por lei. A proposta está em análise no Ministério de Minas e Energia. Segundo a ministra da pasta, Dilma Rousseff, a premissa deste mercado secundário é permitir que as usinas termoelétricas possam revender o gás à indústria quando este não estiver sendo consumido para a geração de energia elétrica. Esta revenda seria feita por um preço atrativo à indústria, contanto que, caso a usina precise do gás para gerar, teria a garantia legal de que o receberia de volta. Para garantir este mecanismo, Dilma explica que seria necessário que as empresas que comprassem o gás da termoelétrica se garantissem com algum outro tipo de suprimento, um "back up", nas eventuais faltas do insumo. Quando o gás fosse interrompido, para uso primário nas termoelétricas, a indústria voltaria sua planta para a matriz energética original. A ministra explicou que uma das idéias é criar uma escala de preços de acordo com a ordem de cortes do fornecimento. Nesta lógica, as primeiras empresas que teriam que devolver o gás à usina pagariam mais barato por ele, enquanto as últimas a sofrer o corte pagariam mais caro. O gás adquirido por uma térmica de médio porte é suficiente para abastecer pelo menos 10 grandes indústrias consumidoras. "Não tem sentido um volume tão grande de gás ficar parado enquanto uma térmica não está gerando. Os agentes do setor ficaram durante muito tempo discutindo o 'take or pay' (cláusula dos contratos que exige o pagamento pela commodity mesmo sem o seu consumo). Não acho que isso será mais um ponto de discussão com um mercado secundário". O mecanismo de "vender duas vezes" o gás baratearia os custos do insumo tanto para os investidores das usinas como para a indústria consumidora de gás, segundo Dilma. Ela explicou que esse modelo já vigora em vários países com mercado de gás desenvolvido, dentre eles a Argentina, a França e a Espanha. "A criação do mercado secundário solucionaria o problema da ociosidade da utilização do gás natural em alguns períodos do ano pelas usinas". Dentro das regras de otimização do sistema elétrico nacional, uma térmica só produz energia quando um reservatório de uma hidrelétrica está em um nível muito baixo de armazenamento do água ou em casos de explosão de consumo sem oferta suficiente. Em um ano de muitas chuvas, as usinas geram somente 2% de sua capacidade total, em média. Segundo estudo apresentado recentemente pela Associação dos Geradores Termoelétricos (Abraget), a participação da geração térmica deveria estar entre 23% a 33% da capacidade total instalada. Mas, atualmente, essa participação é de apenas 15%. Dilma disse que o aumento da oferta do insumo no país é uma das suas preocupações. A formatação de um novo modelo para o gás no Brasil também é uma das prioridades da ministra. Mas ele ganhará forma somente em 2005, depois dos primeiros leilões de novas usinas no país. Segundo Dilma, também está em discussão no ministério a necessidade de ampliação do Gasoduto Bolívia Brasil (Gasbol), hoje com capacidade de transportar até 30 milhões de metros cúbicos de gás por dia, em mais 4 milhões de metros cúbicos diários. A outra alternativa para atender ao rápido crescimento do mercado, ainda segundo Dilma, será a antecipação da produção do gás descoberto pela Petrobras na bacia de Santos. A produção deste poço poderia ser enviada para o Nordeste por meio do Gasene, projeto que já atraiu o interesse de chineses e japoneses. A interligação de dutos com países vizinhos produtores de gás como a Bolívia e a Argentina também está em negociação. Para fechar a interconexão, estes dois países falta apenas a construção de um pequeno trecho de gasodutos entre Uruguaiana, na fronteira com a Argentina, e Porto Alegre.