Título: Aumento de 550% no transporte de energia congela investimentos
Autor: Leila Coimbra e Vera Saavedra Durão
Fonte: Valor Econômico, 30/01/2006, Empresas &, p. B1

Eletricidade Preços explodiram com a cobrança de impostos e encargos no pedágio do fio

O pedágio pago pela indústria às concessionárias de energia elétrica pelo uso de sua infra-estrutura subiu 549% nos últimos seis anos, já descontada a inflação do período. Esse aumento explosivo do transporte de energia está levando grandes consumidores das áreas de mineração e alumínio a suspender investimentos no país e a rever suas estratégias de abastecimento de eletricidade. Desde o ano de 2000, o aumento nominal da tarifa de uso do fio da distribuidora de energia, somados os encargos, chega a 1.177%. Os dados são da Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia Elétrica (Abrace) e simulam os custos de um cliente da Cemig com consumo médio anual de 800 gigawatt hora (GWh). Os preços do transporte de energia explodiram nos últimos anos porque houve uma separação dos preços da tarifa: agora, parte paga a commodity e outra o pedágio do uso da infra-estrutura. Mas, no pedágio do uso do fio estão incluídos 10 encargos setoriais, além de impostos, tributos e a remuneração do investimento dos donos da linha. No ano passado, somente os encargos, sem os impostos e tributos, representaram um custo de R$ 13 bilhões aos consumidores de energia, segundo estimativa da Abrace. Em 2002, esses encargos somaram R$ 5,4 bilhões, valor muito menor que a metade do que foi recolhido em 2005. Essa alta nos custos de energia tirou a competitividade da fábrica de alumínio da Novelis (ex-Alcan) localizada em Ouro Preto (MG). A unidade mineira é pequena, com produção de apenas 50 mil toneladas e está impossibilitada fisicamente de ser ampliada, segundo o diretor de energia da Novelis, Cláudio Campos. Além disso, a companhia opera com tecnologia antiga e a bauxita extraída no entorno da fábrica é de baixa qualidade. "As regras mudaram no meio do jogo e a nossa única vantagem competitiva, que era o preço baixo da energia, já não existe mais". A empresa já cogita comprar alumínio primário de terceiros. A Novelis leva para Ouro Preto a energia da hidrelétrica Risoleta Neves (ex-Candonga), onde possui 50% do projeto - a metade restante é da Companhia Vale do Rio Doce. A hidrelétrica fica a apenas 100 km de distância da unidade de Ouro Preto. Mas, para percorrer esse pequeno trecho a energia chega 100% mais cara para a Novelis, por conta do preço da transmissão e da distribuição, pagos à Cemig. Os preços do transporte de energia prometem também congelar um investimento de US$ 120 milhões da Novelis na construção do complexo hidrelétrico de Caçu/Barra dos Coqueiros, em Goiás, já que ficará muito caro enviar essa energia para as unidades da Novelis espalhadas pelos Estados da Bahia, de Minas Gerais e de São Paulo. Além disso, Campos explica que o projeto hidrelétrico de Goiás está emperrado por problemas ambientais. Essa alta descontrolada dos custos do transporte de energia também já força a maior mineradora de ferro do mundo, a Companhia Vale do Rio Doce, a rever sua estratégia na área energética. A empresa já anunciou que sairá da hidrelétrica de Foz do Chapecó, entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul, por conta dos preços da transmissão. A Vale possui como sócios em Foz do Chapecó as companhias de energia CPFL e a estatal gaúcha CEEE - um investimento de R$ 2 bilhões, dois quais 43% são de responsabilidade da Vale. O presidente da companhia, Roger Agnelli, disse que pretende investir na produção de energia a carvão, em usinas próximas das suas unidades industriais, em vez de hidrelétricas em pontos remotos do país, cujo custo do transporte começa a inviabilizar os projetos. "O investimento em transmissão é pesado, de alguns bilhões de reais. Pode valer mais a pena fazer térmica a carvão", disse Agnelli. Outro grande auto-produtor de energia, a mineradora BHP Billiton Metais, pretende se desfazer da fatia de 16,48% que detém na hidrelétrica de Estreito , um projeto de R$ 2,5 bilhões e com capacidade de produção de 1.087 MW, na divisa entre Maranhão e Tocantins. A estatal Eletronorte já iniciou as conversas com o consórcio responsável pela construção de Estreito, composto pela Tractebel e Vale do Rio Doce (ambas com 30%); Alcoa Alumínio (19,08%); e Camargo Corrêa Energia, (4,44%). O especialista em energia e dono da Interact Consultoria, Rafael Herzberg, diz que em média a transmissão representa 50% dos custos de energia. Mas, quanto maior o consumidor é, mais a transmissão pesa nos custos finais. Isso porque, segundo o raciocínio de Herzberg, quando o cliente é um grande consumidor, a comodity energia costuma ser comprada por preços melhores, em maior escala. Isso faz com que os preços do uso do fio fiquem proporcionalmente maiores. O vice-presidente da associação dos grandes consumidores industriais de energia, Eduardo Spalding, afirma que não só a transmissão, mas também o pedágio pago pelos consumidores às distribuidoras vem encarecendo além da conta e inviabilizando investimentos. "Houve uma explosão dos preços do transporte da energia como um todo, e não só a transmissão ou a distribuição encareceram", diz ele. Além disto, diz ele, também cresceram os encargos setoriais cobrados dos grandes consumidores, afirma Spalding. O ministério de Minas e Energia preferiu não comentar o assunto alegando que o as tarifas tanto de distribuição como de transmissão são reguladas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).