Título: Fim das cotas acelera busca de mercados para têxteis
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 22/11/2004, Especial, p. A-18

Para se antecipar ao impacto da abertura do mercado têxtil no próximo ano, as empresas brasileiras estão optando pela internacionalização e correndo contra o relógio para fechar contratos e garantir seus volumes de exportação. Santista Têxtil e Vicunha já tomaram a decisão de construir fábricas na América Central, nos países andinos ou no México. A Marisol abrirá um escritório na Itália em 2005. E a Teka selou um negócio que duplicará suas exportações para a Alemanha. Depois de 40 anos, a proteção ao setor têxtil no mundo acaba em 2005, com fim o último dos acordos, o Acordo de Têxteis e Vestuários (ATV), baseado em cotas. O impacto do fim das cotas de importação dos países desenvolvidos varia conforme o segmento: confecção, tecido de algodão e tecido sintético. Os empresários avaliam que a área mais afetada será a de confecção, dada a competitividade da Ásia, principalmente na fabricação para terceiros. Como o Brasil não impõe cotas, não é esperada uma invasão de produtos chineses no mercado local, como na década de 90. Mas os empresários acreditam que fornecedores que perderem espaço nos Estados Unidos e União Européia (UE) tentarão vender no Brasil. Também apostam, no médio prazo, em queda de preços internos pela maior concorrência. O ATV permite que EUA, UE, Canadá e Noruega apliquem cotas para as exportações dos países em desenvolvimento, particularmente os asiáticos, como China, Índia e Paquistão. Sem as cotas, as nações industrializadas contarão apenas com as tarifas para se proteger. No caso da China, ainda será possível aplicar salvaguardas especiais para alguns produtos até 2012. O país aceitou essa exceção para poder entrar na Organização Mundial de Comércio (OMC). Foto: Marcelo Almeida/Valor

Almir Bieing, diretor da Teka: as empresas que fabricam itens considerados "commodities" serão as mais afetadas no mercado têxtil mundial

O fim das cotas têxteis promete ser um verdadeiro "terremoto" para os países desenvolvidos. China e Índia vão elevar consideravelmente as exportações, engolindo a produção dos pequenos países asiáticos, cuja indústria têxtil sobrevivia apenas porque as cotas obrigam à diversificação de fornecedores. Simulações de economistas da OMC indicam que China e Índia poderão deter 65% do mercado americano de vestuário após o fim do ATV, com a China triplicando e a Índia quadruplicando sua participação. Em têxteis, a China pode elevar em 50% os embarques. O Brasil representa menos de 1% do comércio mundial de têxteis mas, mesmo assim, as indústrias se preparam para a briga. De janeiro a setembro, o país exportou entre têxteis e de vestuário US$ 1,45 bilhão, segundo a Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit). A entidade estima vendas de US$ 2 bilhões até o fim do ano e de US$ 4 bilhões até 2008. "Enquanto exportador, o Brasil vai encontrar mais concorrência. Mas isso pode se transformar em oportunidade", avalia Domingos Mosca, diretor de relações internacionais da Abit. Fabricante de roupas de cama, mesa e banho, a Teka não perdeu tempo. Almir Bieing, diretor de exportações, viajou para a Alemanha no início do mês. O executivo fechou a venda de 20 milhões de euros em produtos para a filial alemã do grupo italiano Radici no próximo ano. É o dobro do que a Teka deve vender para a Alemanha neste ano e quase atinge os 25 milhões de euros que serão exportados para todo o continente europeu em 2004. Na avaliação de Bieing, as empresas que fabricam itens considerados "commodities" serão as mais afetadas pelo fim das cotas. "Uma toalha de cor única, por exemplo, é feita em qualquer parte do mundo. Por isso, estamos investindo em produtos de maior valor agregado, toalhas mais pesadas e com design diferenciado", explica. A catarinense Marisol escolheu a Itália - um das sedes da moda européia - para abrir um escritório internacional no início de 2005. De acordo com Claúdio Imianowsky, gerente de exportação, com o fim das cotas, a empresa quer reforçar sua marca no exterior, principalmente na moda infantil, onde há menos concorrência. Nesse segmento, a empresa comercializa a marca Lilica Ripilica. Imianowsky argumenta que a liberalização do setor impactará o mercado de 'private labour' (fabricação para terceiros), especialização dos asiáticos que contam com mão-de-obra barata. "Acredito em queda nos preços. Não vamos perder negócios, mas novos contratos ficarão mais difíceis", diz. Cerca de 45% das exportações da Marisol são produção para terceiros. As exportações devem representar 6% do faturamento da Marisol em 2004, ante 3% em 2003. Como os concorrentes, a empresa experimenta produzir na China. Mas, por enquanto, é um teste que não atinge 10% da produção total. Bruno Nunes, gerente de exportação da Ellus, prevê uma redução nos custos das empresas americanas com o fim do ATV, porque essas companhias poderão concentrar sua produção em poucos países. A Ellus, no entanto, está confortável com a mudança, porque atua em um segmento premium. "O impacto será para os vendedores de mão-de-obra. Nós somos compradores de mão-de-obra", diz Nunes, explicando que a Ellus terceiriza a produção. Até a desvalorização cambial, ela costumava importar. Agora, fabrica no Brasil. Os produtores de fios sintéticos foram os que mais sofreram com a abertura para têxteis. Sem escala para competir com os chineses, muitos fecharam. No entanto, esse setor não parece preocupado com a liberalização em 2005 e acredita que o Brasil pode sair ganhando. Na avaliação de Joerg Albrecht, presidente da Polyenka, o fim das cotas reduzirá a pressão das vendas de fios sintéticos asiáticos no Brasil. "Os asiáticos utilizam nosso mercado como válvula de escape para seu excesso de produção. Como há muitos países protegidos no mundo, forçam as vendas aqui", explica. Ele aposta em elevação dos preços dos fios sintéticos a curto prazo.