Título: Uma reorganização bem-sucedida
Autor: Maria Christina Carvalho
Fonte: Valor Econômico, 01/02/2006, Finanças, p. C8

Durante anos o ABN AMRO permaneceu à sombra de concorrentes europeus como o UBS ou o Deutsche Bank. Mas a meta do maior banco holandês é ficar entre os cinco maiores bancos da Europa - hoje está em 11º em termos de patrimônio e reservas. Para dar partida nesse esforço, o conselho do ABN AMRO aprovou em 2004 um plano para reestruturar e alinhar as 60 operações do banco espalhadas pelo mundo sob um "guarda-chuva" tecnológico. Ao consolidar suas operações de apoio administrativo, o banco descobriu que poderá economizar US$ 300 milhões por ano, a partir de 2007. O objetivo também é liberar recursos para desenvolver produtos novos que ajudem a reforçar suas receitas, que somaram US$ 23 bilhões em 2004. "Nós queríamos uma qualidade de serviço melhor e mais agilidade para responder prontamente às mudanças no mercado", diz Lars Gustavsson, o diretor de tecnologia do grupo que está sediada em Londres. Para alcançar suas metas, o ABN AMRO decidiu olhar para fora do mercado doméstico. A terceirização não era nenhuma novidade para o ABN AMRO. O banco já havia assinado antes um contrato de US$ 1,2 bilhão por cinco anos com a EDS para a manutenção de infraestrutura e de softwares, além do desenvolvimento de softwares. Com essa experiência, diz Gustavsson, o ABN aprendeu que a terceirização não é eficiente quando feita aos pedaços, e sim que ela deve ser parte de uma estratégia maior. O banco também percebeu que uma terceirização eficiente não diz respeito apenas à economia de custos, mas também à melhoria dos produtos e serviços. Essas lições agora estão sendo aplicadas na maior reestruturação corporativa e administrativa já feita pelo ABN. Eis como foi feito. Primeiro, o banco anunciou que estava no mercado para uma reorganização da área de apoio administrativo e o desenvolvimento de um sistema "sem costuras", em que as operações de banco de varejo, private bank e banco de investimento seriam integradas na mesma plataforma tecnológica. Para isso, precisava terceirizar o monitoramento dos centros de dados espalhados pelo mundo, além da manutenção, operações de apoio e o desenvolvimento de aplicativos de Tecnologia da Informação. A possibilidade de um projeto grande e com duração de muitos anos era fascinante. O ABN AMRO teve uma resposta mais positiva que a esperada de uma dezena de grandes prestadores de serviços. Mas o banco não tomou uma decisão apressada. Ao invés disso, a administração levou um ano para avaliar as respostas e permitir que sua estratégia evoluísse. Finalmente, em setembro de 2005, o banco anunciou que seu contrato de cinco anos e US$ 2,1 bilhões seria dividido entre três grandes empresas. A IBM Global Services ficaria encarregada do centro de dados e do desenvolvimento de alguns sosftwares, enquanto a Tata Consultancy Services da Índia e a Infosys Technologies se encarregariam do resto. Em novembro de 2005, o ABN AMRO começou a implementar sua reestruturação tecnológica - e o banco já diz estar satisfeito com os primeiros resultados. Graças ao projeto de terceirização, o ABN melhorou bastante sua tecnologia e agora pode responder melhor às demandas do mercado, afirma Gustavsson. O banco está acelerando os planos de lançamento de um novo cartão de crédito e de mais serviços de private banking nos Estados Unidos e Brasil - um passo para o lançamento de outros produtos. E a ação do ABN acumula uma valorização de 18% nos últimos doze meses. Analistas e especialistas em terceirização dizem que o ABN AMRO fez algumas movimentações inteligentes no desenvolvimento de sua estratégia. Primeiro, a administração avaliou cuidadosamente os benefícios da reestruturação e percebeu que ela significaria impor uma mudança em toda a organização. Então foi elaborado um plano que demorou um ano para ser avaliado, antes que se decidisse pela sua implementação. A decisão de terceirizar foi estratégica e não apenas um jogo de corte de custos. Em segundo lugar, o banco dividiu seu contrato entre mais de uma empresa. As companhias indianas que disputaram o contrato com o ABN AMRO não eram mais baratas que as concorrentes ocidentais, mas sua presença ajudou o banco a negociar melhor com as companhias de terceirização ocidentais, como a IBM. A combinação de companhias "offshore" indianas com empresas ocidentais foi boa. Os parceiros ocidentais tinham o conhecimento dos negócios do banco, enquanto as companhias indianas eram especializadas no desenvolvimento de tecnologia. Em terceiro lugar, o ABN AMRO foi transparente com os funcionários em relação aos planos. O banco criou um departamento de comunicações em tempo integral para explicar a medida da terceirização, promoveu reuniões com os funcionários e a administração trabalhou com os sindicatos trabalhistas. "Não perguntamos a eles: 'Devemos terceirizar'?, porque a situação estava clara. Ao invés disso, pedimos a eles que nos ajudassem a executar o plano de uma maneira digna", diz Gustavsson. "Foi uma comunicação transparente, honesta e aberta." O ABN AMRO também criou uma enorme exposição, chamada "soluções de passagem" que ilustra as metas do banco e os planos futuros. A instalação - um labirinto espalhado por oito salas - oferece entrevistas multimídia com membros do conselho que são traduzidas para vários idiomas. É claro que o banco não conseguiu evitar um certo descontentamento, especialmente por causa das demissões. No total, cerca de 1.500 empregos na área de tecnologia foram eliminados. Mas outros foram poupados - cerca de 200 funcionários foram transferidos para as operações de TCS em Luxemburgo, Suíça e Brasil, enquanto 1.800 engenheiros foram para a IBM. O ABN AMRO convenceu esses funcionários que, enquanto engenheiros, eles teriam um futuro melhor em uma companhia de engenharia do que num banco. Para os que perderam o emprego, o ABN enviou muitos para programas de retreinamento ou pagou multas generosas de rescisão de contrato. Embora a reestruturação tenha apenas alguns meses, Gustavsson diz que o ABN AMRO já começa a se beneficiar com as economias de custos. O próximo passo será aproveitar a nova plataforma tecnológica do banco e desenvolver novos e sofisticados produtos. "A terceirização não é apenas estratégica e tática. Assim que você toma uma iniciativa, a mão invisível começa a trabalhar", explica Gustavsson. O ABN AMRO espera colher benefícios reais com a terceirização por muitos anos.