Título: Lula encontra PT dividido sobre alianças
Autor: Paulo de Tarso Lyra e Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 14/02/2006, Política, p. A10

Eleições Berzoini e governadores trabalham para derrubar qualquer restrição a coligações para a sucessão

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi recebido aos gritos de "Olê, olê, olê olá, Lula, Lula" e "Um, dois, três, Lula outra vez", tão logo subiu ao palco no jantar "PT 26 anos, a volta por cima", realizado ontem em Brasília. Lula chegou às 21h10 ao evento, onde foi recebido pelo vice-presidente, José Alencar. Sorridente, acenou para os jornalistas, mas não respondeu a qualquer pergunta. Quando entrou no salão foi aplaudido de pé pelos presentes. A festa foi aberta por um show do grupo brasiliense "Casa de Farinha", composto por quatro mulheres. No palco, uma faixa com os dizeres "PT, 26 anos com o povo brasileiro". Em clima de campanha, Lula levantou um bebê, que estava sem camisa, mas vestido com uma calça vermelha, da cor da bandeira do PT. Presentes ao jantar, os ministros Paulo Bernardo (Planejamento), Jaques Wagner (Coordenação Política), Dilma Rousseff (Casa Civil), Luiz Dulci (Secretaria Geral da Presidência), Miguel Rossetto (Desenvolvimento Agrário), Luiz Marinho (Trabalho), Antonio Palocci (Fazenda), Marina Silva (Meio Ambiente), Nélson Machado (Previdência), além do ex-ministro da Saúde Humberto Costa. Também estiveram no jantar o governador do Acre, Jorge Viana e os prefeitos do Recife, João Paulo, e de Vitória, João Coser. Em seu discurso, o presidente do PT, Ricardo Berzoini, disse que "o PT sofreu no último ano, o maior cerco político de sua história, resumido na frase do senador que falou que o objetivo era extirpar o nosso projeto e se ver livre de nós pelos próximos 30 anos. Uma frase racista, mas hoje, podemos dizer que nosso amor pelo PT está mais forte. Isso foi demonstrado não pela cúpula, mas pela nossa militância, 314 mil pessoas que votaram no PED. Viva o PT, via o presidente Lula, 14 quilos mais jovem". À tarde, Berzoini reuniu-se com aproximadamente 40 petistas, entre eles o governador do Acre e o prefeito do Recife. Discutiram alianças, estratégias e o que o partido tem que fazer para garantir a vitória em outubro. "Temos que trabalhar com a realidade. Estar no governo é uma coisa, estar fora dele é outra", resumiu Viana. O PT quer contar com a experiência dos governadores e prefeitos da legenda para ajudar na campanha de reeleição de Lula. Vários dirigentes já trabalham, também, para evitar que o partido divulgue, em março, uma resolução interna que possa inviabilizar uma ampla política de alianças no projeto de reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Uma ala do partido defende que a resolução seja bastante genérica e aponte para a necessidade de alianças não apenas para garantir a reeleição mas, sobretudo, a governabilidade num eventual segundo mandato de Lula. A candidatura do presidente à eleição, que só será oficializada em junho, foi discutida no jantar dos 26 anos do PT. O debate sobre as alianças passa a ser preponderante, especialmente após a recuperação de Lula nas pesquisas de intenção de votos. "É uma leitura apressada e completo equívoco do partido associar a crise de 2005 com as alianças que fizemos. A crise política não foi do PT. Foi a crise do sistema político, do sistema de financiamento partidário desse país", analisou o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel. Para o prefeito, o PT precisa discutir esse tema com bastante cautela, maturidade e serenidade. "Precisamos de todos os partidos da base, e não apenas para ganhar a eleição. É para governar. É impensável a idéia de um governo puro-sangue", sentenciou. "Os partidos precisam se comprometer com um programa mínimo. Não podemos exigir que eles se comprometam com o programa do PT. Quem se compromete com o programa do PT somos nós, os filiados", pregou. O líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante, defende a mesma tese que Pimentel. "Não se governa um país como o Brasil sem alianças. O fundamental é construir um governo de coalizão dividindo responsabilidades. Não acredito que seremos maioria sozinhos, num leque estreito de apoios", alertou. O senador continua defendendo uma união estratégia com o PMDB. Não descarta, ainda, a renovação do apoio do PTB, PL e PP, apesar de destacar que ainda é muito cedo para traçar o cenário concreto de aliados. Berzoini quer contar com o apoio de todos, mas ouviu críticas duras dos presentes à reunião de ontem, preliminar ao jantar. O próprio governador Jorge Viana afirmou que o partido precisa tomar cuidado para que a eleição de São Paulo não estrague a campanha nacional. "Para os companheiros de São Paulo, parece que ganhar o Brasil não é importante, é mais importante ganhar São Paulo. Se o presidente Lula não ganhar, não escapa ninguém", cravou o governador, durante o encontro. Na saída, Viana acrescentou que todos saíram bastante feridos da crise política, mas que o PT precisa mostrar que é capaz de sair dessa. "Eu não tenho dúvida nenhuma de que um segundo mandato de Lula será muito mais próximo do nosso sonho petista. O primeiro foi para arrumar a casa. Além disso, fomos atropelados por essa crise política". O presidente do PT negou que, durante a conversa, tenham sido colocados vetos a qualquer tipo de aliança, mesmo com os partidos de direita - PP, PTB e PL. "Nós temos que descer do sapato alto. De que adianta fazermos campanhas puras e, quando chegamos ao governo, descobrirmos que precisamos de outros partidos para governar?", criticou Viana. A portas fechadas, ele chegou a afirmar que, se a política de alianças não for conduzida de forma correta, o partido ficará "de joelhos" quando chegar novamente ao poder. O prefeito de Recife, João Paulo, demonstrou ser avesso ao discurso governamental de comparar a gestão Lula com a anterior, do tucano Fernando Henrique Cardoso. "Não adianta ficar falando só de números. O PT já teve vários administradores excelentes que perderam a eleição". Para João Paulo, é preciso recuperar a mística petista.