Título: Em crise, Conselho de Ética julga João Paulo
Autor: Cristiano Romero
Fonte: Valor Econômico, 14/03/2006, Política, p. A9

Em crise de identidade, o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados vive a partir de hoje a semana mais delicada desde o início da crise do mensalão. Ainda revoltados com as absolvições dos deputados Roberto Brant (PFL-MG) e Professor Luizinho (PT-SP) pelo plenário na última quarta-feira, os integrantes do colegiado deverão aprovar hoje o pedido de cassação do deputado João Paulo Cunha (PT-SP). Amanhã, a expectativa recai sobre as votações dos processos de Pedro Corrêa (PP-PE) e Pedro Henry (PP-MS) pelo plenário. A incerteza quanto ao real respaldo do colegiado é percebida na palavra dos próprios conselheiros. "Uma possível consolidação dos acordões no caso das duas votações no plenário e a real legitimidade do Conselho de Ética estarão colocadas à prova nessa semana. Serão dias de reflexão e muitas das prerrogativas do Conselho estarão em cheque", diz o deputado Júlio Delgado (PSB-MG), um dos mais irritados integrantes do órgão na semana passada, depois da absolvição de Brant e Luizinho. O Conselho havia recomendado a cassação dos dois e viu seu julgamento ser desautorizado pelo plenário pela terceira vez (Romeu Queiroz, do PTB de Minas Gerais, já havia sido absolvido em dezembro). Delgado aguarda as votações no plenário, amanhã. "Depois do que houve na semana passada, está difícil andar na rua. Se essa pressão aconteceu com os demais colegas, creio que o plenário passará a ser mais atento a partir de agora", afirmou. O Conselho de Ética pediu a absolvição de Pedro Henry por falta de provas. No caso de Corrêa, o órgão recomendou a perda do mandato. "A semana passada aumentou esse desentendimento entre o Conselho de Ética e o plenário, sem dúvida. Na sessão do plenário da última semana, 90% dos deputados não ouviram direito o que o relator tinha a dizer e votaram de acordo com a amizade e em função do acerto das lideranças", afirma o deputado Nelson Trad (PMDB-MT). Além da expectativa em torno dos processos a serem votados pelo plenário, o Conselho tem semana delicada em função da votação de hoje de João Paulo Cunha. O ex-presidente da Câmara é o deputado de maior expressão a ser julgado pelo órgão desde a cassação do ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu (PT-SP). À notoriedade de Cunha, soma-se o fato de ser o primeiro julgamento de um parlamentar depois da deflagração do embate do Conselho com o plenário na última semana. Nelson Trad pede responsabilidade redobrada dos colegas nas próximas análises de processos pelo Conselho. "Não podemos buscar resultados no Conselho para corrigir possíveis frustrações com o plenário", diz. Tanto Delgado quanto Trad avaliam que a situação de João Paulo Cunha é muito complicada. "A não ser que ele faça uma defesa monumental, creio que terá o pedido de perda de mandato aprovado com folga", avalia o mineiro. "João Paulo tem pouca chance. O relator foi muito feliz na elaboração do relatório", diz Trad, ao se referir a Cezar Schirmer (PMDB-RS), que produziu voto de 59 páginas nas quais pediu a cassação do ex-presidente da Câmara. Cunha é acusado de receber R$ 50 mil do empresário Marcos Valério de Souza para uso em caixa 2 e de ter firmado contrato irregular com a DNA, agência de Marcos Valério, quando dirigia a Casa. Outro a ter o processo julgado pelo Conselho nessa semana é o deputado José Mentor (PT-SP), acusado de receber pelo menos R$ 120 mil da 2S Participações, de Marcos Valério. O parlamentar alega ter realizado serviços jurídicos para a empresa.