Título: Indústria tenta emplacar os alimentos funcionais
Autor: Daniela D'Ambrosio
Fonte: Valor Econômico, 22/11/2004, Empresas, p. B-3

Um rótulo diz que reduz o colesterol. O outro que regula o intestino. Muito além do simples apelo saudável, os chamados alimentos funcionais - que nutrem e ainda produzem efeitos benéficos à saúde - são a nova aposta da indústria de alimentos. Grandes multinacionais do setor, como Unilever, com as marcas Ades e Becel, e Danone, com o Activia, saíram na frente e fizeram desse nicho um diferencial importante no negócio. Mas o caminho para que a indústria possa "vender" tais benesses é árduo. A empresa precisa comprovar, por meio de pesquisas científicas, que o produto, de fato, reduz o risco de doenças coronárias ou melhora o funcionamento do intestino. No Brasil, desde 1999, as provas da eficácia e segurança do produto têm que passar pelo crivo da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). É diferente, por exemplo, dos alimentos que levam adição de nutrientes - aqueles cujas embalagens ganham um "rico" ou "fonte" de vitaminas, ferro ou cálcio de acordo com a quantidade desses produtos. "O ponto-chave para entrar no mercado de funcionais, além da inovação industrial, é o suporte de pesquisas muito bem feitas", afirma Franco Lajolo, professor titular do departamento de alimentos e nutrição experimental da USP e consultor da Anvisa. "Para que as empresas brasileiras possam concorrer nesse mercado, elas precisam se unir com as universidades", diz o professor. "Quem não entrar nisso, perde." Em 1999, o mercado mundial de alimentos funcionais movimentou R$ 32 bilhões e deve chegar a R$ 54 bilhões este ano. No Brasil, não há dados compilados. Esses alimentos não se diferenciam dos demais apenas na fórmula e no preço, que chega a ser até três vezes mais caro. O marketing - até para justificar o alto custo - também precisa ser diferente. É fundamental ter o respaldo de pesquisas científicas para convencer não apenas os consumidores, mas os principais garotos-propaganda e aliados da indústria na venda dessa categoria de produtos: os médicos e nutricionistas. "Acho importante ser o elo entre o conhecimento científico e a empresa", afirma o médico nutrólogo Mauro Cardoso Lins, consultor do Juice Plus, alimentos funcionais em cápsulas. As empresas não poupam esforços para ter o aval dos especialistas. O patrocínio de congressos, seminários internacionais e até o corpo-a -corpo nos consultórios - como fazem os propagandistas de remédios - são as táticas usadas pelas companhias para conquistar doutores das mais diversas áreas. "O trabalho com a comunidade médica é muito importante para nós", afirma Marcelo Camara, gerente de marca da Becel. A Becel é uma linha de margarinas composta por três produtos e um deles, o pro.activ, foi o primeiro alimento funcional aprovado pela Anvisa, em 2000. Segundo Camara, a indicação médica é responsável por 50% das vendas. O produto, que custa três vezes mais que os demais da linha, tem em sua composição os fitosteróis, que inibem a absorção do colesterol no intestino e diminuem o mau colesterol. Aprovado pelo Food and Drug Administration, dos Estados Unidos, pela Sociedade Brasileira de Cardiologia, a pro.activ representa 7% do portfólio de Becel. Outro produto da Unilever considerado funcional é o Ades Original Light, da linha Ades, à base de proteína vegetal de soja. O estudo divulgado pela marca e que embasa os seus benefícios (redução do colesterol) foi conduzido pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e pelo Instituto Dante Pazzanese. O estudo é levado aos cardiologistas nos consultórios. "Como formadora de opinião, é importante que a classe médica e os nutricionistas indiquem nosso produto", afirma Fernanda Tamate, gerente de produto Ades. O Activia da Danone está em 20 países e já é a segunda marca em faturamento da empresa francesa - que em 2003 alcançou 13,1 bilhões. No Brasil, as vendas também são positivas. A linha chegou ao mercado brasileiro no início deste ano e tem 6% do mercado de iogurtes. O Corpus, outro iogurte da Danone, tem 8% de participação. "O mercado potencial no Brasil é enorme: estima-se que 30 milhões de pessoas tenham o intestino preguiçoso", afirma Alberto Bendicho, gerente de comunicação e marketing da Danone. Além de ter promovido um grande evento para a classe médica antes do lançamento do produto, a Danone mantém um site específico para os profissionais da área médica.