Título: Impasse nos agrotóxicos divide Argentina e Brasil
Autor: Mauro Zanatta
Fonte: Valor Econômico, 14/03/2006, Agronegócios, p. B11

Mercosul Vizinho quer melhores condições de acesso a seus produtos

O Tribunal Arbitral do Mercosul poderá ser acionado ainda nesta semana para julgar um novo capítulo das disputas comerciais entre Brasil e Argentina. Uma reunião preliminar marcada para amanhã, em Buenos Aires, tentará contornar as divergências entre os principais sócios do bloco sul-americano em relação a procedimentos de registro e de acesso a mercado dos agrotóxicos argentinos no Brasil. "Escondidas" nesta batalha estão uma antiga reivindicação argentina pela abertura total do mercado brasileiro e a vontade de avançar no segundo maior mercado mundial de agrotóxicos - em 2005, o setor faturou US$ 4,1 bilhões no Brasil, segundo a Associação Brasileira dos Defensivos Genéricos (Aenda). Os argentinos também reclamam da demora do governo brasileiro em registrar seus produtos e querem ampliar a chamada "lista positiva" de livre comercialização de agrotóxicos. A lista está atualmente restrita a 27 produtos técnicos, utilizados na formulação dos defensivos agrícolas usados nas lavouras. E ameaçam retaliar com a suspensão dos registros de produtos brasileiros. "Eles [os argentinos] não aceitam a forma de registro, apesar de usarem o mesmo sistema. Como são mais protecionistas que nós, podem mesmo levar isso adiante", afirma o diretor-executivo da Aenda, Túlio Teixeira de Oliveira. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informa ter registrado 41 produtos fabricados ou licenciados por empresas argentinas no Brasil. Mas o procedimento também depende das anuências do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e da Coordenação de Fiscalização de Agrotóxicos do Ministério da Agricultura. "É verdade que falta agilidade, mas eles já têm três produtos genéricos registrados aqui", observa Oliveira. O executivo lembra que a lentidão no sistema brasileiro tem relação com a influência de empresas multinacionais nos órgãos de registro, sobretudo no Ministério da Agricultura. "Não é só a ideologia do Ibama que atrapalha, mas também o interesse poderoso das multinacionais contra os genéricos", afirma. Segundo estudo da Aenda, que reúne 53 empresas do segmento, inclusive a estatal Petrobras, 74% dos ingredientes ativos usados nos agrotóxicos brasileiros estão protegidos pela exclusividade de produção das patentes e apenas 13% têm três ou mais empresas produtoras. "A patente, que vale por até 20 anos, não deixa os preços baixarem. Aí é onde se escondem os interesses", diz. Os procedimentos para a entrada de agrotóxicos no país já foram questionados, e modificados, recentemente. A Agricultura passou a exigir o registro de matérias-primas usadas nos produtos finais. Até então, esses componentes estavam livres de cadastro. Mas a divulgação de uma Ata de Reunião, de 22 de setembro de 2000, onde representantes de diversas áreas do governo liberaram a importação 810 toneladas do glifosato ácido feita pela empresa israelense-brasileira Milenia Agro Ciências, foi parar na Câmara dos Deputados. Diante da repercussão, o ministério decidiu reavaliar o cadastro dos produtos técnicos. A denúncia partiu da empresa paranaense Nortox. O caso acabou sem esclarecimentos públicos.