Título: Choque de realidade
Autor: Batista, Vera; Bancillon, Deci
Fonte: Correio Braziliense, 12/05/2010, Economia, p. 10

Investidores deixam a euforia de lado e questionam socorro à Zona do Euro. Bolsas desabam. BC compra dólar e reservas vão a US$ 250 bilhões

A euforia durou pouco. Depois de se empanturrarem de esperança com o socorro de 750 bilhões de euros (R$ 1,7 trilhão) à Zona do Euro anunciado pela União Europeia e pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), os investidores tomaram ontem um porre de realidade. Conscientes de que, mesmo gigante, a ajuda não será suficiente para reverter o caos fiscal instalado na região e que, a Qualquer momento, pode resultar em uma onda sem precedentes de calotes, voltaram a empurrar as principais bolsas de valores do planeta ladeira abaixo. Começa a se espalhar a visão de que, liderados pela Grécia, que está em situação calamitosa, os países mais problemáticos da Zona do Euro, como Espanha e Portugal, não conseguirão cortar drasticamente seus gastos, conforme exigem o FMI e a União Europeia. Esse pensamento ganhou força devido à necessidade imediata do governo grego de se apoderar de 20 bilhões de euros da primeira parte do auxílio emergencial liberado após muitas divergências e má vontade entre as nações mais ricas que integram o bloco econômico. Desde o início do dia de ontem, os negócios foram marcados pela indefinição e pela cautela, cenário que se tornou transparente depois do fechamento dos mercados da Ásia. A Bolsa de Tóquio, que havia iniciado a sessão em forte alta, cravou perdas de 1,14%. Em Cingapura, a baixa ficou em 1,08%. Na Indonésia, houve prejuízo de 1,32% e, na Índia, de 1,11%. Na China, a Bolsa de Xangai recuou 0,27%. O movimento contaminou o mercado europeu, que registrou perdas durante todo o dia. A exceção foi Frankfurt, na Alemanha, com ligeira valorização de 0,33%. Paris tombou 0,73%. Em Londres, houve queda de 0,99% e, em Milão, de 0,46%. A Bolsa de Madri, que, na véspera, havia registrado a excepcional alta de 14,4%, despencou 3,32%. Em Atenas, o recuo foi de 2,44%. Nos Estados Unidos, não foi diferente. Em meio à desconfiança, o índice Dow Jones, da Bolsa de Nova York, baixou 0,34%. Na Nasdaq, houve estabilidade. Brasil cai 1,57% No Brasil, o mercado acionário não fugiu à regra e também viveu um dia de ressaca e de indecisão. Na Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa), o Ibovespa, principal índice de lucratividade do pregão paulista, oscilou como uma gangorra, acumulando ganhos e perdas durante toda a sessão. Ao fim do dia, registrou queda de 1,57%. A baixa teria sido maior não fosse o bom desempenho das empresas de telecomunicações. As ações da TIM chegaram a subir 8,06%. Os papéis da Vivo também tiveram boa aceitação, e variaram 5,05%. A maior procura por esses ativos refletiu o otimismo com a oferta feita pela Telefónica, de 5,7 bilhões de euros, para a compra de metade da participação da Portugal Telecom na Vivo. A empresa é sócia na holding Brasicel, que tem o controle da maior operadora brasileira de telefonia celular. Entre os analistas, o sentimento é de apreensão. E como ninguém acredita em solução tão cedo para a crise na Europa, a recomendação é de cautela. Na opinião dos especialistas, os investidores, especialmente os que não têm amplo conhecimento do mercado acionário, devem ficar longe do pregão da BM&FBovespa. Entrar na bolsa neste momento, só se for muito bem assessorado. Qualquer deslize pode custar caro. Essa dica ganha relevância diante do que disse o economista Robson Gonçalves, da Fundação Getulio Vargas: Aqui, muita gente aproveitou o momento de incerteza e especulou. Depois da absurda alta do dia anterior, abriram-se grandes possibilidades para quem queria ganhar dinheiro. Só isso. Não teve nada a ver com a Grécia ou a China, destacou.

Seguro reforçado No mercado de câmbio, o dia foi de leve recuperação para o dólar ante o real, com a ajuda do Banco Central, que voltou a intervir nos negócios comprando o excesso de divisas. O dólar fechou a terça-feira cotado a R$ 1,785 para venda, com alta de 0,68%. As compras realizadas pelo BC, que deixaram clara a sua disposição de evitar o derretimento da moeda americana, levaram as reservas internacionais do país a superar a marca histórica de US$ 250 bilhões. Esse número só será divulgado oficialmente no fim desta semana.