Título: Mantega diz que preservará linha desenvolvimentista
Autor: Sergio Leo
Fonte: Valor Econômico, 19/11/2004, Brasil, p. A-4

Em sua primeira entrevista coletiva já como novo presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Guido Mantega afirmou que continuará com a missão de executar projetos prioritários do governo, como um banco de desenvolvimento e não de investimentos; que substituirá seu polêmico vice-presidente, Darc Costa; e que terá uma relação de "sintonia", mas não de subordinação, ao Ministério do Desenvolvimento, comandado por Luiz Fernando Furlan. Mantega evitou qualquer crítica à política econômica - ao contrário do seu antecessor, Carlos Lessa, que caiu pelos atritos com os responsáveis pelas políticas fiscal e monetária do governo. "Não há heterodoxia em nenhum segmento do governo, cada um cumpre um papel diferente", contemporizou Mantega, ao responder se manteria a divisão exposta por Lessa, entre desenvolvimentistas e ortodoxos no governo Lula. "Quem faz a política monetária tem de ter um comportamento, quem faz a política fiscal tem outro, não vejo essa divisão." Satisfeito com a troca de cargo, como fez questão de dizer, o novo presidente do BNDES esquivou-se repetidamente de perguntas sobre sua futura relação com o Desenvolvimento, a quem o banco é formalmente subordinado. Uma das razões do desgaste de Lessa foi sua insistência em mostrar que respondia apenas a Lula, e não devia satisfações a Furlan. Sem responder diretamente à questão, que classificou de "semântica", Mantega listou o Desenvolvimento como mais um, entre os outros ministérios com quem pretende ter uma "relação de sintonia". "O Ministério do Desenvolvimento é importante para a formulação de uma política industrial, assim como é o Ministério do Planejamento; e o BNDES é fundamental para a política de desenvolvimento", comentou Mantega, citando os programas de financiamento facilitado a empresas, Modermaq, Moderfrota e Modercarga. "O BNDES executa a partir da orientação dada pelos demais ministérios, inclusive o do Desenvolvimento." Na conversa com Lula, em que aceitou o convite para o banco, Mantega obteve a garantia de que continuará participando de todas as instâncias de decisão na política econômica, inclusive a Câmara de Política Econômica, onde Lessa não tinha assento. "O presidente me deu orientação de fazer com que o BNDES continue sendo o principal instrumento para implementação da politica econômica do governo, particularmente a política industrial", explicou, lembrando que o banco é a maior instituição financeira da América Latina (maior até que o Banco Interamericano de Desenvolvimento), com orçamento, para 2005, de R$ 60,8 bilhões. O orçamento que passará a controlar até inspirou Mantega a fazer graça com a pergunta sobre seu rebaixamento, de ministro a presidente de banco oficial, cargo teoricamente de segundo escalão. "Saio para um cargo que tem R$ 60 bilhões na mão para liberar. Antes eu estava num cargo em que eu tinha que conter (verbas)", comentou. Mantega fez repetidas referências à orientação do presidente para garantir e acelerar a liberação dos recursos do BNDES destinados ao financiamento das empresas privadas, dando a impressão de que estaria endossando as críticas a Carlos Lessa, de morosidade na liberação de financiamentos. O banco prevê a liberação, até este mês, de aproximadamente R$ 38 bilhões, de um orçamento de pouco mais de R$ 47 bilhões, o que despertou críticas no setor privado, repetidas pelo ministro do Desenvolvimento, e pelo secretário do Tesouro, Joaquim Levy, adversários, no governo, do ex-presidente do BNDES. Mantega, que elogiou Lessa pelo seu trabalho de restituir ao BNDES a prioridade para o desenvolvimento, garantiu que não teve intenção de criticar seu antecessor. "Claro que o banco deve ter agilidade na liberação dos financiamentos, tem de fazer o mais rápido possível", comentou. "Houve avanços na gestão anterior, mas sempre é possível melhorar e vamos melhorar o desempenho do banco", prometeu. Mantega atribuiu a sobra de orçamento do banco à conjuntura econômica, de início da recuperação das atividades industriais, que, na avaliação do novo presidente, teria levado as empresas a reestruturar-se sem, ainda, aumentar investimentos em grande volume. "Talvez tenhamos posto dinheiro demais no BNDES", minimizou. Como todos os assuntos potencialmente delicados para a equipe econômica e a política conservadora em relação aos juros, Mantega negou-se a comentar a reivindicação do ex-presidente do BNDES, de redução da taxa de referência dos juros do banco, a TJLP, hoje em 9,75% (que Lessa acusava de desestimular projetos de investimento e queria reduzir para 8%). Ainda ministro, Guido Mantega afirmou que, nos próximos dias, o governo anunciará um grande programa de desburocratização, redução de gastos e melhoria no desembolso de recursos. Hoje, ele recebe no ministério a missão do FMI em visita ao Brasil.