Título: Relatório mostra picos de investimento em 2002 e 2004
Autor: Juliano Basile
Fonte: Valor Econômico, 22/02/2006, Política, p. A6

O sub-relator da CPI dos Correios, deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA), pretendia provar que houve concentração de recursos de fundos estatais federais nos bancos Rural e BMG em 2003 e, principalmente, 2004. Esses recursos, na ordem de R$ 533,6 milhões em 2004, seriam uma "recompensa" pela participação dos dois bancos no esquema do valerioduto. Mais: segundo o deputado, a aplicação dos recursos coincidiria com os saques do mensalão. Depois de duas horas de apresentação de um relatório parcial, com essas conclusões, aos demais integrantes da CPI dos Correios, ACM Neto não conseguiu provar nem uma coisa nem outra. O relatório parcial mostra os investimentos divididos em duas categorias. Dinheiro bruto, que é reinvestido após o prazo de aplicação e dinheiro novo. Em 2000, os fundos de pensão federais investiram R$ 95,71 milhões (bruto) nos Bancos Rural e BMG e R$ 93,21 milhões em dinheiro novo. Em 2001, esse valor caiu para R$ 30,47 milhões (bruto) e R$ 27,49 milhões (novo). Em 2002, surgiu o primeiro crescimento: R$ 239,60 milhões de recursos brutos dos fundos federais direcionados aos dois bancos suspeitos de participação no esquema de Marcos Valério, somados a R$ 189,93 milhões de dinheiro novo. Em 2003 - primeiro ano do governo Lula e, segundo as denúncias, início do chamado mensalão -, esses investimentos caíram para R$ 48,82 milhões (bruto) e R$ 42,56 milhões (novo), para explodirem de vez em 2004, com R$ 533,60 milhões (bruto) e R$ 346,51 milhões de dinheiro novo. "É uma verdade inconteste, os números não mentem. Em 2004, houve uma recompensa aos dois bancos por terem participado de um esquema irregular montado pelo governo federal", acusou o pefelista. A líder do PT no Senado, Ideli Salvatti (SC), contestou de forma dura o relatório. De posse de um estudo solicitado por ela própria à Secretaria de Previdência Complementar (SPC), Ideli mostrou que, em 2004, os bancos Rural e BMG atraíram investimentos de vários fundos de pensão, privados, federais e estaduais. Um dos gráficos do estudo mostra que os fundos federais teriam sido até mais conservadores que os demais. Um deles, privado, cujo nome foi mantido em segredo pelas regras de sigilo bancário, investiu no Rural, em setembro de 2004, 58,48% de sua carteira de investimentos. "Se o Rural falisse neste mês, como o Banco Santos faliu, esse fundo estaria quebrado", observou um assessor parlamentar. Para Ideli, o sub-relator da CPI dos Correios optou por um caminho político, sem sustentação matemática, para comprovar sua tese. "Se vários fundos investiram no Rural e no BMG, por que não pensar que houve um movimento de mercado? Por que achar que há uma conotação política"? Outro petista da CPI dos Correios, deputado José Eduardo Cardozo (SP), ponderou. "Não descarto que a hipótese do senhor relator esteja correta. Mas por que os bancos seriam recompensados um ano depois por conta de participação em um esquema irregular? Não podemos nos deixar levar pelas paixões políticas para transformar em conclusão fatos que são apenas, por enquanto, teses", defendeu. ACM Neto também não conseguiu explicar porque os dois bancos foram tão atrativos para os fundos em 2002, perdendo apenas para o volume de investimentos de 2004. O pefelista, que "estranhou" o fato de a SPC ter encaminhado um estudo à senadora Ideli e não à CPI dos Correios, acrescentou que em 2002 o maior volume de recursos nos bancos foi aplicado pelo fundo Real Grandeza, que pertence a Furnas. "Nós não conseguimos explicar os investimentos em 2002. Mas a aplicação de recursos em 2004 é claramente política", reiterou o parlamentar. Tanto a Previ, do Banco do Brasil, quanto a Petros, da Petrobras, divulgaram notas ontem contestando a interpretação do sub-relator. Segundo a Previ, todas as operações realizadas foram efetivadas de forma transparente, por meio de leilão eletrônico de taxas e trouxeram excelentes ganhos para a Previ. " Todos os recursos aplicados foram resgatados de acordo com as taxas e prazos contratados", diz a nota. A Petros afirma que "as aplicações em Fundos de investimentos em Direitos Creditórios nas duas instituições cumpriram todo o rito de análise técnica e aprovação nas instâncias decisórias internas". Segundo a Petros, havia baixa possibilidade de perda. O diretor Ricardo Malavazzi afirmou que "o relatório foi apresentado sem critério técnico ou qualquer avaliação sobre o comportamento do mercado financeiro em cada momento". (PTL)