Título: Selic cai 0,75 ponto para 16,5%
Autor: Alex Ribeiro, Luiz Sérgio Guimarães e Altamiro Sil
Fonte: Valor Econômico, 09/03/2006, Finanças, p. C2

Política Monetária Três dos nove membros do Copom defenderam corte de um ponto

Dividido, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu ontem reduzir em 0,75 ponto percentual, para 16,5% ao ano, a taxa básica de juros da economia. Três dos nove membros do colegiados votaram por uma redução de um ponto percentual. Foi o sexto corte seguido na taxa básica de juros, que foi reduzida ao mais baixo percentual desde setembro de 2004. Após a reunião, que durou pouco menos de quatro horas, o Copom divulgou uma breve nota: "Dando prosseguimento ao processo de flexibilização da política monetária iniciado na reunião de setembro de 2005, o Copom decidiu reduzir a taxa Selic para 16,5% ao ano, sem viés, por seis votos a favor e três votos pela redução da taxa Selic em 1 ponto percentual." O texto praticamente repete a nota divulgada na reunião anterior, ocorrida em janeiro. A diferença é que naquele comunicado a autoridade monetária avisou que iria acompanhar atentamente os cenários prospectivos da inflação para só então decidir os passos seguintes da política monetária. O Copom volta a se reunir em 18 e 19 de abril. No governo Lula, essa é a sexta vez em que o Copom registra votos dissidentes. O mais recente episódio ocorreu em dezembro passado, quando dois membros votaram por um corte de 0,75 ponto percentual, e a ala majoritária votou por 0,5 ponto. Maiores detalhes sobre o que levou à divisão dos membros do Copom só devem ser conhecidos na semana que vem, quando for divulgada a ata do encontro de ontem. Mas, de certa forma, o placar registrado no comitê reproduz a divisão que, nos dias anteriores, era vista entre os analistas econômicos. Em dezembro, as andorinhas do Copom - aqueles que advogavam cortes mais ousados nos juros - chamavam a atenção para o fato de que o risco inflacionário havia se reduzido muito em relação aos riscos de frustração do crescimento econômico. De lá para cá, o balanço de riscos se tornou mais favorável para a inflação. Mas o risco de uma pífia atividade econômica se tornou ainda menor, após a divulgação de dados que indicam recuperação da indústria. Os falcões do BC - aqueles que defendem decisões mais conservadoras - vêm insistindo que existem incertezas sobre os impactos do afrouxamento monetário sobre inflação e crescimento. O corte de juros demora pelo menos seis meses para agir sobre atividade. Por isso, pregam a redução gradual dos juros, de modo a evitar que a atividade econômica fique forte demais, o que exigiria a interrupção do processo de afrouxamento monetário. Para o economista-chefe da corretora Concórdia, Elson Teles, o placar de 6 a 3 foi surpreendente. "Três diretores manifestaram preocupação com o nível de atividade", interpretou. O dissenso não vi passar ao mercado a idéia de que na reunião de abril o Copom poderá intensificar o ritmo de queda para um ponto. Na verdade, se o BC quisesse aumentar o tamanho do corte a reunião de ontem seria a ideal. "Daqui para a frente, irá diminuir o espaço para cortes mais ousados", prevê Teles. O economista-chefe da GRC Visão, Jason Vieira, acredita que o BC já perdeu o timing para opções mais arrojadas de política monetária. Terá de insistir no compasso atual. O consultor Miguel Daoud, da Global Financial Advisor, diz que a decisão foi "decepcionante". Foi uma confissão de que o Brasil não melhorou a ponto de suportar uma flexibilização monetária. "Bastou o retorno da turbulência externa para o BC reincidir no conservadorismo", diz Daoud. O Bradesco anunciou, ontem, a redução das taxas de juros dos empréstimos para pessoas físicas e pessoas jurídicas, na esteira da decisão do Copom. Os juros do cheque especial caíram de 8,23% para 8,17% ao mês, na máxima, e de 4,58% para 4,55% ao mês, na mínima. As taxas do crédito pessoal foram reduzidas de 5,77% para 5,71% ao mês, na máxima, e de 3,22% para 3,16% ao mês, na mínima. Para empresas, os juros do capital de giro caíram de 6,16% para 6,10% ao mês, na máxima, e de 3,13% para 3,07% ao mês, na mínima. Já os representantes da indústria e do comércio frustraram-se com a decisão. O presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (IBEF) Walter Machado de Barros, lamentou a decisão. "O Banco Central tinha todas as condições para um corte de, pelo menos, um ponto percentual. Estamos vendo o bonde passar", disse. Para ele, a turbulência nos mercados internacionais nos últimos dias pode ter influenciado a decisão. Machado avalia que o estresse foi um apenas "soluço" do mercado e que os indicadores internos permitiriam uma queda maior. O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas (Abimac), Nilton Mello, classificou a baixa do juro de "medíocre e risível". Depois de incentivar o ingresso de capitais estrangeiros por meio da isenção do IR à compra de títulos públicos, o BC ampliará o ingresso de dólares com a decisão de ontem. "A apreciação cambial irá ampliar-se, com danos ainda maiores às exportações", diz Mello. Para o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, o Copom "está alheio à opinião dominante do governo; não se importa com o ritmo comportado da inflação; não se preocupa com a ridícula taxa de crescimento que o Brasil apresenta; e despreza as considerações críticas do setor produtivo". "A indústria frustrou-se mais uma vez", disse a Confederação Nacional da Indústria (CNI) em nota divulgada ontem. "Há espaço para um corte maior ainda. Eu reduziria em 1,5 ponto percentual", afirmou o presidente da entidade, Armando Monteiro Neto. Segundo a CNI, a atual situação da economia não justifica a manutenção de "juros reais básicos tão elevados, acima de 11% ao ano". Para a entidade, a queda não reflete as mudanças na economia nos últimos meses, com melhora expressiva das expectativas de inflação e atividade em moderada recuperação. "Resta, como explicação para tamanho conservadorismo, um possível descumprimento da meta do superávit primário em 2006", afirmou a CNI. "Para o setor industrial, a decisão do Copom emite sinais preocupantes sobre a trajetória futura dos juros, com impactos negativos sobre a confiança dos agentes e as decisões de investimento das empresas", acrescentou a entidade. A decisão do Copom também foi criticada por Guilherme Afif Domingues, presidente da Associação Comercial de São Paulo. "Consideramos que tanto os indicadores de preços, como os de atividade econômica, justificariam uma redução maior, o que permitiria acelerar a atividade sem riscos para a inflação. Não desejamos o abandono da política de combate à inflação que vem sendo adotada pelo BC, mas apenas que não se percam as oportunidades para um corte maior dos juros" afirmou Afif. Para o presidente da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio), Abram Szajman, a redução é bem-vinda, mas insuficiente. "Não é compreensível, nem razoável, que a taxa real de juros continue a maior do mundo e no mesmo patamar elevado da época em que o dólar estava a R$ 3 e o risco Brasil era dez vezes o que é hoje. Parece que tudo muda, menos o conservadorismo do Copom", disse.