Título: China aceita cotas para vender têxteis ao Brasil
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 10/02/2006, Especial, p. A14

Relações externas Acordo foi fechado ontem e vale por três anos

Os governos de Brasil e China fecharam ontem um acordo para limitar a entrada de produtos têxteis chineses no mercado brasileiro por três anos. O acordo engloba 70 produtos, agrupados em oito categorias, o equivalente a 60% do total importado em produtos têxteis provenientes da China. As categorias incluídas no acordo são tecidos de seda, filamento de poliéster, tecidos sintéticos, veludo, camisas de malha, suéteres, jaquetas e bordados. Após quatro dias de reunião em Pequim, técnicos dos dois países concluíram a negociação. O acordo coloca limites para o crescimento das importações vindas da China e estabelece cotas para o aumento da entrada de cada produto. O tamanho da cota cresce a cada ano e o prazo de vigência do acordo vai até 2008. Exemplo: as importações de tecidos de seda vindos da China só poderão aumentar 8% em 2006 ante o que foi adquirido entre julho de 2004 e junho de 2005. Esse foi o período escolhido pelos os negociadores como base para o cálculo. Na prática, isso significa o estabelecimento de cota de 60 toneladas para o aumento da entrada de tecidos de seda chineses. Em 2007, essas importações poderão crescer 9% ante o período de base do cálculo, o que representa cota de 65,4 toneladas. Em 2008, o limite se torna um pouco mais flexível: 10%, ou 72 toneladas. Segundo Ivan Ramalho, secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic) , que chefiou a delegação brasileira, o acordo seria rubricado por ele e pelo vice-ministro de Comércio da China, Gao Hucheng, por volta das 23 horas de quinta-feira no horário de Brasília, ou 10 horas de sexta-feira em Pequim. No entanto, o acordo só entrará em vigor após 30 dias da assinatura pelo ministro do Desenvolvimento do Brasil, Luiz Fernando Furlan, e pelo ministro do Comércio da China, Bo Xilai. A data ainda não foi marcada, mas, segundo informações do Mdic, pode ocorrer em breve. "É um acordo que tem uma grande abrangência", afirmou Ramalho, ao Valor, por telefone, de Pequim. Além do Brasil, a China só aceitou restringir suas exportações têxteis voluntariamente para Estados Unidos e União Européia, seus dois grandes parceiros comerciais. No caso dos EUA, o acordo incluía 45,8% das importações de produtos têxteis. No caso da UE, esse percentual era menor: 30%. Já o acordo com o Brasil abrange 60%. O diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Fernando Pimentel, classificou o acordo com um "marco", mas cobrou do governo rapidez na sua implementação. "Mais importante que concluir as negociações é operacionalizar o acordo", disse Pimentel. Ele teme uma "enxurrada" de importações entre o anúncio do acerto e sua entrada em vigor, como aconteceu na União Européia. "Não entendemos o acordo como uma panacéia para todos os males", completou. Pimentel diz que o setor é prejudicado pelo câmbio valorizado, pelos juros altos e pelo contrabando. Três representantes da Abit acompanharam a equipe do governo na viagem a Pequim. As negociações para um acordo voluntário de limitação das importações chinesas começaram em setembro do ano passado. Furlan viajou com uma equipe técnica para Pequim; os chineses vieram a Brasília. Boa parte do acordo foi alinhavado em uma reunião entre Furlan e Bo Xilai em dezembro, em Hong Kong, às margens do encontro da Organização Mundial de Comércio. A exemplo do que ocorreu em outros países depois do fim do Acordo de Têxteis e Vestuários, que regulava o comércio mundial do setor, as importações brasileiras tiveram um aumento expressivo. As compras do Brasil de produtos têxteis e vestuário chineses atingiram US$ 395 milhões em 2005, alta de 43,1% ante 2004, segundo a Abit. Em volume, as importações cresceram 35,2%, para 110,2 mil toneladas. No setor de vestuário, a participação da China nas importações brasileiras saltou de 30% em 2000 para 61% no ano passado. Em tecidos e fios, o aumento foi de apenas 1% para 17% no mesmo período. Os produtos incluídos no acordo foram os mais prejudicados. O volume de jaquetas chinesas importadas pelo Brasil aumentou 162% em 2005 ante 2004. As compras de filamento de poliéster cresceram 49,6% em volume no último ano. No segmento de tecidos, as importações de origem chinesa aumentaram 23,7% em 2005. Os sintéticos respondem por 82,5% dos tecidos importados da China. Apesar do aumento expressivo das importações brasileiras, o país é praticamente irrelevante para os fabricantes de tecidos e roupas chineses. O Brasil representa 0,3% do total exportado pela China nesse setor. O Japão é o maior mercado de Pequim, com uma fatia de 17%, seguido pelos EUA, que respondem por 16%. Com o aumento das importações, o setor têxtil passou a pressionar o Brasil pela adoção de salvaguardas contra a China. O governo brasileiro regulamentou o instrumento, mas preferia um acordo negociado. Pimentel ressalta, no entanto, que o setor não abriu mão do direito de usar salvaguardas nos produtos que não foram contemplados no acordo. Os chineses chegaram a pedir ao Brasil que abdicasse do direito de utilizar as salvaguardas em outros setores para fechar o acordo na área têxtil, mas o governo não aceitou. Segundo Roberto Gianetti da Fonseca, diretor de comércio exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a entidade era contra esse tipo de concessão. Ele também classificou o acordo no setor têxtil como positivo.