Título: Possível isenção a estrangeiro já alonga prazos
Autor: Arnaldo Galvão
Fonte: Valor Econômico, 16/02/2006, Finanças, p. C1

O Tesouro Nacional já começou a colher os primeiros efeitos da possível isenção de Imposto de Renda para os investidores estrangeiros em títulos da dívida pública. O movimento em direção a títulos de mais longo prazo nos últimos dias foi atípico, na avaliação dos técnicos do governo, já antecipando parte dos efeitos da medida que deve ser tomada nos próximos dias. Na terça e quarta-feira, o Tesouro vendeu em todo o leilão R$ 3,9 bilhões em dinheiro (reserva contra o papel). Não houve colocação de títulos de curto prazo, com vencimento entre 2007 e 2010. Já com vencimento em 2015 foram R$ 782 milhões, R$ 1,245 bilhão para 2024 e R$ 1,9 bilhão para 2045. No leilão de troca de papéis, o mesmo aconteceu. Foram trocados R$ 6,34 bilhões, sendo que, desses, R$ 5,8356 bilhões corresponderam a títulos com vencimento entre 2015 e 2045. "Isso demonstra a capacidade e o perfil do investidor estrangeiro", alegrava-se ontem um funcionário especialista nessa área. O preço também teve queda. Títulos com vencimento em 2045, que no penúltimo leilão recebiam juros de 8,95%, no último eram remunerados a 8,35%. O que interessa ao governo com a isenção é colocar no mercado NTN-F, papéis prefixados, e NTN-B, indexados ao IPCA, reduzindo assim a participação dos títulos em Selic hoje predominantes na composição da dívida pública mobiliária federal. Razão pela qual a medida provisória que já está praticamente pronta deverá trazer restrições a operações de caracterizem aplicações de cunho especulativo, seja através das operações compromissadas, seja as vindas de paraísos fiscais. Como freios naturais, há também os custos tributários que já são impostos a quem compra hoje para vender o papel amanhã. Seja a cobrança da CPMF na entrada e na saída, a cobrança do IOF progressivo nas operações com prazo inferior a 30 dias, ou, ainda, o "spread" de venda de dólares e compra de reais e vice-versa, que representariam o que o secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, chama de "ferrolhos" embutidos na MP. Um dos argumentos usados pelos técnicos oficiais para defender a isenção dos estrangeiros em títulos da dívida pública é que hoje os investidores não residentes já aplicam em derivativos em reais cerca de US$ 70 bilhões. São contratos 'off-shore', oferecidos pelos bancos, em títulos brasileiros. Como os bancos não pagam o IR de 15% sobre essa carteira, eles repartem a vantagem tributária com os seus clientes. Ou seja, nas operações pouco transparentes, o benefício fiscal já existe. Essas aplicações, porém, não trazem qualquer benefício seja para a composição seja em prazos da dívida pública. "A proposta (da isenção) permite que o governo federal se aproprie do ganho de receita hoje obtido pelos bancos, através da redução que se conseguirá na taxa de juros da dívida doméstica de médio prazo", advogam os técnicos da Fazenda, no documento elaborado com as propostas da MP. Assim, de forma transparente, a carteira dos não-residentes em títulos federais representa só R$ 5 bilhões, cerca de 0,5% da dívida mobiliária. Do valor total da carteira dos não residentes, de US$ 53,43 bilhões, 88% estão aplicados em ações (onde já contam, com isenção de IR), 9,16% em renda fixa e o restante em derivativos, debêntures e outros. Para cada tipo de aplicação, a tributação é diferente. Em bolsa, os nacionais pagam 15% de IR e os estrangeiros são isentos; em fundos de ações, os nacionais pagam 15% de IR e os estrangeiros, 10%, o mesmo valendo para operações realizadas fora da bolsa e de liquidação futura. As operações de 'swap' tanto na bolsa quanto fora são taxadas com alíquota progressiva de 15% a 22,5% para os domésticos e em 10% para os estrangeiros. Elas se repetem para os nacionais que aplicam em renda fixa; para os estrangeiros, é de 15%.