Título: Aplicador local pode ganhar com papel atrelado ao IPCA
Autor: Angelo Pavini, Mara Luquet e Luciana Monteiro
Fonte: Valor Econômico, 17/02/2006, EU &, p. D1

Isenção para Estrangeiro

A isenção de imposto de renda nas aplicações dos investidores estrangeiros deve reduzir os juros de longo prazo dos papéis federais e, num primeiro momento, baixar ainda mais o dólar. Para o aplicador local, isso deverá incentivar o alongamento dos prazos das aplicações, de preferência nos papéis indexados à inflação. A medida já provou reação no mercado. O BNP Paribas criou ontem mesmo um fundo de renda fixa DI para estrangeiros e espera captar em 30 dias R$ 250 milhões, diz Marcelo Giufrida, responsável pela área de asset management do banco. Além do fundo, destinado aos 6 mil investidores que já têm conta de não-residentes no país, o banco já recebeu ontem uma ordem de compra direta de R$ 100 milhões em papéis de longo prazo de um investidor estrangeiro. "Recebemos quatro consultas de investidores e mais sete de bancos estrangeiros", diz Giufrida. As Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-B), indexadas ao IPCA, devem ser favorecidas pela medida. A avaliação é de Rodrigo Bresser Pereira, gestor da Bresser Asset Management, que tem esses papéis em carteira. "Embora a expectativa de inflação para os próximos meses seja baixa, esses papéis devem se valorizar por conta do aumento da procura por parte dos estrangeiros", diz Bresser Pereira. Segundo ele, esses títulos estão muito competitivos quando comparados com os Tips, papéis do Tesouro americano que são indexados ao índice de preços dos Estados Unidos. Lá, o ganho para o investidor é de 2% acima da inflação. Já os papéis brasileiros estão com taxas acima de 8% e 9%. "Com a isenção de impostos, o ganho líquido fica ainda mais atraente", diz ele. As NTN-Bs com vencimento em 2009 são as mais líquidas e estão pagando uma taxa de 9,8% acima do IPCA. Como o vencimento é acima de dois anos, o investidor ganha também um benefício fiscal, pois a alíquota de IR cai para 15% em aplicações com prazo acima de 24 meses. Para quem está pensando na aposentadoria, Bresser recomenda papéis com vencimentos em 15 ou 20 anos que estão com taxas acima de 8%. O ganho líquido desses papéis para o investidor estrangeiro que antes ficava em torno de 350 pontos base acima da taxa americana sobre, com a medida, para cerca de 600 pontos base. Por isso, ele espera uma forte onda de recursos para as NTN-Bs. Esse fluxo de investimento deverá se refletir numa valorização do papel, o que deve compensar o recuo que era esperado no retorno total do papel por conta da queda da inflação esperada para os próximos meses. Essa medida trará mais investidores para a renda fixa fazendo com que os prazos dos papéis fiquem maiores e as taxas de juros diminuam, avalia Luiz Antonio Vaz das Neves, diretor de pesquisa da Planner Corretora. Na opinião do executivo, o reflexo no câmbio no curto prazo já foi antecipado pelo mercado, que derrubou o preço da moeda americana esta semana. Com a medida, Vaz das Neves acredita que a classificação de "investment grade" (grau de investimento) pelas agências de risco ficou ainda mais próxima e o país deve atingir a nota já em 2007. O investidor vai ter de separar melhor os recursos de acordo com os prazos e alongar o que puder para garantir as taxas de juros mais altas, alerta Fernando Lovisotto, sócio da consultoria RiskOffice. "Mas ele vai ter de se acostumar também a não ficar olhando o juro diário do CDI", alerta. O movimento de queda das taxas aumenta o que Lovisotto chama de risco de reaplicação, que é maior quanto o juro está caindo. "O investidor se pergunta se não poderia ter aplicado por mais tempo para garantir aquele juro mais alto", diz. Quem tem dinheiro hoje em CDI com juro caindo está correndo esse risco de reinvestimento. E 80% dos fundos, por exemplo, estão em CDI, sujeitos portanto a esse ganho menor. O ideal, diz Lovisotto, é o investidor olhar para o longo prazo e ter uma parcela dos recursos em ativos mais longos ou de maturação maior, como multimercados ou bolsa. "Ou ele se mexe agora ou mais tarde ficará mais difícil ainda", diz. Para Lovisotto, o investidor deveria ter metade dos recursos atrelados ao CDI e a outra metade em ativos que ganhariam com uma eventual queda mais forte dos juros. E, para quem teme uma reviravolta do cenário, a opção seriam papéis longos atrelados à inflação, que cobririam o risco de descontrole da economia. Com o estrangeiro entrando e comprando os títulos longos e o Brasil dando certo, se investidor local não fizer o mesmo, pode nunca mais vai ver uma taxa real de 9% ao ano ou mesmo uma prefixada de 15% ao ano, diz Charles Ferraz, superintendente executivo da BankBoston Asset Management. "Quem tem horizonte de investimento mais longo, poupando para aposentadoria por exemplo e acredita que o juro vai cair, pode ter oportunidade de garantir esse rendimento num papel indexado", diz Ferraz. Nesse caso, o investidor tem de parar de olhar para o CDI e se fixar na inflação, que dá o grau de perda de valor do poder aquisitivo. Para o dólar, o efeito é reforçar o cenário de entrada de recursos no país, o que impede uma valorização maior da moeda americana. Para Bresser Pereira, a medida é boa, mas veio em hora errada. Ela tem um enorme potencial de atração de capital estrangeiro, o que vai pressionar ainda mais para baixo a cotação do dólar.