Título: As pesquisas e a força real da candidatura de Lula
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 17/02/2006, Opinião, p. A14

O resultado da pesquisa CNT-Sensus, que recolocou Lula na dianteira para a eleição presidencial, teve o impacto de um dos rounds finais, mas na verdade foi apenas o primeiro deles. Ela apenas traça um retrato realista das forças em disputa. Um dos fatos que corrobora não era trivial, porém facilmente comprovável - Lula mostrou-se um candidato vulnerável em alguns momentos, porém em nenhum deles, mesmo no auge do mensalão, deixou de ter forte apoio político. A aprovação pessoal do presidente raramente caiu abaixo dos 50%, apesar de a avaliação de seu governo ser inferior e mais errática. É com um mandatário revigorado e muito disposto a se reeleger que as oposições terão de concorrer. O calvário do presidente já parecia ter se encerrado em setembro de 2005, pouco mais de três meses após o início do escândalo do mensalão. Sob intenso assédio, com três CPIs em andamento, a imagem de Lula não se colou à da corrupção de membros de seu partido ou às acusações que derrubaram seus mais íntimos auxiliares, como José Dirceu e Luiz Gushiken. Nenhuma investigação passou perto do presidente ou o teve como alvo, o que não deixa de ser curioso por até haver indícios que pudessem justificá-las. Independentemente das suspeitas, muitas comprovadas, outras imaginárias, a oposição capitaneada pelo PSDB seguiu uma estratégia que não deu resultados. A pretensão de não tentar derrubar Lula, mas deixá-lo sob pressão permanente do escândalo para que ele chegasse exangue às urnas em 2006, tinha duas contradições, pelo menos. Inocentava a priori Lula - enquanto que de público a oposição procurava o erro oposto, o de condená-lo a priori - e supunha um desgaste automático e progressivo, que, se ocorreu, teve breve duração. Havia algo além de uma superestimação das forças de Lula em ação. As acusações de caixa 2 voltaram-se contra a própria oposição, que mostrou-se temerosa de se ver no mesmo lodaçal em que procurava jogar o adversário. Talvez por isso, a atitude das oposições nas CPIs tenha seguido o pêndulo das acusações em tons quase histéricos e a busca de um compromisso nos bastidores. Obviamente, os governistas fizeram de tudo para impedir o avanço das investigações. Tudo somado, Lula, apesar do desgaste, sai quase ileso da CPI dos Correios, a menos que novos e graves fatos venham à tona, o que é impossível prever. Seu prestígio voltou ao nível pré-crise. Embora o que já foi provado sobre corrupção no atual governo seja uma arma eleitoral, dificilmente terá o poder de decidir o jogo. Logo, governistas e tucanos devem se distinguir por propostas e programas. Nesse ponto, os limites entre ambos são nebulosos, o que favorece Lula. A situação beneficia o incumbente e até o início para valer da campanha eleitoral Lula poderá avançar mais - é o único que está em campanha nacional. As decisões de estender o Bolsa-Família, dar um bom aumento para o salário mínimo, reajustar o funcionalismo e a tabela do Imposto de Renda tem inequívoco sabor eleitoral. No front da economia, onde deve se dar a batalha eleitoral, Lula tem muitos trunfos a apresentar, ainda que a autoria deles não seja inteiramente sua. A economia voltará a crescer no ano das eleições, nunca o país foi tão pouco vulnerável a crises externas, o emprego cresceu e a renda dos assalariados também. Raras vezes empresas e bancos lucraram tanto e a confiança dos investidores externos é crescente. Não há dúvida de que o país ao final de quatro anos de governo está em melhor situação do que o que Lula recebeu em 2002. Em grande medida, isso foi decorrência da manutenção da política do governo de Fernando Henrique, o que causa embaraço à estratégia dos tucanos - em grandes linhas, sua política é a mesma do governo. A oposição pode se apoiar nas críticas à ausência de planejamento para o futuro, na falta de capacidade gerencial e da baixa criatividade da gestão Lula. Entretanto, visto de agora, o que os tucanos apresentam são nuances diferentes, o que costuma passar desapercebido pelos eleitores. Os reparos ao baixo crescimento, aos juros altos e câmbio valorizado são música também para boa parte do atual governo. Desancar a forte elevação dos gastos na gestão de Lula pode ser meritório, mas corte de despesas jamais empolga multidões. A oposição tem agora um grande problema nas mãos.