Título: Serra supera mais um obstáculo
Autor: Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 31/01/2006, Política, p. A5

O prefeito de São Paulo, José Serra, fez mais um importante movimento nas articulações para se tornar o candidato do PSDB à sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva: se ganhar a eleição, o compromisso de Serra com os tucanos é o de governar por apenas quatro anos, sem reivindicar um segundo mandato. Trata-se de uma novidade em relação à proposta inicialmente colocada sobre a mesa, qual seja, o fim puro e simples da reeleição e o restabelecimento do mandato de cinco anos, como foram os de José Sarney (1985-1990) e de Fernando Collor-Itamar Franco (1990-1995). A proposta tramita no Congresso, sem chances de avançar em 2006. Serra é contrário à reeleição e sempre manifestou dúvidas sobre a eficácia desse instituto. Na avaliação do prefeito, quando um governo tem rumo e tem planejamento, quatro anos é o suficiente para ele fazer tudo o que se propôs na campanha. É um discurso que seduz a fila de tucanos impacientes com a perspectiva de ter que esperar até 2014 para empreender a aventura presidencial. Essa é atualmente a expectativa em relação a Geraldo Alckmin, na hipótese de o governador de São Paulo ser o indicado do PSDB e vencer as eleições de outubro. O jovem governador de Minas Gerais, Aécio Neves, que programou a carreira política de modo a ser candidato a presidente em 2010, esperava de Alckmin um gesto semelhante ao de Serra. Ao contrário do prefeito de São Paulo, no entanto, Alckmin hesita em firmar um compromisso nesses termos e tem reiteradas vezes louvado o instituto da reeleição. Aécio Neves, aliás, acredita que um entendimento tucano em relação ao fim da reeleição deveria ser um dos "critérios" para a escolha do candidato tucano, além das pesquisas de opinião. Entendimento que poderia interessar ao próprio Alckmin - na hipótese de Serra ser o candidato e se eleger, o governador estaria novamente a postos já em 2010, desta vez para disputar a indicação com Aécio Neves. Ou ao presidente do PSDB, Tasso Jereissati, sempre um candidato em potencial dos tucanos.

Prefeito aceita não disputar reeleição

Era, portanto, previsível que Serra pudesse avançar no que se refere ao fim da reeleição, numa tentativa de desobstruir as trilhas que levam à sua indicação pelo PSDB. Com eficiência e discrição, o prefeito tem ultrapassado diferentes obstáculos na pista. "Para governos que começam sem saber o que fazer, efetivamente, quatro anos é pouco porque passam dois, três anos à procura de rumo. Às vezes nem encontram. Nós começamos desde o primeiro dia com rumo, por isso dá tempo", disse José Serra, recentemente, em solenidade numa favela da periferia de São Paulo. Sinalização que passou despercebida do público em geral - e da imprensa em particular -, mas não de seus destinatários, os atentos eleitores do sacro colégio tucano que até março escolherá o candidato do PSDB. Evidentemente que a reeleição de Lula está no horizonte dos cenários desenhados no PSDB. Numa análise consolidada de várias pesquisas, o conglomerado tucano-pefelista concluiu que Lula tem hoje 28% dos votos fechados com ele, e que há uma faixa de 10% a 12% do eleitorado que pode até desconfiar que é branco o que o presidente disser que é preto, mas que tende a acompanhá-lo, porque é ele que está falando. O candidato antítese de Lula, por outro lado, compreenderia uma faixa entre os 25% e os 30%, que hoje declara não votar em Lula de jeito nenhum. Restaria então algo entre 30% e 35% onde a eleição será decidida. Identificar quem são esses eleitores, onde eles estão localizados e qual a lógica do seu voto é a tarefa a que estão dedicados os tucanos. Exercício de especulação: se for o lúmpen das periferias, o impacto do aumento do salário mínimo deve ser enorme, o que beneficiaria consideravelmente a candidatura reeleitoral de Lula. Aliás, a análise detecta que o eleitorado atual do presidente já não é o mesmo que o elegeu em 2002. O presidente perdeu na classe média, mas ganhou muito no Nordeste, especialmente entre os mais pobres. É provável que mesmo com a a vitória de Lula o fim da reeleição entre na pauta política de 2007. O presidente não é um grande entusiasta da idéia, e é crescente o número de congressistas desconfiados das virtudes da reeleição: no terceiro e quarto anos do mandato, o governante não faz outra coisa que não tratar da recondução por mais quatro anos. Basta olhar a agenda de trabalho de Lula no último mês.