Título: Companhias nacionais de TI na vitrine
Autor: Ricardo Cesar
Fonte: Valor Econômico, 15/03/2006, Empresas &, p. B3

Cebit Grupo de 14 desenvolvedores brasileiros busca novas oportunidades de negócios em feira na Europa

Com vento constante e uma temperatura em torno de zero grau, andar ao ar livre entre os 27 pavilhões que compõem a Cebit - maior evento mundial do setor de tecnologia e telecomunicações, que acontece de 9 a 15 de março em Hannover, na Alemanha - nem sempre é uma tarefa agradável. Apenas alguns prédios comunicam-se internamente, o que obriga o visitante que quiser explorar todos os 300 mil metros quadrados onde estão espalhados mais de 6 mil expositores a proteger as mãos nos bolsos e apertar o passo em meio aos canteiros tingidos de neve. É neste ambiente que, pelo sétimo ano consecutivo, um grupo de executivos de pequenas empresas brasileiras de tecnologia da informação avaliou que vale a pena investir para tentar fechar negócios no Velho Mundo. Quatorze companhias integram a comitiva organizada pela Associação para Promoção da Excelência do Software Brasileiro (Softex) e um de seus agentes, a Softsul, do Rio Grande do Sul, com apoio da Agência de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex), para marcar presença na Cebit. Juntas, empresas e associações investiram 140 mil euros em uma área de 140 metros quadrados, além de arcar com as despesas de transporte, hospedagem e materiais promocionais, para mostrar a cara no mercado europeu. A tarefa não é fácil - o espaço brasileiro é uma gota perdida no mar de estandes, alguns muitas vezes maiores e mais chamativos -, mas quem está lá garante que a participação traz resultados. "A Cebit é a melhor ocasião para uma empresa debutar no exterior", diz Paulo Mendonça, sócio da Intellectual Capital, uma fornecedora brasileira de softwares para bancos que faturou R$ 10 milhões no ano passado e emprega cerca de 80 pessoas. Em sua primeira aparição na Cebit, o empresário afirma que já fez contato com cerca de dez companhias de diversos países da Europa que também desenvolvem sistemas para o setor financeiro e acreditam que os produtos da Intellectual podem ser incorporados a seus portfólios. Esta é uma das características da Cebit: dificilmente os participantes fecham contratos de venda, mas o evento é considerado ideal para encontrar parceiros de negócios, como representantes comerciais ou empresas com produtos complementares que abrem as portas do mercado europeu para os empreendedores brasileiros. "Há cerca de 15 mil fornecedores nacionais de TI, a maioria de pequeno porte", afirma José Antonio Antonioni, coordenador geral da Softex e presidente da Softsul. "Só na Alemanha, existem 50 mil companhias de tecnologia, muitas com o perfil similar, de pequeno porte, e que representam um enorme potencial de parcerias." O software é um dos setores contemplados pela política industrial do governo federal, que tem a meta de fazer o país exportar US$ 2 bilhões nessa área e em serviços correlatos até 2007. No ano passado, as vendas externas somaram US$ 300 milhões. A grande dificuldade do setor, avalia Antonioni, está no fato de que muitas companhias são pequenas e com poucos recursos, embora desenvolvam produtos de qualidade. A falta de uma imagem nacional associada à tecnologia também atrapalha. Por fim, o grande consumo de TI no país acaba fazendo com que as empresas preocupem-se mais em atender a demanda doméstica do que em buscar clientes fora de suas fronteiras - exatamente o oposto do que acontece com a Índia, referência em exportação de sistemas, onde o mercado interno é pouco atraente. Uma das integrantes da comitiva brasileira, a Quality Software espera que a participação na Cebit ajude a reforçar sua estratégia de exportação, que já está em andamento. Com sede no Rio de Janeiro, a companhia, que faturou R$ 15 milhões em 2005 e conta com 180 funcionários, aposta no desenvolvimento de softwares para telefones celulares e TV Digital. Apesar de ser pequena, a Quality já fechou contratos para trabalhos "offshore", em que companhias sediadas na Europa e nos Estados Unidos encomendam o desenvolvimento de sistemas para fornecedoras localizadas em regiões mais baratas que tenham o conhecimento técnico necessário. Entre os clientes internacionais da Quality estão a Siemens e a BenQ. "Na Europa há mais clientes e uma grande variedade de projetos disponíveis, o que gera oportunidades. Por ser um mercado amplo, uma empresa de menor porte tem mais possibilidade de conseguir encontrar espaço do que no Brasil, onde a pouca demanda existente acaba sempre atendida sempre pelas mesmas empresas", diz David Britto, presidente da Quality. "Os europeus são rigorosos com a qualidade, mas estão acostumados a comprar de vários destinos." Britto ressalva que o Brasil não consegue ser competitivo nos custos de desenvolvimento de software em relação à Índia, mas diz que algumas pequenas desenvolvedoras nacionais atingiram um grau de especialização tão alto em seus nichos que os clientes internacionais estão dispostos a pagar a mais por esse conhecimento. Em seu segundo ano como expositor da Cebit, a Aker Security Solutions, outra integrante da comitiva brasileira em Hannover, está usando a feira para mapear possíveis representantes comerciais. Com faturamento de R$ 13 milhões no ano passado, a companhia desenvolve diversos softwares de segurança e, além do mercado nacional, vende seus produtos no México, Chile, Porto Rico, Austrália, Rússia e Polônia. Rodrigo Ormonde, um dos sócios da Aker, diz que nos primeiros dias da Cebit fez contatos promissores com revendas da Inglaterra e Portugal. Claus Traeger, proprietário de uma consultoria de marketing na Alemanha que foi contratada pela Softex, chama a atenção para a presença de algumas empresas nacionais de TI de maior porte que vieram ao evento por conta própria este ano, incluindo a Itautec, Gertec e Perto. Os maiores consumidores nacionais de tecnologia - as instituições financeiras - também passaram pelo evento. Um time do Banco do Brasil veio pesquisar as últimas novidades tecnológicas, enquanto o Bradesco enviou uma equipe de 14 pessoas, chefiada pelo diretor executivo de TI, Aurélio Conrado Boni, com o mesmo intuito. Embora ainda modesta, a participação dos representantes nacionais da área de tecnologia da informação na maior feira mundial do setor vem crescendo. Apesar disso, a distância para os países asiáticos não dá sinais de diminuir: juntos, Índia, China, Coréia do Sul, Taiwan e Hong Kong somam este ano cerca de 1,2 mil expositores, ou um quinto do evento.