Título: Bolívia endurece leis de trabalho e libera coca
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 30/01/2006, Internacional, p. A9

Polêmicas Evo Morales restringe demissões e finda erradicação de coca

O presidente da Bolívia, Evo Morales, tomou duas medidas polêmicas: proibiu a demissão sem justa causa dos trabalhadores e designou um líder do movimento dos plantadores de coca (cocaleiros) como vice-ministro da Coca e do Desenvolvimento, num momento em que suspende a erradicação de coca. Com esses dois gestos, Morales se indispôs com o empresariado boliviano - segundo o qual a medida trabalhista inviabilizaria a contratação de pessoal num momento de recuperação econômica -, e com os EUA, temerosos de que a suspensão da erradicação do plantio de coca dê fôlego ao narcotráfico. Para o empresariado, a medida trabalhista fará com que as contratações diminuam. O presidente da Confederação de Empresários Privados da Bolívia (CEPB), Roberto Mustafá, disse também querer estabilidade de emprego, "mas por meio da estabilidade econômica, e não por decreto". Segundo o ministro do Planejamento e Desenvolvimento Sustentável, Carlos Villegas, o governo de Morales, "dará respaldo para que todos os trabalhadores tenham segurança trabalhista, emprego estável e permanente. "Os trabalhadores têm de ter certeza de sua fonte de trabalho e de rendas seguras", disse. Villegas, que é tido como um "superministro" da área econômica, negou que a revogação da legislação de 20 anos que dava liberdade de demissão ao empresariado vá atrapalhar os planos de crescimento do país. O governo não disse ainda se vai revisar o salário mínimo, que hoje de 450 bolivianos (R$ 130). Quanto ao novo ministro da coca, Felipe Cáceres, ele é dirigente de seis federações de cocaleiros do país e deve liderar uma campanha para retirar a folha de coca da lista de entorpecentes das Nações Unidas, promessa feita por Morales durante a campanha presidencial. Morales disse que seu governo respeitará o limite imposto às plantações de folha de coca (12 mil hectares em todo o país), mas deixou claro que não haverá "coca zero". Em Santa Cruz, Estado mais importante economicamente no país, o governador Rubén Costas Aguilera, de oposição a Morales , relançou a campanha por maior autonomia. Esse tema deve ser tratado na Assembléia Constituinte que o presidente prometeu inaugurar até julho. "Somos capazes de nos autogovernar, sem mendigar falsas promessas de falsos profetas", disse o governador, que tomou posse no fim de semana. A Bolívia só começou a escolher seus governadores por meio de eleição direta no último pleito. Amanhã, todos os nove governadores da Bolívia se reúnem com o presidente. Na pauta, devem discutir maior autonomia e maiores repasses de renda pelo governo federal. A primeira semana de governo Evo Morales se deu em meio a polêmicas e a surpresas quanto à formação de seu gabinete. Na terça-feira, ele cortou seu salário pela metade, numa atitude classificada pela oposição como populista e demagógica. Na quinta-feira, o presidente da YPFB disse ter um plano para a retomada das refinarias do país, que hoje são administradas pela Petrobras. O governo disse, entretanto, que não há cronograma acertado para isso. No Brasil, as autoridades encararam a polêmica apenas como "fogos de artifício" para o público interno da Bolívia. O governo Morales conta com mais de 74% de apoio popular.