Título: Tesouro vai recomprar os bradies
Autor: Cristiane Perini Lucchesi e Francisco Góes
Fonte: Valor Econômico, 24/02/2006, Finanças, p. C1

Dívida Renegociada Resgate antecipado de US$ 6,64 bi trará economia de US$ 345 mi com juros

O Tesouro Nacional confirmou ontem as expectativas do mercado e anunciou que vai recomprar antecipadamente no dia 15 de abril o que resta dos papéis da dívida externa renegociada em 1994 nos moldes do Plano Brady, os chamados bradies. Com o resgate antecipado, que vai somar US$ 6,64 bilhões, ficam nas mãos dos investidores apenas títulos de dívida comprados voluntariamente, sem o estigma da moratória. A notícia foi recebida com otimismo - o risco-Brasil despencou. Foi a 223 pontos básicos, seu menor nível na história, em queda de 3,46%. O governo está exercendo um direito seu previsto no contrato dos bradies. Todos os títulos resultantes da reestruturação de 94 têm uma cláusula que permite a recompra antecipada pelo Tesouro nos dias de vencimentos de juros, em 15 de abril e 15 de outubro de cada ano, por 100% do valor de face. Para exercer esse direito, porém, o Tesouro tem de avisar os investidores entre 30 e 60 dias antes, como fez ontem. O secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, previu que o resgate antecipado dos bradies irá representar economia de US$ 345 milhões, a valores presentes, referentes à despesa com juros. Ele afirmou que a recompra faz parte do trabalho de saneamento da dívida externa com o objetivo de melhorar as condições do país, mas não quis projetar quando o Brasil poderá ser considerado grau de investimento, selo de investimento não-especulativo das agências de rating. "O trabalho continua", afirmou o secretário. Segundo Levy, a retirada do mercado dos títulos da dívida reestruturada tende a beneficiar as emissões das empresas privadas no exterior em um cenário de redução do risco Brasil. "Hoje pagamos um spread menor do que o da Turquia, cujo rating é semelhante ao nosso, e estamos nos aproximando do spread do México", comparou Levy. Ele lembrou que o governo vem adotando um conjunto de medidas para a administração da dívida (externa e interna), como a facilitação do ingresso do investidor estrangeiro na dívida interna, o aumento de emissões de títulos pré-fixados, a emissão em reais no exterior e o pré-pagamento da dívida com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Clube de Paris, além da recompra de títulos no mercado secundário com vencimentos até 2010. O secretário-adjunto do Tesouro, José Antônio Gragnani, avaliou que o Brasil ficará mais atrativo para o investidor estrangeiro após a recompra dos bradies. Segundo comunicado do Tesouro, "os títulos da dívida reestruturada tipicamente têm menor liquidez e sua retirada de mercado deverá ter impacto positivo na curva soberana brasileira, com possíveis reflexos também nas emissões das empresas brasileiras no exterior". Serão resgatados bradies que venciam até 2024: o Par (US$ 1,42 bilhão de estoque no dia 31 de janeiro), o Discount (US$ 1,29 bilhão), o Flirb (US$ 33 milhões), o DCB (US$ 2,87 bilhões) e o NMB (US$ 730 milhões). O EI, um brady de US$ 247 milhões, não será resgatado antecipadamente, pois seu vencimento final é justamente no dia 15 de abril. O BIB, um pré-brady, de US$ 247 milhões, não será resgatado, pois não tem opção de resgate antecipado. Os recursos para o resgate antecipado vão sair das reservas internacionais, o caixa em moeda estrangeira do país, que estavam em US$ 56 bilhões em janeiro. Mas a operação vai liberar US$ 1,5 bilhão em garantias - títulos do Tesouro dos Estados Unidos - dos títulos Par e Discount, reduzindo a necessidade de utilização das reservas, que será de cerca de US$ 5 bilhões. Além do alongamento do prazo da dívida externa, o Tesouro também objetiva com a recompra reduzir ainda mais a exposição cambial bruta da dívida pública, segundo informou em nota. De acordo com Mário Mesquita, economista-chefe do ABN AMRO, a recompra é semelhante à realizada pelo México pouco antes de o país se tornar grau de investimento. Para Mesquita, a recompra dos bradies pode ter um impacto positivo na visão da agências de rating sobre o Brasil. Ontem, o México também lançou uma oferta de recompra de títulos da dívida, mas de US$ 5 bilhões em bônus globais denominados em dólares, libras e euros, que vencem entre 2007 e 2003, e anunciou o lançamento de um novo bônus denominado em dólar.