Título: Milho já sofre os efeitos da gripe aviária
Autor: Alda do Amaral Rocha
Fonte: Valor Econômico, 14/03/2006, Agronegócios, p. B12

Mercado Os preços recuam por causa da safra, do dólar e da menor demanda pelo grão por parte das integrações

Principal componente da ração de aves, o milho já começa a sentir os reflexos da gripe aviária que se alastra por Europa, África e Ásia. As cotações no mercado interno, que tradicionalmente recuam nesta época do ano por causa do período de colheita, sofrem ainda maior pressão por conta da perspectiva de queda na demanda por milho, segundo analistas. Isso deve ocorrer uma vez que as integrações de aves começam a rever os seus plantéis de produção após o recuo na exportações de carne de frango provocado pela gripe aviária. Estima-se que o setor fará um corte de 10% a 15% na produção de aves, e o número ideal apontado é 25%. Conforme acompanhamento da Céleres, entre a primeira semana de fevereiro e a semana passada, a cotação média do milho no mercado disponível recuou 16,5%, para R$ 12,16 por saca na região de Cascavel. Na região de Chapecó, a saca caiu de R$ 16,50 em média para R$ 16,20 no período e em Campinas, de R$ 17,00 para R$ 15,80. Leonardo Sologuren, da Céleres, afirma que deve rever sua estimativa para o consumo de milho no setor de aves. Antes dos primeiros reflexos da gripe aviária, a Céleres previa uma demanda de 14,5 milhões de toneladas este ano ante 13,8 milhões em 2005. "As indústrias estão revendo o volume [de milho] que receberão o ano todo", observa ele. Ainda conforme Leonardo Sologuren, o quadro é negativo porque as empresas estão comprando apenas o milho necessário num momento em que o produtor, descapitalizado, tem necessidade de vender. "O produtor está precisando vender qualquer coisa para fazer caixa", concorda Paulo Molinari, da Safras & Mercado. Para Steve Cachia, da Cerealpar, a incerteza sobre o que vai acontecer com as exportações de frango este ano alimenta a pressão no mercado do milho, que já vinha em queda por causa da colheita da safra e com o avanço do plantio da safrinha. Os primeiros sinais de que o ano deve ser difícil já aparecem: segundo a Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frango (Abef), em fevereiro, as exportações brasileiras de frango somaram 199 mil toneladas, 7,8% a menos que em igual mês de 2005. A queda nas vendas externas reflete os altos estoques de frango em países importadores em função da gripe aviária. Para Molinari, mais do que a gripe aviária, é a maior produção de milho aliada ao dólar desvalorizado em relação ao real que está pressionando o mercado. Pelas estimativas da Safras, a produção de milho (safra mais safrinha ) deve totalizar 42,6 milhões de toneladas em 2005/06 acima das 39,4 milhões de 2004/05. Ele avalia ainda que o alojamento de pintos de corte este ano deve crescer em relação a 2005, apesar de o setor de frango prometer um corte na produção. Pelas estimativas da Safras, o aumento deve ficar entre 5% e 7%, situando-se ao redor de 410 milhões de cabeças mensais. Molinari observa que o setor se preparou para crescer mais do que isso, entre 10% e 13%, o que significa um alojamento de 430 milhões de pintos mensais. Em sua opinião, é exatamente por ter se planejado para esse crescimento que o setor de frango entrou em crise. "Há um excedente de oferta no mercado", diz. E é esse excedente que está derrubando a cotação do frango vivo em São Paulo. Ontem, o quilo caiu mais R$ 0,05 no mercado independente, para R$ 0,85, de acordo com a Jox Assessoria Agropecuária. Além da provável menor demanda num ano de maior produção, o setor de milho sente os efeitos da atual taxa de câmbio, que não estimula as exportações, de acordo com José Cícero Aderaldo, da Cocamar. "O milho está sentindo mais que a soja porque esta tem mais liquidez e volatilidade", conclui Cachia, explicando que nesse quadro o produtor tende a vender o milho.