Título: Tensão pré-Copom segura queda do dólar
Autor: Luiz Sérgio Guimarães
Fonte: Valor Econômico, 03/03/2006, Finanças, p. C2

O dólar chegou a cair ontem 0,47%, para R$ 2,1060, mas fechou a R$ 2,1130, com desvalorização de apenas 0,14%. Nota-se muita resistência ao rompimento dos R$ 2,10. Quando a cotação se aproxima desse limiar, aparecem compradores importantes, sobretudo empresas estrangeiras interessadas em remeter capital. Parte dos analistas considera, porém, inevitável que em algum momento de março ocorra a escavação desse piso psicológico. Os investidores estão esperando a decisão a ser tomada pelo Copom do Banco Central na próxima quarta-feira sobre o tamanho do corte da Selic para então definir o rumo do câmbio. Se o BC mantiver suave o ritmo declinante da Selic, a 0,75 ponto por reunião, o dólar buscará rapidamente os R$ 2,00. Mas uma decisão ousada - baixa de um ponto ou 1,25 ponto - pode assustar os investidores e caracterizar uma inversão de tendência. O dólar não mais ameaçaria o divisor de R$ 2,00, mas se estabilizaria num degrau mais elevado, entre R$ 2,15 e R$ 2,20. Para o corretor de câmbio Sidney Nehme, da NGO Câmbio, há dois fatores capazes hoje de neutralizar a tendência de baixa do dólar. O primeiro seria uma inversão na curva de exportação. Resultados ruins teriam o poder de elevar o dólar. O outro seria um desaperto monetário mais intenso. Um terceiro fator altista - a imposição pelo BC de limitações administrativas ao carregamento de posições vendidas pelos bancos - saiu de cena ontem com a divulgação dos dados oficiais relativos à balança cambial de fevereiro. Os bancos inverteram completamente seu posicionamento cambial em fevereiro. De posição pesadamente "vendida" em US$ 4,691 bilhões no final de janeiro, as instituições passaram a carregar caixa "comprado" em US$ 200 milhões no encerramento de fevereiro. Com essa inversão, os bancos não estão assumindo a previsão de que o dólar irá parar de cair. Apenas aproveitaram o forte fluxo cambial positivo do mês passado para zerar as posições vendidas a baixo custo. A balança cambial foi positiva em US$ 7,75 bilhões no mês passado, um salto de 298% em relação ao superávit de US$ 1,949 bilhão auferido em janeiro. Como as compras diretas de dólares feitas pelo BC foram pequenas, estimadas em apenas US$ 2,86 bilhões, os bancos foram obrigados a absorver o excesso. Caso contrário, o dólar despencaria mais ainda. Como as instituições entraram o mês de março com posições compradas em dólar, perde o sentido prático o temor de que o BC poderia, como forma de evitar valorização maior do real, impor restrições legais ao carregamento de posições vendidas.

Moeda resiste em cair abaixo de R$ 2,10

A mesma incerteza e falta de consenso constatadas em pesquisa feita ontem com economistas sobre o próximo passo de política monetária do Copom afligem o mercado futuro de juros da BM&F. O contrato para a virada do trimestre recuou ontem de 16,65% para 16,61% e, tecnicamente, passou a incorporar a aposta de um corte de 0,88 ponto na taxa Selic, justamente o meio do caminho entre as previsões de uma redução comedida de 0,75 ponto e outra mais agressiva, de um ponto percentual. Os contratos mais longos pararam de cair com intensidade maior que os mais curtos. O CDI previsto para a virada do ano também caiu 0,04 ponto, para 15,23%. Quando as taxas para um ano se aproximaram muito de 15%, o processo de queda tornou-se mais lento e moroso. Ontem, o swap de 360 dias cedeu de 15,15% para 15,10%. O motivo é que juro nominal abaixo de 15% entra na linha de tiro do juro real de apenas um dígito. E juro real aquém dos 10% só seria factível com a concordância do Copom. Como? Por meio de um corte de um ponto. Uma decisão mais arrojada do BC seria benéfica tanto para o câmbio, ao equilibrar a cotação, quanto para a dívida pública. Não só porque reduziria o impacto fiscal das intervenções cambiais. Mas tornaria mais fácil a redução dos juros pagos pelo Tesouro ao capital estrangeiro. O fluxo de dólares para a aquisição primária de títulos públicos compensaria a fuga dos investimentos "sintéticos", aplicados em derivativos de câmbio. Em comunicado divulgado ontem, o Tesouro manifestou a confiança no sucesso dos leilões de NTN-B, papéis indexados ao IPCA e disputados pelos estrangeiros, programados para a semana que vem. Ele anunciou o alongamento do prazo desses títulos: informou que não irá oferecer NTN-B com vencimento em maio de 2007, mas colocará em leilão papéis com resgate em maio de 2011. Os papéis com vencimentos intermediários, tanto o de maio de 2009 quanto o de agosto de 2010, continuarão a ser oferecidos periodicamente.