Título: Bush tenta convencer os EUA de que tem um plano para o Iraque
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Fonte: Valor Econômico, 15/03/2006, Internacional, p. A13

Três anos após a invasão do Iraque pelos EUA, o presidente George W. Bush procura mostrar otimismo, mas os acontecimentos insistem em evidenciar a gravidade da situação iraquiana. Ontem, mais de 80 pessoas morreram vítimas de violência sectária, uma guerra civil não declarada que varia de intensidade mas não cessa. As forças de segurança iraquianas não mostram capacidade de conter a crise sem a presença militar americana. E a liderança do país não se entende quanto à formação de um governo estável. Não será fácil para Bush convencer os americanos de que tem um plano viável. Dia 20 a ocupação faz três anos, e a instabilidade parece cada vez maior. Os integrantes do governo não se acertam quanto à divisão de poder entre xiitas (maioria da população), sunitas (minoria que detinha o poder antes da invasão) e curdos (minoria étnica que domina áreas importantes do norte do país). Enquanto isso, rebeldes e criminosos comuns espalham o terror e aumentam a tensão. Até o embaixador americano em Bagdá já admitiu que seu país abriu uma caixa de Pandora no Iraque. Nos EUA, isso serve para solapar a popularidade de Bush. Segundo pesquisa do instituto Gallup divulgada anteontem, a aprovação do presidente caiu para 37%, o nível mais baixo de seu mandato. Segundo os analistas, o fator preponderante para esse resultado está na crescente oposição em relação às ações militares no Oriente Médio, principalmente por causa das baixas entre os soldados americanos - mais de 2.300 - e por causa da falta de perspectiva de uma retirada que possibilite entregar o governo efetivamente aos iraquianos. Entre os entrevistados, 57% consideram que o envio de tropas ao Iraque foi um erro - dois pontos percentuais a mais do que há duas semanas. Para 67%, o presidente "não tem um plano claro para fazer frente à situação no Iraque", o maior número desde que começou o conflito. Numa tentativa de reverter essa oposição, Bush passou a buscar um novo inimigo, segundo críticos de suas políticas. Em discurso na Universidade George Washington, na capital americana, acusou o Irã de dar ajuda aos grupos insurgentes no Iraque. "Como os terroristas sabem que não podem nos derrotar militarmente, recorrem à ferramenta que lhes resta, a do medo. E para isso vêm usando artefatos explosivos procedentes do Irã, como se comprovou pelas apreensões feitas", disse o presidente. Além disso, desdenhou da possibilidade de o Iraque ter entrado numa escalada de violência que acabaria por jogar o país numa guerra civil. "Os iraquianos olharam o abismo e não gostaram do que viram", disse Bush, referindo-se à onda de violência que se seguiu ao ataque a bomba contra uma importante mesquita xiita em Samara no fim do mês passado. Após o atentado, a violência entre xiitas e sunitas deixou o país à beira de um conflito generalizado. Além de o caso colocar em evidência a falta de controle que o governo tem sobre o país, mostra como será difícil para as tropas estrangeiras deixar o Iraque em pouco tempo, sob risco de fragmentação do território. Agora, mesmo os aliados mais próximos tentam se distanciar do atoleiro no qual o Iraque pode se tornar. Os britânicos anunciaram a retirada de cerca de 800 soldados no país (10% da força britânica no Iraque) a partir de maio. Principal aliado de Bush no início das operações militares, o premiê Tony Blair havia contribuído com 46 mil soldados para a invasão do Iraque.