Título: Cresce presença de investimento brasileiro no país vizinho
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 31/01/2006, Brasil, p. A4

Em um momento em que a chegada de investimentos é prioridade para o governo argentino, empresas brasileiras estão ganhando mais peso como fonte dos recursos que são aplicados no país.

Em 2004, o Brasil foi a quarta maior fonte de investimentos estrangeiros diretos que chegaram à Argentina, com aporte de US$ 653 milhões. Os dados do ano passado ainda não estão disponíveis, mas é provável que os recursos enviados pelo Brasil tenham sido muito maiores. Apenas as aquisições por companhias brasileiras de duas empresas locais, Loma Negra (US$ 1 bilhão) e Swift Armour (cerca de US$ 200 milhões) correspondem a quase o dobro desses recursos.

Embora a chegada de grandes investimentos brasileiros tenha gerado inicialmente uma reação negativa em setores do governo e do empresariado, que diziam temer a "estrangeirização" da estrutura produtiva local, a percepção de autoridades e homens de negócios brasileiros é que a instalação de uma empresa em solo argentino, gerando trabalho e receita localmente, ajuda a desarmar eventuais críticas de que o Brasil estaria invadindo o mercado do país vizinho. A questão continua no topo da agenda das relação entre os sócios do Mercosul, e os dois governos podem concluir hoje as negociações de um mecanismo de salvaguardas proposto pela Argentina para proteger setores considerados sensíveis. A crise econômica argentina teve como consequência a violação de contratos, gerando um clima de desconfiança que fez com que caísse a entrada de recursos externos no país. O fluxo de investimentos estrangeiros diretos chegou ao pico de US$ 23,98 bilhões em 1999, mas em 2002 esse volume foi reduzido em mais de dez vezes. Os fundos provenientes do Brasil, em contraste, cresceram a partir da crise de 2002 e se encontram hoje em um patamar muito superior à média da década passada. "O que está acontecendo é que hoje os investimentos brasileiros têm uma importância proporcional muito maior", disse o ex-secretário de Indústria Dante Sica, da consultoria Abeceb.com. "Como houve queda geral na chegada de investimentos estrangeiros à Argentina, o Brasil ganhou maior visibilidade." De acordo com números da consultoria elaborados a partir de dados do Ministério da Economia, em 2002 o Brasil foi a principal fonte de investimentos estrangeiros diretos no país. Nos anos posteriores, o fluxo foi mais moderado, mas o Brasil se consolidou como um dos países que mais investem na Argentina, e os números de 2004 mostram que ficou atrás apenas de Espanha, EUA e Holanda. Outros dados indicam que a tendência se manteve no ano passado. Segundo levantamento feito pelo Centro de Estudos da Produção, subordinado à Secretaria de Indústria, 11% do total de investimentos anunciados por empresas no primeiro semestre de 2005, ou divulgados anteriormente e com realização prevista para o ano passado, tiveram origem brasileira. Atrás do Brasil estavam México (6%) e Chile (3%), países que também ganharam mais peso depois da desvalorização de 2002. Mas os líderes, segundo o estudo, foram Espanha, com 37%, e EUA (15%). O peso dos dois países do hemisfério norte ainda é grande, porque eles foram os principais protagonistas do envio de recursos à Argentina durante a década de 90, particularmente na compra de empresas de serviços públicos privatizadas. Por isso, americanos e espanhóis continuam mandando somas consideráveis para manutenção dos seus negócios. A estatística da Secretaria de Indústria não mede o fluxo de investimentos estrangeiros diretos, excluindo os recursos para a aquisição de empresas locais. Nesse campo o Brasil foi o protagonista de duas das maiores transações concretizadas em 2005, com a compra da cimenteira Loma Negra, pela Camargo Correa, e da Swift Armour, pela Friboi. Algumas empresas estavam presentes antes da crise e conseguiram expandir os negócios em meio à turbulência econômica. "Em 2002, nosso faturamento cresceu 154% e a expansão nos últimos cinco anos foi de 509%", disse Alejandro Díaz, gerente-geral da Natura, empresa presente na Argentina há 11 anos e que opera exclusivamente com venda direta. Para crescer durante a crise, Díaz disse que a operação argentina contou com forte apoio da direção brasileira, que vê no país o instrumento mais importante para sua internacionalização. O gerente diz que um dos fatores que permitiram a expansão foi a decisão de dar crédito aos vendedores em um momento em que o sistema financeiro argentino estava em colapso. A companhia ainda opera no vermelho (no ano passado teve perdas de cerca de US$ 2 milhões), mas espera ter lucro em 2007. Segundo informações do Grupo Brasil, que reúne empresas brasileiras com negócios na Argentina, a entidade também tem recebido consultas de diversas empresas interessadas em expandir seus negócios ao país vizinho. Entre elas, fabricantes de autopeças, produtores de químicos destinados à fabricação de fertilizantes e frigoríficos. Entre os empresários brasileiros, a percepção é que atualmente o mercado local oferece mais oportunidades de crescimento, segundo disse ao Valor um executivo de uma grande companhia brasileira instalada na Argentina que quis manter o anonimato. Na avaliação dessa fonte, além de ter taxa de crescimento maior (em 2005 deve ser de 9%), os custos de produção na Argentina são hoje muito mais baixos do que no Brasil. Entre as vantagens competitivas do país vizinho estão o câmbio, mão-de-obra barata e qualificada e menores gastos com energia. As tarifas de gás para indústrias, por exemplo, são quatro vezes mais caras no Brasil que na Argentina.