Título: Lula promete que país fará concessões na Rodada Doha
Autor: Assis Moreira
Fonte: Valor Econômico, 10/03/2006, Brasil, p. A4

Relações externas Tony Blair confirma apoio à cúpula de dirigentes

Depois de se reunir e almoçar carneiro com o primeiro-ministro Tony Blair, ontem, na Downing Street 10, residência oficial do dirigente britânico, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva prometeu que o Brasil está disposto a fazer "concessões necessárias" para desbloquear a rodada global de negociações comerciais, proporcionais ao poder econômico do país. Por sua vez, Blair deu apoio mais enfático a um encontro de cúpula de presidentes para dar um impulso politico à "conclusão" de um "acordo ambicioso" de liberalização na Rodada Doha até o final do ano, como Lula vem propondo. O encontro entre ambos antecedeu uma reunião de ministros do G-6, grupo que reúne Brasil, Estados Unidos, União Européia, Índia, Austrália e Japão, de hoje a domingo na capital britânica para tentar pavimentar um acordo até o final de abril na Organização Mundial do Comércio (OMC) sobre as maneiras de cortar subsídios e tarifas. Lula e Blair divulgaram uma declaração conjunta sobre comércio na qual conclamam todos os parceiros a dar "passos corajosos" para ir além de suas posições negociadoras e melhorar as ofertas de liberalização de seus mercados. Na prática, o dirigente britânico reconhece a necessidade de aumentar os cortes de tarifas agrícolas e reduzir subsídios, como quer a contrapartida. Apesar das declarações otimistas de Lula sobre a sintonia com Londres, o fato é que o sub-secretário de comércio britânico, Ian Pearson, não cansou de repetir a demanda da União Européia para abertura aos fornecedores estrangeiros em produtos industriais e serviços. Nesse contexto, Lula afirmou que o Brasil sabe que tem de fazer oferta melhor nas áreas industrial e de serviços da mesma forma que exige corte de subsídios dos outros parceiros. Mas não deu exemplos, alegando que os países estão em plena negociação. "É segredo de Estado", brincou o presidente. Lula e Blair consideraram ser "crucial" o encontro de cúpula de presidentes para concluir a rodada até o final deste ano. Na declaração, prometem "consultas intensivas" com seus colegas de respectivos grupos (Brasil no G-20 e Reino Unido na UE) para se juntar a eles na busca de um "pacote ambicioso pró-desenvolvimento". Lula e Blair dizem que isso exige coragem e envolve riscos. "Podemos fracassar. Mas o custo de inação é ainda pior", afirmam no comunicado. Certos negociadores, contudo, e também o diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, são extremamente cautelosos sobre a iniciativa do presidente brasileiro. Acham que se um encontro entre os presidentes mantiver o impasse nas negociações, é toda a rodada que afundará de vez. Por isso, essa cúpula não sairá antes que um acordo esteja praticamente definido. Blair disse que o sucesso ou fiasco da Rodada Doha, na Organização Mundial do Comércio (OMC), vai mostrar o nível de engajamento ou não dos países no sistema multilateral. Já a Oxfam, organização não governamental britânica respeitada na área comercial, vê um "grave risco" de que os interesses dos países em desenvolvimento sejam "sacrificados" para manter o sistema funcionando. A Oxfam denuncia que as ofertas dos EUA e pela UE na agricultura não são suficientes e vêm sendo acompanhadas por demandas "inaceitáveis" aos outros países em diferentes áreas. Em Bruxelas, o comissário europeu de Comércio, Peter Mandelson, surpreendeu alguns observadores dizendo que a UE e o Brasil aproximaram suas posições agrícolas. O embaixador brasileiro junto à OMC, Clodoaldo Hugueney, negou. "Não há nada disso", reagiu. Negociadores em Genebra confirmaram que nas últimas semanas não tem havido progressos nas articulações. A expectativa é de que os ministros, neste fim de semana, sinalizem "aproximação" em questões técnicas.