Título: Após longo desgaste, Lula troca Lessa por Mantega
Autor: Claudia Safatle e Cristiano Romero
Fonte: Valor Econômico, 19/11/2004, Brasil, p. A-3

Depois de um longo processo de desgaste, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva demitiu ontem o presidente do BNDES, Carlos Lessa. Para o lugar de Lessa, o presidente nomeou o ministro do Planejamento, Guido Mantega. Nélson Machado, secretário-executivo do Ministério do Planejamento, assumiu interinamente a pasta. Darc Costa, vice-presidente do BNDES e braço-direito de Lessa, também deixará o banco. Assessores do Palácio do Planalto confirmaram a demissão de Lessa no início da tarde de ontem, após encontro do presidente com o economista. Oficializada apenas no início da noite, a decisão, no entanto, já estava tomada desde terça-feira, quando, em entrevista ao Valor, Lessa atacou pela segunda vez, em apenas dois dias, a política econômica e a pessoa do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Naquele mesmo dia, o presidente convidou Mantega para o lugar de Lessa e o ministro teve, na quarta-feira, um longo encontro com seu colega, Luiz Fernando Furlan, do Desenvolvimento, a quem o BNDES é formalmente subordinado. A preocupação de Mantega era de acertar com Furlan um trabalho de equipe, em lugar do relacionamento atribulado que Lessa havia cultivado. Lula planejava demitir Lessa apenas quando fosse promover a reforma ministerial, mas, depois da entrevista ao Valor, a situação do economista se tornou "insustentável", segundo um assessor direto do presidente. O presidente considerava Lessa um amigo e, por isso, teve dificuldades para demiti-lo. Além disso, achava positivo o fato de o presidente do BNDES fazer um contraponto crítico à ortodoxia econômica, embora discordasse da forma como ele fazia isso. Há meses Lula vinha advertindo Lessa para que parasse de criticar publicamente a política econômica, mas o ex-presidente do BNDES não lhe deu ouvidos. No últimos dias, o presidente ficou preocupado com o impacto das desavenças. "Lessa criou um mal-estar que poderia atingir o mercado", disse um colaborador do presidente. Ontem, Lula passou a tarde reunido com os ministros que integram o núcleo do poder em Brasília, discutindo nomes para o comando do Planejamento. Após quase quatro horas, não se chegou a uma solução. Um dos mais cotados é o deputado Paulo Bernardo (PT-PR), atual presidente da Comissão de Orçamento do Congresso e parlamentar do PT mais antenado com a política econômica e o ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Outros citados, com menor força, foram o deputado Jorge Bittar (PT-RJ), o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, e o empresário e amigo do presidente Antoninho Marmo Trevisan. Um nome que corre por fora, com a simpatia de Palocci, é o de Nélson Machado, que assumiu o cargo interinamente. Desafeto de Lessa desde o primeiro mês do governo Lula, Palocci trabalhou intensamente nos bastidores pela indicação de Mantega. Embora não deseje no comando do Planejamento um ministro que não esteja identificado com a política econômica, o ministro da Fazenda está menos preocupado com o preenchimento desse cargo do que estava com o BNDES. Com a saída de Lessa, o clima ontem, na Fazenda, era de discreta comemoração. "O banco é um instrumento de ação que pode prejudicar a política econômica. O ministério, não", comentou um assessor. Cogitado várias vezes para assumir o Ministério do Planejamento, o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), negou de forma categórica que tenha sido convidado agora. Um dos padrinhos da permanência de Lessa no BNDES, o senador almoçou ontem com Lula e foi à tribuna do Senado lamentar a demissão do economista. "Quero agradecer ao presidente Lula por ter me poupado das consultas prévias, porque ele sabia da minha posição. Agradeço a deferência que teve comigo", disse o senador. E defendeu Lessa: "Ele era um polemista, como todos os intelectuais, e seu perfil intelectual muitas vezes atravessava a linha divisória das autoridades." O presidente, ao escolher Mantega, o fez para não ceder demais aos liberais e, ao mesmo tempo, nomear alguém absolutamente afinado com Palocci. Mantega leva só três pessoas com ele e nenhuma com cargo definido: o assessor especial Antonio Barros de Castro, que já foi presidente do BNDES, o economista Demian Fioca, e o assessor de imprensa, Ricardo Moraes. Nenhum para substituir Darc Costa. Esse nome ainda não está definido.