Título: Câmbio valorizado em ano eleitoral é uma estratégia antiga, mostra FGV
Autor: Sergio Lamucci
Fonte: Valor Econômico, 30/01/2006, Finanças, p. C2

O câmbio valorizado pode ser um dos trunfos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na disputa eleitoral deste ano, ao ajudar no controle da inflação e elevar os salários reais. Ao manter o dólar barato nos meses que antecedem as eleições, o governo lança mão de uma prática velha no Brasil, como deixa claro um estudo de Maria Cristina Terra e Marco Bonomo, da Fundação Getúlio Vargas (FGV) do Rio, sobre a evolução da taxa de câmbio antes e depois de votações ocorridas entre 1964 e 1997. O trabalho mostra ainda que, nos meses que se seguem às eleições, a tendência é de uma desvalorização maior. Em entrevista ao Valor, Maria Cristina lembra que o governo não consegue escolher a taxa de câmbio real, mas pode usar variáveis que afetam o câmbio, como a compra e venda de dólares no mercado ou aumentos e reduções dos juros. O nível vigente das taxas de juros contribuiu fortemente para a queda do dólar a partir do começo do ano passado, ainda que o objetivo principal do Banco Central (BC) tenha sido controlar a inflação, e não promover uma valorização tão acentuada do câmbio. O dólar barato tem apelo para quem está no governo porque aumenta o poder de compra dos trabalhadores, ao elevar os salários em termos reais. Há também uma diminuição dos preços dos bens importados, ajudando no controle da inflação. " As pessoas ficam mais ricas " , resume Maria Cristina. Com isso, fica fácil entender por que, na maior parte dos casos, os governos tendem a privilegiar uma taxa de câmbio valorizada nos meses anteriores às eleições. Para Maria Cristina, o comportamento atual do câmbio se encaixa no que mostra seu estudo com Bonomo. Mesmo com os recentes esforços do BC para conter a apreciação do real, a taxa está na casa de R$ 2,20 a R$ 2,30, um nível tido como valorizado pelos analistas. Aliás, a forte atuação da autoridade monetária no mercado indicaria que a apreciação foi tão grande que levou a uma intervenção no câmbio a alguns meses da eleição, o que não é algo comum. Segundo Maria Cristina, o movimento sugere uma tentativa do BC de impedir uma sobrevalorização adicional que poderia colocar em risco o desempenho dos exportadores e reduzir empregos em atividades voltadas ao comércio exterior. Maria Cristina avalia que, passadas as eleições deste ano, a tendência é de que o câmbio esteja mais desvalorizado do que hoje, corroborando o que mostra seu estudo. Se o vencedor for Lula, o dólar deve subir de forma mais suave, como uma reação normal à esperada redução do diferencial entre os juros externos e internos, o que tende a atrair menos recursos para o país. Já se o candidato vitorioso for do PSDB, a avaliação é de que o câmbio tende a se desvalorizar com mais força, principalmente se for o prefeito José Serra. Ele tem se manifestado seguidamente contra o nível do dólar. Alguns analistas consideram possível que a moeda americana ganhe fôlego antes mesmo da eleição, caso a vitória de Serra seja vista como mais provável. Nessa hipótese, o mercado poderia antecipar ainda neste ano pelo menos parte da trajetória esperada para o câmbio em 2007. Para dizer se o câmbio estava ou não valorizado entre 1964 e 1997, Maria Cristina e Bonomo começaram por estabelecer uma taxa real de equilíbrio - aquela que não provoca problemas na economia no médio e longo prazo, como crises externas ou fortes pressões inflacionárias. O câmbio real é calculado a partir de uma ponderação das moedas dos principais parceiros comerciais do país, levando em conta ainda a inflação interna e externa. Os economistas também consideraram o impacto dos termos de troca (comparação entre preços de exportações e de importações), dos juros internacionais, dos gastos públicos e do grau de abertura da economia. No começo da ditadura militar e no período democrático (depois de 1985), o câmbio ficou mais valorizado nos oito a dez meses anteriores às eleições e mais desvalorizado nos 12 meses seguintes.