Título: Um crédito para a diversificação
Autor: Adriana Cotias e Danilo Fariello
Fonte: Valor Econômico, 01/02/2006, EU &, p. D1
Fundos ampliam parcela de títulos emitidos por empresas nas carteiras a fim de garantir retorno extra aos investidores
Numa visita à agência do Banco Real em que é correntista, uma investidora paulista recebeu do gerente a sugestão de aplicar parte dos recursos - concentrados num fundo DI - em uma carteira de renda fixa, que tem proporcionado retorno entre 100% e 105% do CDI. Para justificar o rendimento, o profissional explicou que 30% do patrimônio estava em papéis de empresas de baixo risco, como debêntures da Nova Marlim, ligada à Petrobras. O episódio ilustra como já chega ao varejo a mobilização de gestores para driblar a queda do juro real, trocando uma parcela de títulos públicos por crédito privado. Esse tipo de estratégia já está presente na maioria dos fundos de renda fixa. Mas há uma segmentação em particular, a de renda fixa crédito, que vem se destacando. No ano passado, esses portfólios, recheados de papéis corporativos pós-fixados, renderam 19,70% na média, ante 18,99% do CDI e só perderam em retorno para as carteiras de ações, turbinadas pela alta de quase 28% do Ibovespa. A expansão dos lançamentos de renda fixa - só no ano passado foram R$ 55 bilhões em debêntures, notas, cotas de fundos de recebíveis e certificados de recebíveis imobiliários -, impulsionada pela queda do risco-Brasil, tem permitido aos gestores diluir riscos entre vários ativos. Segundo Júlio Ziegelmann, do BankBoston, antes, apenas os grandes grupos, que oferecem retorno pouco acima do CDI, emitiam dívida. "Agora, os fundos podem ser mais agressivos e render mais, mas com risco ainda reduzido, pois cada empresa representa pouco no total da carteira." Mas como não há almoço grátis, o investidor não pode se esquecer que quanto maior o retorno, maior o risco. Conforme aumentam as chances de inadimplência dos títulos que compõem as carteiras, maior a possibilidade de perda, diz Renato Ramos, da área de Renda Fixa do HSBC. Vale lembrar que os fundos mais problemáticos do Banco Santos eram carteiras de crédito recheadas de cédulas de crédito bancário (CCBs) de empresas clientes da instituição. Mas há fundos que aplicam apenas em créditos considerados de primeiríssima linha. O BNP Paribas, por exemplo, prefere abrir mão de parte da rentabilidade que poderia trazer para o seu BNP Paribas Credit, uma carteira formada essencialmente por títulos corporativos "investment grade" (a nota máxima dada pelas agências de classificação) à adotar uma posição mais agressiva, diz o diretor Gilberto Kfouri Júnior. O apelo dos fundos de crédito cresce à medida que os juros caem, mas o importante é o aplicador avaliar o perfil das carteiras e a política de investimentos, alerta Alexandre Vitorino, gerente da Votorantim Asset Management (VAM). Pelo site da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) é possível consultar o portfólio de cada fundo, embora com atraso de 90 dias. Para Kfouri Júnior, do BNP, os fundos de crédito só fazem sentido para o investidor que busca diversificação para a parcela aplicada em renda fixa, já que as carteiras que mesclam risco de crédito e de mercado, com vários indexadores, têm condições de proporcionar um retorno melhor. O Fibra Fixa de longo prazo do Fibra, embora seja classificado como renda fixa crédito, mantém 70% do portfólio em títulos públicos. Na parcela de papéis corporativos, não passa de 5% por emissor. A carteira aceita aplicações a partir de R$ 5 mil, mas não é endereçada ao varejo, diz o diretor da Fibra Asset Management, Fabio Watanabe. "Cativar um cliente com o mero argumento de que é um fundo que rende mais é uma temeridade, porque o investidor pode perder dinheiro numa carteira dessas." A BB DTVM, que tem cerca de R$ 120 bilhões em fundos de renda fixa, não chegou a criar uma carteira exclusiva de crédito no varejo, mas segundo o presidente Nelson Rocha Augusto aumentou significativamente a parcela aplicada em títulos corporativos. Até 2003, menos de R$ 1 bilhão estavam em papéis como debêntures, notas promissórias ou CDBs. Hoje, a fatia chega a R$ 14 bilhões. "Como melhorou a percepção de risco do Brasil e das empresas, a gestora teve de buscar ativos diferenciados ou ficaria para trás." No HSBC, o fundo de crédito é destinado a clientes qualificados, com mais de R$ 300 mil para investir. "Recomendo cautela na oferta desse portfólio no varejo, pois é difícil compreender o risco de crédito embutido", diz Ramos. Em 2002, por exemplo, alguns fundos DI chegaram a perder até 5% num único dia porque tinham debêntures da Cemar, rebaixada por uma agência por inadimplência. Mesmo que não passem pela adversidade do calote, em períodos de turbulência os fundos de crédito podem apresentar forte volatilidade, acrescenta Vitorino, da VAM. "O mercado secundário de papéis privados é reduzido, o que acentua a oscilação das cotas."