Título: Fed pode antecipar fim do aperto
Autor: Luiz Sérgio Guimarães
Fonte: Valor Econômico, 30/01/2006, Finanças, p. C2

Após um reinado de 18 anos, Alan Greenspan preside amanhã a sua última reunião do Comitê de Mercado Aberto do Federal Reserve (Fed) sob acusação de ter errado na dose do aperto monetário iniciado em junho de 2004. Para analistas, decepcionados com o baixo crescimento exibido pela economia americana no quarto trimestre de 2005, o arrocho que elevou o juro básico de 1% para 4,25%, ao ritmo ininterrupto de 0,25 ponto de alta em 13 reuniões, pode ter sido excessivo. Em sua despedida, Greenspan sofre acusações de conservadorismo similares às desfechadas contra o Banco Central brasileiro a partir de meados de dezembro, após a divulgação da fraca produção industrial de novembro (alta de 0,7%). Apesar das críticas, o resultado da reunião de amanhã do Fed já está dado. Por estar amplamente "precificada", mais uma alta de 0,25 ponto é tida como absolutamente certa. A taxa básica subirá para 4,50%. Mas a certeza dos analistas de que o Fed procederia a mais um aumento de 0,25 ponto, para 4,75%, no encontro de 28 de março para só então estabilizar a taxa, já não existe mais. Depois do dado sobre a expansão medíocre do PIB no quatro trimestre - alta de 1,1%, o ritmo mais fraco de crescimento dos últimos três anos, ante expectativa média de avanço de 2,8% -, já se considera seriamente a hipótese de a alta a ser concretizada amanhã encerrar o ciclo de aperto. Ben Bernanke começaria o seu reinado sem mexer nos fed funds. A possibilidade de interrupção mais cedo do que se esperava do arrocho americano sinaliza a permanência em nível elevado, e talvez por mais tempo, da vasta liquidez internacional. As críticas à "ortodoxia" do Fed foram muito mais suaves do que as dirigidas ao BC brasileiro. Não só porque o dado do PIB do quatro trimestre tenderá a ser revisto para cima. Subiu menos do que se previa mas o motivo permanece o mesmo: os efeitos danosos decorrentes da safra de furacões. Ou seja, não indicaria uma tendência. Para o Fed, ao contrário do dilema na nacional, o problema se resume a recalibragem muito sutil dos juros. E Greenspan irá se aposentar coberto de glórias. Durante a sua gestão, de 1987 para cá, o PIB dos EUA cresceu em termos reais cerca de 75%. O dado, baseado em números do FMI, ainda não é exato porque falta o PIB relativo a 2005. Essa sintonia fina do juro americano não será difícil a Ben Bernanke, adepto também do pragmatismo discricionário de Greenspan. Já para o BC do Brasil a questão do excesso de conservadorismo é uma encrenca colossal.

Na era Greenspan, PIB cresceu 75% reais

Embora a mediana das expectativas das cem instituições que alimentam de dados o boletim Focus do BC ainda aponte para um crescimento da economia brasileira de 3,5% este ano, amplia-se a porção de importantes bancos que já não vêem a possibilidade de expansão maior do que 3% se não houver um efetivo e rápido afrouxamento monetário. Na opinião dos economistas do Credit Suisse, o crescimento precisa se acelerar muito para que o PIB feche o ano com alta de 3%. Mesmo na hipótese mais otimista lançada pela instituição, o PIB não se expandiria com a força dos 4% esperados oficialmente pelo BC. "Replicando o crescimento trimestral de 2004 para 2006 - considerando que a economia tenha um padrão de crescimento similar ao observado em 2004 - mesmas taxas trimestre contra trimestre anterior, com ajuste sazonal -, o PIB se expandiria apenas 3,8% em 2006", diz relatório do banco. Para o consultor Alexandre Marinis, da Mosaico Economia Política, a ampliação dos gastos públicos será insuficiente para garantir o crescimento desejado pelo governo. "Dificilmente o impulso fiscal resultante da redução do superávit primário de cerca de 4,9% do PIB em 2005 para 4,25% em 2006 conseguirá elevar a taxa de crescimento do Consumo do Governo para os 4% previstos oficialmente. A maior taxa de crescimento do Consumo do Governo em um ano fechado foi 2,8%, registrada em 1992", diz o consultor. Marinis lembra que ao agendar a divulgação do PIB fechado de 2005 para 24 de fevereiro, uma sexta-feira véspera do feriado de Carnaval, o governo provavelmente conseguirá reduzir o impacto negativo que o baixo crescimento econômico do ano passado poderia voltar a exercer sobre a opinião pública. Mas esse despiste terá efeito transitório. Os dados sobre a atividade no primeiro semestre do ano irão frustrar os eleitores. "O presidente Lula precisa buscar outros mecanismos para despertar os ânimos de produtores e consumidores e acelerar a economia em 2006. A continuar se fiando fundamentalmente na ampliação do gasto público, o presidente arriscará, sobretudo, suas próprias perspectivas eleitorais", diz Marinis Já que o BC colocou o câmbio na linha de frente do ataque à inflação, poderia usar o juro para aquecer a atividade econômica. Na sexta-feira, ficou nítida a intenção do BC de desacelerar cada vez mais as suas intervenções cambiais. Para não aumentar sua posição ativa em dólar, vendeu somente 2.950 contratos de swaps reversos, para uma oferta já reduzida de 4,25 mil. Com isso, comprou no mercado futuro somente US$ 138,2 milhões. Na véspera, havia comprado US$ 189,1 milhões e, na terça-feira, US$ 203,79 milhões. De nada adianta ampliar a oferta (4,55 mil hoje) se o BC reluta em vender. Com o sinal de queda verde, o dólar desvalorizou-se 0,63% na sexta-feira, para R$ 2,2170, ampliando para 4,65% a baixa sofrida no mês.