Título: Insatisfação dos governadores ameaça votação do Orçamento
Autor: Mônica Izaguirre
Fonte: Valor Econômico, 24/02/2006, Política, p. A8

A insatisfação dos governos estaduais com o montante destinado a compensá-los pela desoneração de exportações pode paralisar a já bastante atrasada tramitação do projeto da lei orçamentária da União para 2006. Um dos primeiros a se mobilizar pela obstrução, o governador do Rio Grande do Sul, Germano Rigotto (PMDB), está convicto de que não existe a menor chance de o Orçamento ser votado pelo Congresso, caso não se altere o substitutivo apresentado anteontem pelo relator-geral, deputado Carlito Merss (PT-SC). "Não tem como votar enquanto não houver correção", disse ele ao Valor, referindo-se aos R$ 3,4 bilhões destinados por Merss às compensações da Lei Kandir. "Cada Estado vai mobilizar sua bancada para obstruir a votação", avisou. Simão Jatene (PSDB), que governa o Pará, confirma a articulação de governadores pela obstrução. "Já falei com o Aécio (Neves, de Minas Gerais), com o Rigotto, com o Paulo Souto (Bahia), com o Blairo (Maggi, do Mato Grosso)". Segundo ele, os deputados vão reagir "não porque os governadores mandem nas bancadas estaduais" e sim porque os Estados serão prejudicados e eles, parlamentares, cobrados pelos eleitores, se não houver a alteração do relatório final do Orçamento. As administrações estaduais trabalham para que, em 2006, sejam destinados ao ressarcimento pela isenção de ICMS nas exportações de produtos primários e semi-elaborados no mínimo R$ 5,2 bilhões, o mesmo valor de 2005. A queda de braço entre o relator do Orçamento, um aliado do governo federal, e os governos estaduais envolve apenas as vendas externas desses produtos, desoneradas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços desde fins de 1996, pela Lei Kandir. No caso dos industrializados, a compensação pela desoneração de exportações, promovida pela Constituição de 1988, não é motivo de briga porque a União repassa automaticamente aos Estados 10% de sua arrecadação com o imposto sobre esses produtos, o IPI. Germano Rigotto entende que a destinação de apenas R$ 3,4 bilhões pelo relator-geral e também o fato de o governo federal ter encaminhado seu Orçamento ao Congresso sem nenhuma previsão de recursos para cumprimento da Lei Kandir são "desrespeito" e "falta de consideração" com os Estados. Ele lembrou que em 1997, quando o volume anual de exportações estava na casa de R$ 27 bilhões por ano, o ressarcimento foi de R$ 3,2 bilhões. "E agora que as exportações passam de R$ 100 bilhões/ano querem ressarcir só R$ 3,4 bilhões. É um absurdo, uma piada", disse o governador. "Mais ridículo ainda", na sua opinião, é vincular a liberação do dinheiro à regulamentação do artigo 91 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, como fez o relator. Para ele, isso é impossível de se conseguir ainda em 2006, ano eleitoral, porque exige aprovação de lei complementar. Essa regulamentação é a que vai criar regras para o ressarcimento, cujo valor, atualmente, precisa ser negociado todos os anos. Os governos estaduais querem tal regulamentação, tanto que já propuseram um anteprojeto ao Ministério da Fazenda. Mas o governo federal não quer porque prefere uma alteração constitucional que estabeleça um novo modelo de desoneração. O governador do Pará entende que, se "elegeram as exportações como vetor de crescimento econômico", o governo federal tem obrigação de ressarcir aos Estados pelo menos metade da conta da desoneração, o que dá R$ 8,3 bilhões/ano, segundo os secretários estaduais de Fazenda, no caso dos produtos primários e semi-elaborados. Dado o patamar que atingiram as exportações, na opinião de Simão Jatene, nem precisaria mais desonerar as desses produtos, só as de industrializados. Ele destaca que isentar de ICMS a matéria prima prejudica sobretudo Estados que adquirem os insumos de mercadorias exportadas e em outros Estados, caso do Pará.