Título: Encerrar a alta do juro nos EUA será o primeiro desafio para Bernanke
Autor: Tatiana Bautzer
Fonte: Valor Econômico, 30/01/2006, Finanças, p. C10

Federal Reserve Novo presidente terá de afirmar sua autoridade e pode adiar metas de inflação

O novo presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), Ben Bernanke, terá sua "prova de fogo" logo depois que assumir o cargo na quarta-feira. Os próximos meses serão complicados em termos de decisões monetárias, afirmam executivos do mercado. "A partir de agora terá que ser tomada a decisão difícil - quando parar de aumentar juros", afirma o economista da Lehman Brothers, Ethan Harris. A trajetória de elevação dos juros começou em junho de 2004 e desde então o Fed aumentou as taxas 13 vezes. Com as taxas hoje em 4,25% ao ano, espera-se que os governadores do Fed elevem os juros em mais 0,25 ponto percentual amanhã, na última reunião presidida por Alan Greenspan. Mas, desta vez, a ata envolvendo a decisão não deve conter uma orientação clara sobre o que será feito nas próximas reuniões, para deixar o novo presidente à vontade na decisão que será tomada em março, no primeiro encontro dirigido por Bernanke. Logo que o nome de Bernanke foi anunciado, o mercado de títulos públicos ficou agitado, temendo que o novo presidente do Fed seja leniente com a inflação. Por isso, espera-se que, pelo menos no início, Bernanke mantenha o conservadorismo na política monetária para "estabelecer sua credibilidade". Os dados da economia americana divulgados na sexta-feira só complicam a tarefa de definir as taxas de juros nas próximas reuniões do Fed. O PIB cresceu apenas 1,1% no fim do ano passado, a menor taxa dos últimos três anos. A partir de agora, haverá uma sintonia fina entre a atividade econômica e as expectativas de inflação. A tensão internacional entre as potências ocidentais e o Irã só tem acrescentado pressão à alta do petróleo, o que piora o cenário futuro para a inflação. Passado o desafio inicial de definição da política monetária de curto prazo, Bernanke ainda terá que lidar com as conseqüências de longo prazo da bolha de preços imobiliários nos Estados Unidos. Críticos de Alan Greenspan, que criou uma aura nos 18 anos que passou no cargo, afirmam que o presidente do Fed apenas adiou o impacto do estouro da bolha de ações da internet. A supervalorização da bolsa foi substituída pela supervalorização de preços de imóveis, impulsionada por taxas de juros que chegaram a ficar negativas (abaixo da inflação) em alguns períodos. À medida que se atinja uma taxa de juros mais realista, a tendência é de que a bolha desinfle aos poucos (na melhor hipótese) ou estoure. "Por enquanto acho que ainda não há sinais de que o pior esteja ocorrendo", afirma o economista da Lehman Brothers. Os resultados ruins dos bancos no último trimestre do ano passado foram provocados mais pela mudança na lei de falências do que por um crescimento expressivo da inadimplência, afirma. Para Ethan Harris, o maior desafio para a estabilidade do sistema financeiro deve vir até o fim do ano, depois que aparecerem sinais de uma correção mais vigorosa em preços de imóveis. O mercado não vê nenhuma possibilidade, pelo menos a curto prazo, de que o Fed adote o conceito de metas rígidas de inflação, defendido por Bernanke. As metas reduziriam a flexibilidade da política monetária num momento complicado. "Adotar metas agora poderia forçá-los a elevar os juros em momentos não necessariamente corretos", diz Harris. O mercado acredita ser mais provável a adoção de uma declaração genérica, afirmando que o Fed considera como "estabilidade monetária a ser perseguida" um núcleo de inflação (excluindo preços de energia e alimentos) entre 1% e 2% ao ano. Essa recomendação genérica não alteraria o que o Fed já vem fazendo nos últimos anos.