Título: Medida deve dobrar as compras em um ano
Autor: Cristiane Perini Lucchesi e Tatiana Bautzer
Fonte: Valor Econômico, 17/02/2006, Finanças, p. C1

A participação de investidores não-residentes no Brasil na dívida pública interna deve dobrar em um ano, passando para US$ 10 bilhões. A projeção foi feita pelo secretário do Tesouro, Joaquim Levy, ao anunciar, ontem, as medidas de desoneração tributária previstas na Medida Provisória (MP) 281, que já entrou em vigor ontem mesmo. A principal delas reduziu de 15% a zero a alíquota do Imposto de Renda (IR) sobre ganhos de capital para estrangeiros que investirem em títulos federais brasileiros. O estoque da dívida pública mobiliária federal interna, em janeiro, alcançou R$ 984,93 bilhões. Esse benefício tributário, como o Valor adiantou na quinta-feira, é vedado aos paraísos fiscais. A Instrução Normativa 188 da Receita Federal, publicada em agosto de 2002, enquadrou 53 localidades nessa condição. As operações com compromisso de revenda também ficam excluídas das vantagens da MP 281, para evitar aplicações de caráter especulativo. Levy explicou que a MP 281 representa a oportunidade de aproveitar ao máximo os resultados da disciplina fiscal que reduziu sensivelmente a percepção de risco do Brasil e está atraindo investidores de médio e longo prazos. "Queremos alongar a dívida e reduzir a participação de papéis com taxas flutuantes. A curva de juros sinaliza para o investidor uma pista de pouso iluminada, onde também podem aterrissar aviões particulares, as debêntures", comparou. A posição defendida pela Receita Federal acabou prevalecendo na última hora. O pacote de incentivos tributários, na sua versão original, previa a possibilidade de uma "conta investimento" que permitiria a migração do investimento de não-residentes do mercado de capitais para os títulos da dívida, sem pagar a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Na noite da quarta-feira, esse ponto foi retirado do texto da MP 281. Segundo Levy, a proposta da "conta investimento" que foi levada ao governo tem mérito, mas foi desconsiderada. "Dentro da nossa capacidade fiscal e da organização dos tributos, fizemos o máximo", justificou o secretário do Tesouro. A MP 281 também estabeleceu uma norma de transição para os atuais investidores não-residentes. Eles terão até 31 de agosto para antecipar o pagamento do IR: 15% sobre os ganhos de capital. Quem não fizer essa antecipação, perde o benefício da alíquota zero de IR para esse estoque de títulos. Papéis novos já estão desonerados. Os fundos de investimento em capital de risco (venture capital) também foram beneficiados com a redução de 15% a zero para a alíquota do IR sobre os rendimentos dos não-residentes no país. Mas esses fundos deverão ter em sua carteira um mínimo de 67% de ações de sociedades anônimas, debêntures conversíveis em ações e bônus de subscrição. O coordenador de Política Financeira, Mercado de Capitais e Previdência da Secretaria de Política Econômica, Sílvio Holanda, disse que essa medida equiparou o investimento estrangeiro em bolsa ao venture capital. "Queremos incentivar esse setor, zerando o IR para os não-residentes", justificou. A desoneração tributária da MP 281 também retirou, para residentes e não-residentes, a cobrança da CPMF das emissões primárias de ações fora das bolsas. Nas bolsas de valores, essa operação já não pagava esse tributo. Levy informou que, no ano passado, foram emitidos R$ 11 bilhões em ações, sendo que boa parte disso foi realizada fora da bolsa. O impacto dessa desoneração sobre a taxa de câmbio não preocupa Levy. Ele alertou que "não tem coisas inteligentes a falar sobre isso", mas apelou para que não sejam superestimados os efeitos cambiais da MP 281. "É um simples ajuste tributário. Não estamos inovando. Desonerar o investimento estrangeiro é uma prática disseminada, comum e natural", disse. Levy também comentou que a atual taxa de câmbio reflete mais as contas externas que a conta de capital. Ele afirmou que o forte desempenho das exportações - dobraram de US$ 60 bilhões (2002) para US$ 120 bilhões (2006) - tem papel importante nessa formação do peso da moeda brasileira. "Há quatro ou três anos, com aquela curva de juros que tínhamos, essas medidas não surtiriam efeito", afirmou o secretário. Segundo o que informa a exposição de motivos da MP 281, o impacto fiscal estimado é de R$ 152,3 milhões em 2006. Para os dois anos seguintes seria de R$ 165,2 milhões (2007) e R$ 179,2 milhões (2008). Eventuais perdas de receitas, porém, serão compensadas pelos benefícios gerados. No caso da redução da alíquota incidente sobre os rendimentos de não-residentes em títulos públicos federais, a expectativa é de uma diminuição de R$ 1,2 bilhão do custo do financiamento da dívida pública em 2006. Nos próximos cinco anos, essa redução do custo da dívida poderá chegar aos R$ 7,6 bilhões.