Título: Isenção de IR atrai fundo de hedge
Autor: Cristiane Perini Lucchesi e Tatiana Bautzer
Fonte: Valor Econômico, 17/02/2006, Finanças, p. C1

Estrangeiros Investidores reclamam de aparato regulatório e da exigência de conta em reais

A medida provisória que isenção de Imposto de Renda (IR) e CPMF investidores estrangeiros que vierem ao Brasil comprar títulos públicos, baixada ontem pelo governo federal, vai ajudar a atrair para o mercado interno principalmente os fundos de hedge (mais dispostos a tomar risco) e fundos mútuos, dizem executivos do mercado financeiro nos Estados Unidos, Europa e Brasil. Mas esses fundos, apesar de mais alavancados, tendem mesmo assim a reduzir custos e ampliar prazos da dívida prefixada brasileira em reais. As grandes seguradoras e fundos de pensão têm restrições na compra de títulos de emissores considerados de maior risco de crédito, como o Brasil, e têm mais apetite para os papéis com o status de grau de investimento, selo de investimento não especulativo. Se quiserem investir nos polpudos juros prefixados em reais, vão continuar a comprar papéis e derivativos que os bancos estrangeiros que são grau de investimento montam para eles no mercado externo. Apesar da isenção de impostos, "os incômodos requerimentos regulatórios" permanecem , no entanto, e vão continuar a impedir o acesso mais amplo dos estrangeiros ao mercado interno de títulos no país, segundo Michael Hood, da equipe de análise do Barclays Capital, em Nova York. Uma principal reclamação é a necessidade de o estrangeiro abrir uma conta em reais para operar com os títulos públicos no mercado interno. Os investidores prefeririam, inclusive por facilidade operacional, comprar e vender direto lá de fora por terminal, usando uma clearing no exterior, responsável, por exemplo, pela liquidação dos títulos e pelo fechamento de câmbio. É assim que funciona em outros países, segundo Hood. Todos concordam que o mercado interno de títulos públicos vai se ampliar. "Só os fundos de hedge têm patrimônio de mais de US$ 1 trilhão no mundo todo", diz José Olympio Pereira, diretor-responsável pelo banco de investimento do Credit Suisse no Brasil. Ele considera a medida positiva, mas ficou decepcionado pelo fato de o governo não ter ampliado a isenção também para a compra de papéis de dívida privada, como debêntures. O diretor da Goldman Sachs, Paulo Leme, diz ter recebido manifestações de interesse não apenas de fundos dedicados a mercados emergentes, mas de fundos de hedge com aplicações em países desenvolvidos que querem comprar títulos brasileiros como maneira de diversificar a carteira, aplicando, por exemplo, 1% ou 2% do patrimônio em Brasil. "Acho que haverá uma troca por parte do investidor de títulos hoje em dólares ou euros por papéis no mercado local, além de fluxo novo, com novos fundos ingressando no mercado brasileiro, como os fundos de hedge dos países desenvolvidos." Os fundos não necessariamente dedicados a mercados emergentes podem dar melhores condições para o Tesouro brasileiro do que os investidores locais, porque têm como "benchmark" de rendimento e prazos muito diferentes da média dos fundos brasileiros, diz Leme. Hood aposta que o Tesouro brasileiro poderá, em breve, emitir papéis prefixados de vencimento em dez anos. Hoje, o prazo mais longo de um título prefixado no mercado interno é 2012, e esse papel, ainda assim, têm muito baixa liquidez. Hood lembra que em 2005 os estrangeiros compraram no exterior US$ 1,5 bilhão em títulos em dólar denominados em reais do Tesouro de vencimento em dez anos e aceitaram juros de 12,7% ao ano. O gestor da Pimco, maior fundo do mundo em renda fixa emergente, Michael Discher-Remmlinger, disse ao Valor que a medida "é um progresso significativo na redução de restrições aos investidores estrangeiros que deve resultar em redução de custos para os emissores no mercado local". Discher-Remmlinger, baseado em Munique, Alemanha, diz que a Pimco vai analisar as mudanças, mas não informou se haverá troca de papéis emitidos no exterior hoje na carteira da Pimco. O Brasil é o país ao qual a Pimco tem a maior exposição em renda fixa. A Andima (Associação Nacional das Instituições de Mercado Financeiro), que havia calculado o impacto da isenção em R$ 20 bilhões, se fossem incluídos os títulos de dívida privada, não acredita em uma enxurrada de recursos entrando no país, neste momento. Segundo o presidente da Andima, Alfredo Moraes, o volume de ingresso de recursos vai depender da oferta de papéis que o Tesouro brasileiro fizer no mercado externo. "Se o Tesouro parar de emitir no exterior, mais estrangeiros vão entrar no nosso mercado interno", acredita. Segundo Moraes, antes da MP os bancos estrangeiros que emitiam títulos em reais vinham conseguindo ganhos fiscais. Compravam papéis no mercado interno e pagavam IR de 15%, embutiam esse IR no custo do papel para o investidor externo que queria comprá-lo e depois conseguiam usar como crédito no seu país de origem o IR pago. Alguns dividiam o ganho com o investidor externo, outros não. "Agora, o investidor externo passa a ter mais poder de barganha", afirma.